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Negacionismo eleitoral

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Negacionismo eleitoral política esquerda direita abstenção

Jeferson Miola, em seu blog

O negacionismo eleitoral é um mal que parece afligir variados segmentos ideológicos. Não faltam aqueles de esquerda que resistem a encarar a dura realidade mostrada pelas urnas na eleição municipal deste ano.

Atacam e questionam a priori todas análises que não sejam pelo menos otimistas sobre os resultados eleitorais para as esquerdas.

Pode ser uma escolha cômoda –e ilusória– para apaziguar a alma, mas é uma postura que não resolve o problema essencial, que é o revés estrondoso das esquerdas na eleição e o avanço das direitas e do extremismo no país.

Os negacionistas contestam especialmente três realidades.

A primeira delas, de que o campo da direita e extrema-direita não foi o vitorioso na eleição. Para isso, sustentam que a direita não é direita, porque, na visão deles, é centro –ou centrão–, e, além disso, que tais forças “centristas” integram o governo Lula. Logo, entendem que a base do governo teria sido a grande vitoriosa.

É fato que nos partidos de direita que integram o governo, como PSD, MDB e Republicanos, para citar alguns, existem políticos que apoiam Lula hoje e tendem a apoiá-lo na reeleição em 2026. Não se pode desprezar, contudo, a heterogeneidade de tais agremiações, que congregam nas suas fileiras tanto políticos democratas como extremistas, quando não fascistas e, sobretudo, ultraliberais antipetistas.

Não seria ilusório, neste sentido, contabilizar Ricardo Nunes e Sebastião Melo, do MDB; Topázio Neto em Florianópolis e Eduardo Pimentel em Curitiba, todos com vices do PL e atávicos antipetistas, como integrantes do campo de sustentação do governo Lula e apoiadores da sua reeleição?

Mesmo Gilberto Kassab assumindo que vai estar “alinhado com o projeto que seja compatível com o projeto do Tarcísio, seja ele governador ou presidente” [8/10], há quem acredite que esta direita seja confiável e esteja, de fato, com Lula.

Tarcísio, como se sabe, é o bolsonarista e extremista com tintas artificiais de moderado que no dia da votação criminosamente ligou o modo Pablo Marçal para atacar Boulos.

Os negacionistas alegam que a extrema-direita foi grandemente derrotada, mesmo depois das vitórias do Tarcísio no estado de São Paulo e de outras vitórias de extremistas país afora. Justificam esta visão porque entendem que a extrema-direita se restringe ao PL, partido de Bolsonaro, quando se sabe que outras siglas, como União Brasil, Novo, Podemos, Republicanos, PP e até MDB e PSD, também albergam extremistas e são movidas pelo ódio antipetista.

O negacionismo contesta, também, que o PT tenha sido derrotado. Afinal, cresceu o número de prefeituras que o Partido administrará a partir de 1º de janeiro de 2025, o que de fato aconteceu.

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Ocorre, no entanto, que enquanto as direitas e os extremismos abocanharam os grandes centros urbanos do país e governarão mais de 160 milhões de pessoas, a quase totalidade das prefeituras conquistadas pelo PT [92%] são de municípios com até 20 mil habitantes [75%] e entre 20 mil e 50 mil habitantes [17%].

Ou seja, enquanto o PT e as esquerdas se localizam preponderantemente nas menores cidades, as direitas e as extremas-direitas controlarão os centros urbanos mais densos e com maior poder de propagação da disputa pela hegemonia política, cultural e ideológica.

O negacionismo eleitoral sustenta, ainda, que as emendas do orçamento secreto, mais que outros determinantes, foram o fator central para o crescimento do campo conservador e reacionário. Por este raciocínio, as emendas parlamentares teriam vencido a eleição, mas não foi o PT e as esquerdas que perderam.

É consenso o peso das emendas parlamentares no clientelismo paroquial, mas este aspecto não é suficiente para sustentar esta terceira realidade questionada pelo negacionismo.

Considerando o valor total das emendas individuais que irrigaram as paróquias eleitorais de 2021 a outubro deste ano, os parlamentares do PT ficaram com o terceiro maior quinhão de emendas, R$ 6,2 bilhões de reais, logo abaixo apenas do União Brasil, com R$ 7 bilhões, e do PL, com R$ 6,5 bi, e acima das demais siglas, inclusive o PSD, MDB e PP, que conquistaram muito mais prefeituras e elegeram muito mais vereadores [quadro abaixo, com dados do Senado sistematizados pelo Estadão].

Negacionismo eleitoral emendas individuais pagas partido

O reconhecimento da derrota eleitoral não é nenhum demérito para as esquerdas e, menos ainda, expressão de derrotismo ou catastrofismo, mas um ponto de partida essencial para que o governo, os partidos de esquerda e progressistas possam encontrar respostas adequadas à realidade complexa que se apresenta e que alerta para o risco da reeleição do Lula em 2026.

Rechaçar a realidade tal como se apresenta porque não se gosta dela ou simplesmente porque ela é desfavorável não resolve os problemas, e só nos encaminha para novos reveses.

Há muito a ser feito para se reverter este cenário adverso. E há tempo suficiente para isso, desde, no entanto, que se tenha como ponto de partida a realidade concreta, nua e crua, não nossos desejos ou nossas vontades idealizadas.

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Abstenção evidencia frustração da sociedade

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Abstenção evidencia frustração sociedade
Imagem: EBC

Altamiro Borges, em seu blog

Além da vitória da direita e da extrema direita, o segundo turno das eleições municipais deste domingo (27) trouxe um outro elemento perturbador: a alta abstenção dos eleitores. Essa parece ser mais uma evidência da crescente frustação da sociedade com a chamada democracia liberal-representativa, o que tem servido de caldo de cultura para o avanço das forças neofascistas.

Balanço do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontou que nos 51 municípios em que houve disputa para as prefeituras a abstenção bateu em 29,26% – o que significa que 9,9 milhões de brasileiros não foram às urnas e terão de justificar o voto. Em 2020, em pleno pico da pandemia da Covid-19, o índice foi de 29,53% – um total de 11,1 milhões de ausentes. Já em 2016, com a crise política, mas sem pandemia, a abstenção foi menor, de 21,55% – 7,1 milhões de pessoas.

O caso emblemático de São Paulo

No caso da encarniçada briga na capital paulista, o resultado foi ainda mais emblemático. O total de eleitores que não escolheu nenhum dos candidatos no segundo turno – 3,6 milhões – foi maior do que a votação do prefeito reeleito Ricardo Nunes (3,4 milhões votos) e de Guilherme Boulos (2,3 milhões). “Sim, a maior força política que venceu na capital paulista não foi o nome do MDB, nem do PSOL, mas o Desprezo (sem partido)”, ironiza o jornalista Leonardo Sakamoto no Uol.

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Esse total é a soma da abstenção de 2.940.360 eleitores – a maior taxa da história em um segundo turno na capital paulista –, com votos nulos (430.756) e brancos (234.317). “Ah, mas isso acontece em toda eleição, podem bradar alguns. Não, não acontece. No segundo turno da presidencial de 2022, a soma de abstenção, brancos e nulos foi 37,9 milhões. Lula teve 60,3 milhões e Jair Bolsonaro, 58,2 milhões. Ou seja, o desprezo pelas opções ficou em terceiro lugar”, agrega o colunista.

Para Leonardo Sakamoto, há vários fatores que explicam o recorde de abstenção. Ele, porém, destaca um deles. “Hoje, há uma massa que se sente ressentida por trabalhar muito, mas ter baixo poder de compra e, ainda por cima, contar com serviços públicos insuficientes em uma cidade extremamente desigual, com baixa qualidade de vida e que está sendo castigada por não se preparar para a mudança climática. Como trazer esse pessoal para a arena política, quebrando a ideia individualista do cada um por si e Deus acima de todos?”.

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Cidade mais petista do Brasil elege prefeito, vice-prefeito e todos os vereadores do PT

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Ipaporanga
Ipaporanga

Nas eleições municipais de 2024, o Partido dos Trabalhadores (PT) foi unanimidade na cidade de Ipaporanga, no interior do Ceará. O prefeito, o vice-prefeito e todos os nove vereadores eleitos no último domingo são do PT.

O atual prefeito do município, Amaro Pereira (PT), foi eleito em 2020 com 58,44% dos votos válidos contra 41,56% de Dedé Diogo (PL). Agora, ele foi reeleito [com 7.754 votos, o que corresponde a 91,96% dos votos válidos do município, o maior percentual entre os prefeitos do Ceará.

O professor do departamento de Direito Público da Universidade Federal do Ceará (UFC), Felipe Braga Albuquerque, explicou que o caso de Ipaporanga, em que um único partido elegeu todos os vereadores, é incomum, mas não ilegal.

“O partido que vai alcançando o coeficiente eleitoral vai elegendo o vereador. O que deve ter acontecido nesse caso é que o PT deve ter feito uma chapa muito forte, deve ter alcançado o coeficiente eleitoral, e os outros partidos não devem ter alcançado o coeficiente nenhuma vez”, apontou o docente.

A página ‘Pensar História’, no Twitter, fez uma breve pesquisa sobre o município de Ipaporanga e levantou algumas informações interessantes sobre saúde, educação e os serviços sociais da cidade. Confira abaixo:

1. Embora tenha apenas 11 mil habitantes, a cidade tem um hospital municipal, três centros de saúde e 4 UBS.

2. Ipaporanga atingiu nota máxima no Previne Brasil, programa do Ministério da Saúde que mede a qualidade da Atenção Primária. É a cidade com o melhor atendimento em saúde na região.

3. A cidade também conquistou o 7º lugar no ranking nacional do IOEB (Índice de Oportunidades da Educação Brasileira) em 2023, superando largamente a média nacional.

4. Chama também atenção a rede de proteção social do município: cozinha solidária, distribuição de cestas básicas, vale-gás, programas de complementação de renda.

5. Por fim, é impressionante como o prefeito tem uma atuação nas redes sociais bem mais dinâmica, profissional e ativa do que alguns deputados, senadores e ministros do PT.

6. Ipaporanga conquistou diversos prêmios na área da Educação:
– 80 medalhas da Olimpíada Cactus
– 24 medalhas da Olimpíada Canguru de Matemática
– 06 medalhas da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica
– 138 medalhas da Olimpíada Mirim de Matemática
– 21 alunos vencedores do Prêmio Peteca 2023, etapa municipal

Todos os 9 vereadores da cidade são do PT:

Rosinha Portela (PT): 1.486 votos
Elivelson Rodrigues (PT): 992 votos
Valdery Cavalcante (PT): 973 votos
Elicia De Paula (PT): 810 votos
Michelle Barroso (PT): 631 votos
Tintim Bonfim (PT): 630 votos
Manoel Cândido (PT): 593 votos
Manoel Alves (PT): 543 votos
João Paulo (PT): 507 votos

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Por que Manuela D’Ávila saiu do PCdoB

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Por que Manuela D’Ávila saiu PCdoB esquerda poítica
Imagem: Isabelle Rieger | Sul21

Luís Gomes, Sul21

No início da tarde desta segunda-feira (4), Manuela d’Ávila recebeu a reportagem do Sul21 para uma conversa na sede do Instituto E Se Fosse Você, ONG criada por ela logo após as eleições de 2018 com o objetivo de combate à violência política de gênero. Uma sala comercial no segundo andar de um prédio na Av. Independência, em Porto Alegre, ocupada por uma ampla mesa de reuniões no centro e repleta de elementos que marcaram as diversas fases de sua trajetória política e pessoal. Em um canto, um princípio de biblioteca que, segundo ela, será mais uma de uma dezena que já ajudou a montar. Em outro, uma estátua de Nossa Senhora Aparecida que ganhou de presente do ex-deputado Tiririca, no tempo em que eram colegas na Câmara Federal.

Manuela encerrava uma conversa por videochamada que faz parte do seu esforço para criar um movimento suprapartidário de mulheres na política. Em uma das paredes da sala que sedia o instituto, há cartazes com as iniciais de diversos estados brasileiros e, abaixo, nomes de mulheres, lideranças políticas e personalidades da sociedade civil. Na parede oposta, os dizeres: “Ler mulheres é revolucionário”.

A ideia da entrevista era entender o que motivou a deputada, depois de duas décadas de mandatos parlamentares e uma trajetória política toda construída dentro do PCdoB — o que inclui a candidatura à vice-presidência da República em 2018, — a anunciar, praticamente sem pompa, como uma nota de rodapé durante evento ao vivo promovido pelo ICL Notícias, que deixaria o partido, fato confirmado oficialmente pela legenda nesta segunda.

Ao longo da conversa, ela explica que não houve apenas uma causa, mas um somatório de fatores, o que inclui “muitas derrotas internas” ao longo dos anos. Contudo, destaca que a decisão do partido de se federar com o PT, a qual ela foi contrária, é um fator relevante. Em sua leitura, o PCdoB perdeu parte de sua identidade ao participar de uma federação com um partido muito maior, como é o caso do Partido dos Trabalhadores, movimento que acabou por descaracterizar a legenda comunista.

Sem ter um destino ainda definido, Manuela reafirma que se vê como uma militante partidária, mas também admite que não se sente “desconfortável” em exercer uma função no terceiro setor. “Para mim, foi infinitamente bonito poder presidir um instituto que coordenou o primeiro abrigo de mulheres na enchente. E eu pude fazer isso porque eu estava nesse lugar, no terceiro setor, na sociedade, embora, eu repito, eu acredite nos partidos e na disputa política”, diz.

Ao longo da conversa, ela também explica os impactos que os violentos ataques que sofreu da extrema-direita ao longo de sua carreira política, especialmente nas disputas de 2018 e 2020, quando concorreu à Prefeitura de Porto Alegre pela terceira vez, tiveram em sua vida, na relação com a própria filha, Laura, 9 anos, e, também, nos rumos de sua carreira política.

Ao final, ela analisa o resultado das recentes eleições municipais, fazendo um alerta para o equívoco que é tratar da disputa pela Prefeitura como um pleito isolado de um contexto global de emergência climática, avanço da extrema-direita, entre outros fatores. E termina com uma citação do velho poeta comunista chileno, Pablo Neruda.

Como é que foi esse processo de saída do PCdoB? Quando começou? O que te levou a essa decisão?

Manuela d’Ávila: Na verdade, é um processo bem longo. São alguns anos que eu debato com o PCdoB algumas questões metodológicas. Meu processo de afastamento formal da Executiva Nacional do partido já se deu há mais de um ano e meio, desde março de 2023. Foi um processo de divergências, respeitoso com a minha história, com a militância do PCdoB, que é extraordinária. Foi a militância que constituiu a minha identidade. O que o PCdoB entregou na minha vida é imensurável e eu acredito que eu também entreguei bastante, né? São 25 anos de dedicação a um único partido. Atravessei junto com o PCdoB momentos muito difíceis e, enfim, é uma relação que se encerrou depois de bastante esforço. São alguns anos de debate interno que eu travei para tentar ficar no lugar que eu sempre considerei a minha casa e foi bastante difícil tomar a decisão de sair.

Teve alguma questão chave, específica, que levou a essa decisão?

Manuela d’Ávila: Eu acho que resumir o fim de uma relação de 25 anos a um único fato sempre é arriscado. A mãe de uma amiga minha, que foi casada muitos anos, quando a gente perguntava para ela: ‘Tia, mas por que tu te separou?’ Ela dizia assim: ‘Porque ele não foi trocar pneu um dia’. Era evidente que ela usava aquilo para dizer ‘não é assim’, ‘não existe um fato’.

A escolha da federação foi um fato interno marcante, porque, para mim, descaracterizou o PCdoB enquanto partido. Porque o PT é um aliado fundamental, um aliado importantíssimo, mas é um partido muito maior do que o PCdoB, e isso faz com que a relevância interna na federação do PCdoB seja muito pequena. Então isso, para mim, é algo que tirou a identidade do partido publicamente e não é pouca coisa. Para quem fez a escolha de estar num partido como o PCdoB durante 25 anos, isso não é pouca coisa. Mas seria errado imaginar que uma derrota interna me faria sair. Eu fui derrotada muito mais vezes do que vocês imaginam durante esses 25 anos. Só que realmente talvez também seja difícil para as pessoas imaginarem que, alguém que tem uma vida tão pública quanto a minha, imagina, eu sou uma figura pública com mandatos com muita visibilidade desde os 22 anos de idade, talvez seja difícil para as pessoas combinarem essa figura pública com uma pessoa que tem uma vida e teve uma vida partidária absolutamente discreta e disciplinada. Então, eu fui derrotada ao longo de 25 anos muitas vezes e esse processo de ruptura, de saída, também foi muito intenso, embora tenha sido discreto como eu, em geral, sou na minha vida interna partidária.

Tu diria que esse processo também passa por uma busca de mais autonomia, do ponto de vista pessoal e partidário?

Manuela d’Ávila: Contraditoriamente, sim e não. Do ponto de vista partidário, com certeza. Eu me filiei a um partido e eu acredito que os partidos disputam a sociedade, são instrumentos de disputa de visões de mundo na sociedade. E, na minha interpretação, apesar de eu defender as federações, a forma como se dá a federação com um partido tão maior como o PT faz com que o PCdoB perca a sua autonomia. Do ponto de vista individual, não. Eu não acredito em militância solo. Veja bem, são alguns anos que eu fiquei reclusa, em silêncio, fazendo meus debates do ponto de vista interno porque eu acredito na força da militância, na força do coletivo, na sabedoria desse coletivo. Então, sim, do ponto de vista partidário, a autonomia é importante. E, do ponto de vista individual, para mim é uma experiência dificílima ser uma pessoa, mesmo que provisoriamente, mesmo que durante um período de reflexão, sem um coletivo, porque eu acredito na força do coletivo, da elaboração política coletiva, das reflexões coletivas.

Tu já tem uma casa nova? Já está em negociações com algum partido?

Manuela d’Ávila: Não, acho que isso também causa estranheza. Os políticos, em geral, eles saem de um partido já com outro partido amarrado. E está tudo certo, cada um tem a sua vida, tem a sua história. Essa não foi a história que eu escolhi para mim. Então, eu não tenho, não abri diálogo com nenhum partido, não faz parte daquilo que eu considero correto para minha história, para a minha militância, do respeito com qual me relacionei e me relacionarei com a militância do PCdoB, a quem eu dedico todo o meu respeito e o meu agradecimento, a minha gratidão.

Mas, ao mesmo tempo, eu tomei a decisão de voltar a militar. Esse período que eu fiquei reclusa, fazendo o debate interno, é um período que, num certo sentido, fez com que eu estivesse menos presente no espaço público. Isso tem a ver com uma série de questões, também seria injusto atribuir isso só a essa dinâmica interna, não é e não foi. Eu tenho organizado, junto com outras companheiras, um movimento suprapartidário de mulheres e tenho organizado alguns espaços de elaboração sobre o que eu acho que deve ser um espaço de diálogo das forças de esquerda do Brasil. Eu acredito muito na amplitude, mas também na radicalidade. Para mim, é fundamental que exista frente ampla, porque justamente eu sei, na teoria e na prática, o que significa enfrentar o bolsonarismo. Eu não sou daquelas que sabe só na teoria. Eu sei na teoria e sei muito, há muitos anos, o que é enfrentar a extrema-direita na prática. Então, a frente ampla é imprescindível para mim, foi e continuará sendo. As eleições municipais de 24 dão um recado sobre a necessidade da amplitude. Mas eu também sei que, dentro dessa frente ampla, nós temos que nos apresentar. Ou seja, uma tática que é sofisticada, porque requer amplitude, mas requer radicalidade programática, debates que a esquerda precisa fazer sobre a sua identidade, sobre a sua cara, sobre o seu programa para o Brasil, para o povo brasileiro, para a classe trabalhadora brasileira. Então, eu estou tentando, ainda de forma incipiente, me reorganizar nesses ambientes até que eu decida o meu futuro partidário.

Tu falou agora de organização de frente ampla, parece que tu tens uma vontade de ter uma atuação organizativa, digamos assim, talvez não necessariamente como candidata. Tu não participou diretamente das últimas duas eleições, embora tenha participado ativamente. Hoje, tu tem mais ânimo para se candidatar nas próximas eleições ou estar numa função de ajudar a organizar. Como tu está vendo o teu futuro na política?

Manuela d’Ávila: Acho que essa tua pergunta ela é muito interessante porque tem várias respostas contidas nela. Então, primeiro, eu sou alguém que acredita na força do coletivo, na força das ideias e que há bastante tempo faz um debate para um esforço que o nosso campo deve empreender, na minha avaliação, para despersonificar a representação dessas ideias. Vê bem, na minha primeira eleição, há duas décadas… Esses dias, eu recebi uma mensagem de uma amiga: ‘Ousadia era isso, ter a candidata mais jovem e não usar a foto dela’. A gente criou aquela bonequinha para não usar a imagem, para buscar representar a força das ideias de um conjunto de pessoas que advogavam em torno de algumas ideias para a cidade de Porto Alegre. Então, para mim, é importante que as pessoas compreendam que eu não deixei de fazer política nem um dia, porque a política é e tem que ser muito mais do que os mandatos parlamentares. É muito importante ter mandato, tem uma responsabilidade tremenda, mas também é muito importante ocupar outros espaços na sociedade, debater sobre outros lugares. E, para mim, eu repito o que disse antes sobre a minha decisão partidária, tudo aqui em primeira pessoa, não é regra para ninguém, mas para mim também foi muito importante deixar de ocupar esses espaços para me reconectar com determinadas pautas da cidade, do nosso País. Quando, em 2014, eu deixei ser deputada federal com os meus 500 mil votos, as pessoas dizendo que eu estava louca. ‘Nossa, nunca mais tu vai te eleger a nada, tua vida política vai acabar’. E eu lembro que as pessoas achavam que era um cálculo. ‘Ah, ela quer ser prefeita’. Eu nem concorri em 2016. Eu disse: ‘Não, gente, eu preciso voltar a ir na feira’. ‘Pode não ser importante para vocês, mas, para mim, para minha compreensão sobre a dinâmica política, sobre a dinâmica da sociedade, é importante’. Tinha acabado de acontecer 2013. Eu sabia que tinha coisas mudando e que eu, lá de Brasília, com os meus limites, tem gente que não tem esses limites, para mim já era difícil eu conseguir entender, captar, sentir o que estava rolando na sociedade.

Então, um, esse lugar que eu estou hoje não é um lugar desconfortável para mim. Para mim, foi infinitamente bonito poder presidir um instituto que coordenou o primeiro abrigo de mulheres na enchente. E eu pude fazer isso porque eu estava nesse lugar, no terceiro setor, na sociedade, embora, eu repito, eu acredite nos partidos e na disputa política.

Eu sou a única pessoa que disputou dois segundos turnos contra o bolsonarismo. Quando as pessoas falam da minha decisão de não estar nas eleições de 2022, elas ignoram, tem muito de machismo nisso, a quantidade de pessoas que não estiveram em 2020. Eu enfrentei 18 no segundo turno e enfrentei o segundo turno dos mais violentos da história do Brasil contra o bolsonarismo em Porto Alegre em 2020. Então, foram dois segundos turnos que eu não desejo para o meu pior do inimigo, 18 e 20. E isso traz muitos impactos, impactos familiares, eu sou alguém que tem responsabilidade, minha família sempre foi minha parceira na construção da minha militância. Nesse mundo em que os homens ocupam os espaços de poder, a gente naturalizou que as pessoas que se relacionam com as pessoas nos espaços de poder têm que bancar tudo, porque quem são essas pessoas? São as mulheres. É fácil de entender. Eu também achei que, em 22, eu devia a responsabilidade com a minha família, com o que a minha família viveu junto comigo e comigo mesma. A gente tem essa cultura de heroísmo, ‘Ah, eu aguento tudo’, ‘Eu mato a cobra e mostro pau’. Eu tive impactos seríssimos na minha saúde física. Não é fácil, eu posso garantir para vocês. Eu fui alvo cotidiano e sigo sendo desde 2014 da extrema-direita brasileira. Não é fácil andar na rua 24 horas por dia sem saber de onde vem agressão, não é fácil entrar na escola da filha e ser fotografada, não é fácil querer criar uma criança perguntando porque que as pessoas não gostam da mãe dela, sendo que nenhuma das razões para elas não gostarem são razões reais. Se fossem, seria mais fácil. Então, assim, essas foram as razões também de eu não estar ali. Tinha os meus debates partidários, tinha um desejo meu de ser responsável, tinha uma necessidade minha de restabelecer minha saúde física e mental. Daí eu acho que também é bom que as pessoas aprendam a ouvir sobre isso, enquanto as pessoas ainda estão vivas e saudáveis. O que as mulheres brasileiras vivem na política não é certo, não é o preço que os homens pagam. Não é certo a Carol Dartora ter sido ameaçada 43 vezes nos últimos dias, não é certo a Áurea Carolina ter sido ameaçada, não é certo a Tarília (Petrone) andar de carro blindado, não é certo a Estela de Caxias ter chegado ao limite que a colocaram, não é certo a Daiana, a Bruna e a filha da Bruna serem ameaçadas. Esse não é um trecho do jogo político. Nós não somos fracas, isso não é a política, pelo menos não deveria ser. Se a gente naturalizou que isso é, algo de errado há.

Agora, eu também tenho só 43 anos. Então, eu também sou tranquila com relação a isso. Eu tenho muita responsabilidade com o nosso campo político e eu acho que se, em outras eleições, o meu nome for o nome que conseguir combinar a aliança unitária necessária para que nós tenhamos condições de enfrentar as eleições, eu estarei à disposição como eu sempre estive. Não foi o caso em 24 e em 22 também. Em 22, eu cheguei a dizer isso, se eu for imprescindível, eu estarei na eleição, mas as forças de esquerda fizeram um outro arranjo e acharam por bem que eu não estivesse, tal qual 2024. E está tudo certo. Para mim, está tudo certo. Enfim, esse é um debate que a gente vai ter que fazer, porque eu defendo, como defendi em 24, que a gente faça de maneira ampla, compreendendo que os nossos pontos de conexão com a sociedade talvez passem pelos nossos partidos e, eu vou reafirmar aqui, porque muitas vezes quando eu critico a lógica dos nossos partidos, as pessoas… Esses dias eu ouvi de alguém: ‘É que a gente é diferente, eu sigo acreditando nos partidos’. Negativo, eu sigo acreditando nos partidos e é por isso que eu quero que eles sejam fortes e não estruturas enfraquecidas, em frangalhos, diante de uma sociedade que não se vê representada. Justamente por eu saber que os partidos são imprescindíveis é que eu penso que os nossos partidos precisam se reconectar e conectar da maneira mais aberta possível com os setores da sociedade que se identificam com eles. Por isso que eu defendi em 24 que nós tivéssemos prévias, que inclusive pudessem incluir nomes como o da Juliana Brizola, que está nesse grande campo democrático que nós defendemos. Então, acho que a gente tem que também estar aberto para, em 2026, saber dos limites que nós enfrentamos nos últimos anos e tentar, de forma muito fraterna, que é também um valor que eu atribuo ao nosso campo, nos aproximarmos da população para termos competitividade eleitoral.

Tu falou um pouco do impacto pessoal que a extrema-direita teve na tua vida. A gente comentava na redação que, em comparação com 2020, essa eleição foi menos violenta do que esperávamos. Mas talvez tenha sido um sentimento de que foi tão violento em 2020 que acabamos tomando como normal. Foi violenta, mas menos na camada visível. Não tivemos caminhão de som circulando pela cidade falando sobre comer carne de cachorro, por exemplo. Mas o que eu queria te perguntar é como isso te afetou psicológica e fisicamente?

Manuela d’Ávila: Eu acho que é importante que a gente fale sobre esses níveis de violência naturalizados nas eleições, porque a gente subestima o quanto a direita no Brasil e no mundo pode ser violenta e que os compromissos da direita com a democracia, que eles gostam de bater no peito e dizer que é uma invenção deles, eles são sempre compromissos, digamos assim, subjugados à possibilidade da vitória deles. Então, o fechamento democrático no Brasil foi proporcionado por quem? Pelas forças da direita quando não conseguiu impedir o avanço de reformas progressistas. O golpe contra a presidenta Dilma, o impeachment, acontece em qual momento? O lawfare, a prisão do presidente Lula acontece em qual momento? Então, a violência na campanha de 2020 foi a necessária para que eles ganhassem e a violência na campanha de 24 foi a necessária para que eles ganhassem. A escala de violência deles é relacionada aos interesses deles e não à dignidade ou respeito com cada uma de nós. É por isso que a gente deveria tomar como um sinal de alerta a violência que aqueles despejam contra as nossas mulheres na esfera pública, porque isso tem a ver com o desenho de sociedade que eles têm para o futuro, com o desenho do papel da mulher. Por que essas mulheres que estão na linha de frente, não é só da política, na advocacia, na sala de aula, são objetos central do ódio da extrema-direita? Não é só no Brasil, no Brasil e no mundo. Tem muitos estudos. Tem uma pesquisadora de Stanford, Alice Evans, que estuda basicamente isso, a diferença comportamental de mulheres e homens no globo a partir de determinadas conquistas das mulheres no espaço público, academicamente, nos concursos. Enfim, com vários parâmetros de aferição. Eu acho que isso é importante a gente saber. O que eles fizeram contra mim em 2020 foi o necessário para que eles ganhassem a eleição, porque eles não têm compromisso nenhum com a dignidade humana. Eles não têm compromisso nenhum com a democracia. Eles têm compromisso com os interesses deles e, numa fase, numa etapa da luta tão aguda como a que a gente está vivendo no Brasil e no mundo, eles já demonstraram que não estão nem aí para a democracia e para e para a defesa da dignidade humana.

Com relação a mim, sabe, é algo que eu tenho também tomado para mim a tarefa de falar. Por quê? Porque eu entendo como é difícil para quem tá no exercício do mandato se abrir com relação à vulnerabilidade. Por quê? Porque falar sobre a violência é se recolocar na situação de violência. Não por nada, no Juizado de Infância, a gente faz com que a criança fale uma só vez, porque a gente entende o peso de falar sobre a violência mais de uma vez na constituição dos traumas. Mas acontece que eu me dei conta, teoricamente, que eles nos colocam numa situação em que a gente perde em todas elas. Porque, assim, tu é ameaçada todos os dias de morte. Aí tu fala sobre isso, aí tu vira alguém monotemático, como canta a Pabllo Vittar naquela música com o Emicida: ‘Permita que eu fale não as minhas cicatrizes’. Aí tu vira tua cicatriz falando, porque tu passa o tempo todo falando sobre isso. Aí a pessoa já te acha uma chata, porque tu para de falar de economia, para de falar de arcabouço fiscal, para de falar da forma como a polícia age, para de falar de moradia. Mas, porra, tu é ameaçada de morte todos os dias. Tá, aí tu não fala, tu não fala porque tu quer falar de moradia e tal, só que aí tu adoece, porque tu tá sendo ameaçada de morte, a tua filha ou os teus filhos estão sendo ameaçados de morte, tu tem que mudar de estado. Como é que tu coloca uma mulher deputada no Programa de Proteção à Testemunha? Tu tira ela do estado? Teve uma vez que um policial me disse: ‘A senhora cuide com quem lhe abraça’. Mas, pelo amor de Deus, eu sou política, as pessoas têm que me abraçar. Entendeu? Na campanha de 2020, eu tinha medo das pessoas indo falar comigo e não era só o covid, eu tinha medo porque o volume de ameaças de morte que eu tinha recebido nos últimos anos fazia eu não saber se tu estava chegando em mim para me dizer ‘Nossa, tamo junto’, porque foi uma campanha lindíssima, ou se tu vai cochichar no ouvido ‘Te cuida, tu tem três dias’.

Isso aconteceu?

Manuela d’Ávila: Isso aconteceu dezenas de vezes. Várias vezes. Esses dias aconteceu com a Atena [Roveda, vereadora eleita para 2025-2028] aqui no centro de Porto Alegre, é uma prática que não é incomum. Às vezes, as meninas que trabalhavam na minha comunicação, para me proteger, apagavam uma ameaça, porque elas olhavam ali e não aguentavam mais. Elas não aguentava mais ler as ameaças a mim.

Como é ouvir alguém cochichando no teu ouvido uma ameaça de morte?

Manuela d’Ávila: Cara, ser ameaçado por um inimigo invisível é uma forma de tortura muito sofisticada, entende? Muitas pessoas falam comigo, por exemplo, que me encontravam no supermercado, chegavam pelas costas para falar comigo e que eu pulava. E eu comecei a me dar conta disso. Teve um dia no mercado, era domingo, era 9h da manhã, eu estava comprando as coisas para o almoço, estava com a minha filha, e uma mulher começou a falar comigo os negócios de Jesus, e não sei o quê e dedo na minha cara. E eu falei: ‘Cara, não vou deixar ela falar assim na frente da minha filha’. Eu fui reagir, quando eu reagi, eu olhei para a minha filha e a cara dela de apavorada com a minha capacidade de reação, fez com que fosse pior do que ela ouvir a mulher gritar contra mim. Entende? Então, assim, eles nos colocam num lugar que não existe saída boa. Porque também, dizer assim: ‘Então, quando não concorre, deu a vitória a eles’. Vão à merda. Nenhuma de nós quer ser nome de rua, nenhuma de nós quer ser heroína. A gente quer conseguir transformar a política. Então, eu acho que isso tem muito a ver também com a lógica masculina de exercício do poder, sabe. Eu sempre brinco da estátua. No fundo, no fundo, todo mundo quer virar uma estátua. Eu não quero, eu quero ver a minha filha crescer, sabe.

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Tem uma frase que é atribuída ao Marighella. Eu gostei muito que no filme com o Seu Jorge, com o Wagner, eles ressignificaram essa frase, porque eu morria de medo como ela estaria no filme porque eu detesto essa frase. O Marighella teria dito: ‘Eu não tive tempo para ter medo’. Cara, então eu sou uma desocupada, porque eu tenho medo por mim, eu tenho medo pela minha filha, eu morro de medo pelas minhas amigas que vieram depois de mim. Se eu pudesse, eu protegia todas elas desesperadamente, entende? Então, não é sobre não ter medo, é o contrário, é sobre sentir medo e seguir lutando apesar de um medo enlouquecedor, paralisante. A gente olha e fala: ‘Cara, mas eu não posso parar’. Por quê? Porque não é facultado a mim deixar de lutar mesmo com medo, porque também esse lugar do superpoder… A Marina (sócia de Manuela) esses dias estava lendo um texto e disse: ‘A Manu não quer mais ouvir que ela é forte, ela vive debatendo isso’. Por quê? Porque esse lugar não é sobre mim, é óbvio que eu sou muito forte, eu sou forte como poucos homens são fortes, dos que eu convivi minha vida inteira e, se eles soubessem a quantidade de ameaças que eu já li, que vocês sequer cogitaram em hipótese, dos medos que eu já senti, vocês provavelmente passariam o dia me enviando mensagem de solidariedade, como acontece quando eu torno pública uma, ou quando a Talita torna pública uma, ou Daiana torna publicar uma, eu não sou exclusividade. Mas essa ideia da força dá uma ideia de um atributo diferente. ‘Aí, ela é diferente’. E aí eu comecei a me revoltar quando as mulheres me diziam: ‘Aí, cara, eu te admiro tanto, tu é muito muito mais forte do que eu’. E eu pensava: ‘Cara, tá aí, parece que é incomum, quando na verdade a política que a gente defende é das pessoas comuns, é que as mulheres comuns, mães, donas de casa, professora, líder comunitária possam se olhar naquele lugar e não olhar no lugar de pensar ‘aquilo não é para mim’. Então, para tentar resumir a ópera, atinge em muitos lugares. Me atingiu em lugares emocionais, físicos. Teóricos me fizeram refletir sobre o tipo de organização política que a gente tem, sobre as razões pelas quais essas violências são naturalizadas, são invisibilizadas, sobre a forma como nós tratamos da rejeição às mulheres e aos homens. Tu vê, o Lula, a quem eu defendia em 2022 e defenderei em 2026, é um líder com uma rejeição altíssima e nós sempre soubemos que tínhamos que defendê-lo, porque nós sempre soubemos das razões políticas da rejeição a ele. Mas a rejeição das mulheres é o quê? ‘Ah, mas Maria do Rosário tem uma rejeição altíssima’ Sim, o Luiz Inácio também. Qual é a diferença entre os dois? Por que nós pessoalizamos a rejeição dela e não pessoalizamos a rejeição do Lula? Porque o corpo do Lula é um corpo político, é um corpo de homem, e o corpo dela é para ser visto como não político. Então, fez eu elaborar muito mais sobre tudo e também entender essa dimensão de gênero com uma outra pegada.

A gente falou da Manu que usou uma bonequinha na sua primeira campanha. Agora que tu está saindo do partido que tu sempre militou, qual foi uma coisa que te mudou, que te transformou, nesses 25 anos?

Manuela d’Ávila: Cara, com certeza, com certeza, assim, disparado, a coisa que mais me transformou politicamente e pessoalmente, mas sobretudo politicamente, foi a maternidade. Porque eu não tinha a dimensão do que é o trabalho reprodutivo na sociedade como eu tenho hoje, e talvez muitas vezes eu tenha subestimado. Então, quando eu me elegi há duas décadas, eu não era a Manuela que olha o mundo a partir das questões de gênero e raça como eu sou hoje. Eu continuo uma mulher marxista, que acredita que a chave principal de leitura da sociedade é a questão de classe, mas eu compreendi que nem todos os corpos dentro da classe trabalhadora são iguais. Então, eu rompi com certas visões dogmáticas que eu tinha sobre raça, sobre o Brasil, sobre imaginar um Brasil menos violento do que é, e eu compreendi a dimensão do trabalho reprodutivo na estruturação do capital, o que eu subestimava.

E qual é a avaliação dessas eleições de 2024 e que lições tu acha que se pode tirar delas para as próximas?

Manuela d’Ávila: Apesar de ter só 43, eu sou de um tempo em que a gente sempre saia do grande para o pequeno, da conjuntura nacional, internacional, para chegar no local. E eu acho que a gente tem feito análises muitas vezes reducionistas sobre o tema das eleições municipais. Vê bem, a gente vive no mundo com uma crise sem precedentes, o povo palestino está sendo dizimado, as crianças estão sendo exterminadas, as mulheres estão sendo executadas e não existem organizações multilaterais capazes de parar o Estado de Israel. Esse é um dos exemplos do mundo que a gente vive. Nós enfrentamos em Porto Alegre uma catástrofe climática que hoje o povo de Valência vive na Espanha, com números ainda mais assustadores, numa velocidade ainda maior do que foi a tragédia do Rio Grande do Sul e de Porto Alegre, para tocar em uma outra crise, a climática. O fluxo de pessoas no planeta, de refugiados das guerras, de refugiados do clima, a maneira como os países lidam com esses fluxos migratórios, a crise do mundo do trabalho em transformação, um trabalho que cada vez se trabalha mais e se tem menos dignidade, a extrema-direita e ascensão em diversos países. Então, às vezes, eu acho que nós abstraímos essa realidade internacional para pensar o que foi o processo que o Brasil viveu na última década, desde o não reconhecimento da eleição da Dilma pelo Aécio, passando pelo golpe, pela prisão do presidente Lula, chegando no governo Bolsonaro e na eleição do Lula em 22. Uma eleição que nós vencemos uma frente amplíssima por uma margem pequeníssima. Então, eu acho que nós tiramos interpretações apressadas do resultado de 2022. Por exemplo, em Porto Alegre se tinha uma leitura de que o Lula ganhou. Ok, o Lula ganhou, mas quem ganhou? Qual Lula ganhou. Ganhou esse esforço imensurável de todo mundo, diante do extermínio de 700 mil brasileiros na pandemia, que defende a democracia com bases muito largas. Então, eu acho que a gente subestima a dimensão do buraco em que a gente está metido, o que representa a eleição do presidente Lula, para pensar na eleição municipal. Acho que tem uma subestimação, eu não estou falando de A ou B, mas de forma meio generalizada, de todos nós. Quando a gente pensa a nossa realidade, eu acho que é o natural olhar para cá e abstrair, porque isso é um esforço mais coletivo mesmo para pensar a realidade.

De alguma forma, também se questiona como o Melo venceu após a enchente, como se fosse só essa a discussão.

Manuela d’Ávila: Exatamente, como se todas as qualidades e os defeitos estivessem focados nos candidatos. Esses dias a minha sogra mandou uma mensagem e disse: ‘Pô, mas ninguém mais vai querer concorrer assim, porque quando o cara ganha não tem talento e nem mérito nenhum, aí quando perde a culpa é toda dele’. Tu coloca o super papel do indivíduo na história. Isso tem tudo a ver com o tempo que a gente vive, dessa maximização dos indivíduos, das redes sociais. Óbvio, o neoliberalismo já era isso do ponto de vista ideológico, eu reflito mais do ponto de vista da disseminação mais coletiva mesmo, social, da naturalização disso. Então, eu acho que a gente fez o melhor que poderia fazer com a forma que nós lemos a realidade em 2024. Nós ficamos felizes com a condição de uma chapa de esquerda, que é uma vitória imensa, de fato, abstraímos a necessidade de amplitude. Deveríamos, na minha interpretação, ter buscado setores mais largos. Acho que minimizamos o peso de uma dimensão de transformação do tecido social que nos apoia e acho que fizemos uma disputa aquém do necessário antes das eleições no tema da enchente, quando nós, num certo sentido, compramos a ideia de que não deveria se politizar o debate sobre as consequências da enchente, quando tudo é político. A emergência climática é política, é um tipo de mundo que nós vivemos que colapsa o planeta e põe a espécie humana em ameaça. É política a decisão de destruir a estrutura pública para conseguir dar conta do sistema de proteção da cidade. Não por nada estava na pauta de 2020 de uma forma assustadoramente premonitória. As pessoas diziam assim: ‘Nossa, parece uma premonição’. Não, o único mérito que eu tinha foi ouvir os trabalhadores do DMAE, do DEP, quem constrói a cidade, e acreditava no papel do estado para a proteção da cidade. Mas pensa que tudo isso, como diz o Melo, era inevitável. Quem esteve na linha de frente, como eu estive, o Instituto esteve nos abrigos, sabe que nós não tínhamos assistência social na cidade de Porto Alegre para dar conta. E as nossas assistentes são extraordinárias, não estou falando sobre elas. Nossa rede de assistência é extraordinária. Não tinha gente, pessoal, efetivo, porque todos os serviços públicos foram destruídos, todos, todos. A saída para o abrigo, a volta para casa, o acompanhamento das pessoas, tudo foi feito por voluntários. Então, quando o povo dizia ‘é o povo pelo povo’, o povo tinha razão não na chave que esses decrépitos da extrema-direita diziam, é o povo pelo povo porque eles destruíram o estado, porque eles abandonaram o povo à própria sorte. Porque os ricos, mesmo na tragédia, conseguem ir pra praia, como sugeriu o Melo. E é o povo que, ainda agora, paga as consequências da enchente.

Então, eu acho que é uma situação muito difícil a que a gente se encontra, é uma ofensiva muito grande da direita. Por isso que pra mim é tão importante que a gente volte, vire a chave e não faça leituras erradas. Por exemplo, tem uma leitura corrente que diz que nós precisamos refutar uma certa esquerda que disputa valores. Como assim? A gente vai ficar na chave de nos defender dos falsos valores que a extrema-direita diz que nós defendemos? Eu quero disputar valor, porque eu não acredito que o povo brasileiro não seja solidário como a extrema-direita faz parecer. Eu vi na enchente. Eu tenho encontrado muitas crianças trabalhando, é algo que fez eu ser quem eu sou. Eu fui uma criança que via isso acontecer e não me conformava, e é algo que eu realmente não imaginei chegar aos meus 40 anos vendo, com tudo que a gente já fez no Brasil nos últimos anos. Mas, aí, eu me lembrei que, durante aquelas semanas de maio, eu cheguei dos Estados Unidos exatamente na enchente em Porto Alegre, a gente via as pessoas ganhando comida na rua. Por quê? Porque essa solidariedade que abraçou Porto Alegre e o Rio Grande do Sul faz parte do que nós somos. Aí a gente vai acreditar que o povo é um contra o outro que nem a extrema-direita diz? Eu quero disputar esse valor. Eu não acredito que o povo de Porto Alegre é a favor de espancar a criança gay, eu não acredito. Eu acredito que as mães dessa cidade, mesmo as que não entendem a orientação sexual dos seus filhos, têm medo quando veem que o seu menino é mais vulnerável no ambiente escolar e querem que ele seja protegido. A gente vai deixar de falar sobre isso? A gente vai acreditar que o nosso povo tem a cara desses líderes horrorosos, violentos, que defendem a barbárie? Não, então ao contrário, eu acho que a gente tem que retomar a disputa dos valores de quem nós somos. Nós somos aqueles que acreditamos na solidariedade, nós somos aqueles que sentimos a dor do outro, que, quando vemos uma pessoa com fome, nos indignamos. Por que nós somos quem nós somos? Qual é a tua história? Eu sei a minha, eu sei a história da Manuela que era uma menina de classe média e que se engajou na política porque não acreditava que as outras crianças não tinham casa para dormir. Então, esses somos nós e eles tentam falar por nós quem não somos. Porque nós reconhecemos todas as famílias somos contra as famílias? Não, eu sou a favor da minha família, na qual o meu enteado é criado como filho pelo valor mais maravilhoso de todos, que é o amor, não é o sangue, não é o patrimônio. Então, a gente não pode cair nessas explicações simplistas. Na escolha de candidato, era muito comum a gente ouvir: ‘Não, mas não dá para ser uma mulher, porque o povo…’ Cara, será que é sobre isso ou será que é sobre a nossa falta de vontade de bancar os debates que têm que ser bancados. O que a eleição dos nossos parlamentares indica? O que ela indica? Não é só renovação geracional. A renovação geracional é importante, evidente que é. Mas, se ela não é provida de renovação política, de sentido, ela não é renovação. A gente fala de honrar quem veio antes. A gente aprende isso em qualquer lugar, dentro de casa com os mais velhos, nas religiões, nos povos originários com a ancestralidade, nós feministas com as que vieram antes, nós sempre saudamos os que vieram antes. Então, a renovação não é etária, ela é política. E o nosso povo de esquerda deu sinais. A bancada que elegeu é diferentona, diferentona desse padrão, diferentona no bom sentido eu estou falando. Tem um sinal como teve em 20. Em 20, a gente fez aquela onda e veio a bancada antirracista. Agora, tem a Natasha e a Atena, tem a Grazi, tem o Giovani com o mandato coletivo, a Juliana, é uma bancada que expressa um outro sentido. Opa, tem algo acontecendo aqui. É muito mais do que a mera reprodução do desenho dos partidos. Talvez seja até o sinal de que, sim, ‘nós estamos com vocês’.

Eu sempre cito essa frase do Neruda que é a frase que eu mais gosto, cara, que é foda um poeta comunista com o pensamento dialético. O soneto mais bonito dele, um soneto de separação, de amor, termina com ele dizendo: ‘Nós dois, os dois de então, já não somos mais os mesmos’. Então, talvez a eleição da nossa bancada seja a expressão dessa frase do Neruda. Nós continuamos juntos, mas nós não somos mais os mesmos. Eu acho que é um sentido para a gente pensar.

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Hugo Motta é apoiado por 12 partidos em disputa pela Presidência da Câmara

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Hugo Motta apoiado partidos em disputa Presidência Câmara
Hugo Motta Wanderley da Nóbrega (Imagem: Republicanos)

Edson Sardinha, Congresso em Foco

O favoritismo do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) na disputa à presidência da Câmara dos Deputados cresceu ainda mais nesta terça-feira (5) com o embarque em sua candidatura de outros quarto partidos, o PSB, o PDT, o PSDB e o Cidadania, que se inclinavam a apoiar Elmar Nascimento (União Brasil-BA). Essas siglas ocupam 49 cadeiras na Casa. Com isso, subiu para 12 o número de legendas que apoiam, até o momento, a candidatura do paraibano. Juntas, essas bancadas, que reúnem do PT ao PL, somam 373 deputados. Uma margem expressiva, em meio a eventuais dissidências, para vencer a corrida eleitoral já no primeiro turno em fevereiro. Para que isso ocorra, o candidato precisa receber ao menos 257 votos. Caso nenhum dos postulantes alcance essa marca, a decisão vai para o segundo turno. Nesse caso, vence quem obtiver a maioria da votação.

O arco de alianças pode crescer ainda mais, com a sinalização do PSD de que poderá apoiar Hugo Motta e retirar a candidatura de seu líder, Antonio Brito (PSD). A bancada esteve reunida até o início desta noite. Brito afirmou que conversará com Hugo Motta e, pela primeira vez, indicou que poderá sair da disputa.

Fiz a ponderação à bancada que, se nós dialogarmos com o presidente Lira e o candidato de Lira, Hugo Motta, a fim de manter as proporcionalidades que o PSD tem mantido na Casa, nós voltaremos à bancada para dialogar se a bancada deseja manter a candidatura ou se há algum tipo de mudança. Neste momento, é manter a nossa candidatura à presidência da Câmara e abrir diálogo para discutir proporcionalidades do PSD e a pauta do nosso partido”, declarou o deputado, que anunciou que será mantido na liderança do partido caso desista ou seja derrotado na disputa à presidência da Câmara.

Antonio Brito também reclamou da posição do governo Lula e do PT, de quem esperava apoio por causa da presença do PSD na base governista.

Pesou [na abertura do diálogo com o candidato do Republicanos] a posição do PT e do governo em apoiar Hugo Motta. Isso pesou porque é uma bancada do governo, tem tratativas de lealdade com o PT e o governo”, afirmou.

Os apoios recebidos por Hugo Motta e a sinalização de Antonio Brito esvaziam ainda mais a candidatura de Elmar Nascimento, que ainda depositava esperanças no apoio do PSB, do PDT, do PSDB, do Cidadania e do próprio PSD para se manter na disputa. A tendência é que o partido retire o seu apoio a Elmar para também apoiar Hugo Motta, conforme indicado em reunião da cúpula partidária na última quinta-feira. O baiano começou a ser rifado quando o presidente da Câmara, Arthur Lira, abandonou sua candidatura para apoiar Hugo Motta. O deputado paraibano se cacifou ao ter o seu nome defendido pelo presidente do Republicanos, Marcos Pereira (SP), que preferiu se retirar da disputa ao avaliar que o colega tinha mais condições de reunir apoio de outras bancadas do que ele.

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A debandada para o lado de Hugo Motta se justifica pelo receio dos partidos de perder espaço na Mesa Diretora e no comando de comissões caso insistam em candidaturas com pouca viabilidade eleitoral.

O voto para presidente da Câmara e demais cargos da Mesa Diretora é secreto. Por isso, pode haver dissidências dentro de cada partido, a despeito do apoio declarado pelas legendas aos candidatos. As siglas, no entanto, negociam desde cargos na Mesa ao comando de importantes comissões até indicações para o Tribunal de Contas da União (TCU) e relatorias, além da votação de determinados projetos.

Presente na reunião do PDT que selou o apoio a Hugo Motta, o presidente do PDT, ministro Carlos Lupi, defendeu a gestão do paraibano como uma continuidade da gestão de Arthur Lira.

Hugo é um articulador nato, quase uma unanimidade da Câmara. Impressionante como ele consegue entrar em todas as salas e não precisar abrir a porta já fica aberta para ele e eu tenho certeza que essa decisão da bancada que nós referendamos, apoiamos, só tem Hugo até em você essa referência que você já é, o seu histórico de cumpridor de palavra, de um homem hábil de fazer dessa casa cada vez mais respeitada, do diálogo e da busca permanente de consenso de todos os pares. Então, o nosso apoio a você é um reconhecimento ao companheiro líder que foi muito correto em todo momento conosco do PDT e a você como o futuro que a gente espera do povo brasileiro”, declarou.

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Elon Musk chega ao poder em pacto baseado em dinheiro, vingança e mentiras

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Elon Musk chega poder pacto baseado dinheiro vingança mentiras
Imagem: Justin Merriman | Bloomberg

Jamil Chade, Uol

Na última sexta-feira, a conversa de 25 minutos entre o presidente eleito Donald Trump e o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky foi marcada por uma surpresa: a presença de Elon Musk. Em determinado momento da reunião, Trump chegou a passar o telefone para o bilionário, que recebeu do ucraniano um agradecimento por fornecer seus satélites para o esforço militar de Kiev. Na conversa, Musk prometeu que vai continuar a fornecer serviços de internet ao país.

A presença de um bilionário numa conversa entre dois líderes causou um choque na diplomacia mundial. Mas não deveria. A realidade é que, diante da vitória de Trump, Musk chegou ao poder.

E isso ficou claro já no primeiro discurso de Trump, ainda na madrugada de terça-feira para quarta-feira. Naquele momento, ele escolheu citar especificamente Musk. “Ele é um gênio e precisamos proteger nossos gênios”, disse.

Trump já chegou a sugerir que Musk poderia ter um cargo no futuro governo ou que seria apenas um conselheiro. Independente da posição que assumir, a realidade é que ele terá poder.

De fato, mesmo sob o governo de Joe Biden, as empresas do bilionário vêm contando com amplos subsídios público. A SpaceX, por exemplo, vem trabalhando para criar uma rede de inteligência para o estado americano. A própria Tesla recebe isenções fiscais e apoio para garantir sua competitividade diante da concorrência chinesa.

Musk, ainda assim, cobrará por sua participação decisiva na eleição e já sinaliza que terá pleno acesso ao Salão Oval. Oficialmente, ele fez doações de US$ 132 milhões aos republicanos. Ele ainda prometeu US$ 1 milhão de forma aleatória a quem se registrasse para votar e que assinasse uma petição apoiando o direito a ter acesso às armas e, claro, à liberdade de expressão.

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Mas um trabalho “voluntário” não foi contabilizado: o uso da plataforma X como megafone das mentiras de Trump e de sua campanha, um cenário impossível de se imaginar em 2021.

Funcionários do Twitter se revoltaram contra Trump

Naquele momento, a cúpula da então Twitter atravessou dias intensos. Nos dias seguintes ao ataque ao Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, 300 funcionários da empresa assinaram e enviaram uma carta à direção da empresa furiosos com o comportamento da plataforma, de permitir que fossem usados para a difusão de uma proposta de golpe de estado. Apesar de nosso esforços para servir ao debate público, como um megafone de Trump, nós ajudamos a alimentar os eventos mortais de 6 de janeiro”, apontaram os técnicos.

A carta foi entregue para os executivos no dia 8 de janeiro. “Precisamos aprender de nossos erros para evitar futuros danos”, insistiram. “Temos um papel sem precedentes na sociedade civil e o mundo nos observa”, alertaram. “Nossas decisões nesta semana vão cimentar nosso lugar na história, para o bem ou não”, completaram.

Os funcionários pediam a suspensão completa de Trump das redes. Alguns deles ainda organizaram uma iniciativa para entrar em greve caso a direção da plataforma se recusasse a banir o então presidente.

Num primeiro momento, o republicano foi suspenso por 12 horas das redes. Mas, ao retornar, chamou os invasores de “grandes patriotas”. Naquele momento, a empresa entendeu que a mensagem era um incentivo para novos atos de violência, potencialmente no dia da posse de Joe Biden, em 20 de janeiro. Naquela tarde, os executivos decidiram que Trump teria de ser expulso do Twitter.

O que ninguém ali imaginaria é que, poucos meses depois, a empresa seria comprada por Musk por US$ 44 bilhões. O bilionário vinha de um acúmulo de frustrações com os democratas. Ao mesmo tempo, o monitoramento das agências reguladoras aumentou em relação aos negócios de Musk, com pelo menos sete órgãos de controle abrindo processos, assim como a procuradoria de Nova York.

Uma das investigações se refere aos acidentes gerados pelo sistema de piloto automático que a Tesla tenta desenvolver. Durante os testes, foram 467 acidentes, com 13 mortes e dezenas de feridos entre 2018 e 2023.

Já a Securities and Exchange Commission (SEC) abriu processos contra a Tesla por postagens nas redes sociais e por denúncias sobre a falta de transparência em relação a acionistas. A mesma SEC ainda investiga Musk por outras suspeitas no mercado financeiro, enquanto a Federal Trade Commission (FTC) examina propagandas enganosas por parte das empresas do bilionário.

Já o Departamento de Justiça acusa a SpaceX de discriminar refugiados em suas contratações, enquanto a Federal Aviation Administration tem criado obstáculos para aprovar novos lançamentos diante do impacto ambiental. A lista de frustrações de Musk ainda é completada com o veto de subsídios de US$ 900 milhões para a Starlink em um projeto de conexão para as zonas rurais dos EUA.

Houve ainda um episódio pessoal que, segundo a imprensa americana, teria levado o empresário a se aproximar ao movimento ultraconservador. Em 2022, sua filha declarou ser transgênero e abandonou o sobrenome Musk.

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Assim, quando Musk compra a plataforma Twitter, a promessa de que aquela seria uma rede “politicamente neutra” logo ganha outros contornos e se transforma num espaço de ataques e um local protegido para a extrema direita. Um dos primeiros atos foi demitir todos os funcionários responsáveis por monitorar a desinformação e restaurou mais de 62 mil contas, entre elas de grupos neonazistas, de pessoas envolvidas no 6 de janeiro e, claro, de Trump.

Em silêncio, o bilionário ainda retirou as proteções contra assédios contra pessoas transgênero e abriu espaço para a difusão do ódio da frustração de uma ala mais radical, principalmente de homens brancos.

O início da campanha de Trump ainda marcou uma aliança de interesses. Nas semanas que anteciparam à eleição, as mentiras postadas por Musk contra os democratas tiveram uma audiência acumulada de 2 bilhões de visualizações.

Sistemas de monitoramento também revelaram que a difusão de postagens da Casa Branca na plataforma de X caiu pela metade, enquanto publicações de republicanos viralizaram cinco vezes mais que posts de candidatos democratas.

Musk ainda criou um canal para permitir que supostas denúncias de fraude no voto pudessem ser realizadas e insinuou que essa seria a “última eleição” nos EUA.

A aliança entre Trump e Musk trouxe resultados ao candidato. Uma pesquisa realizada pela Universidade Harvard indicou que o republicado ganhou o apoio de 35% dos homens entre 18 e 24 anos. Em 2020, essa taxa era de apenas 5%.

O que as agências regulatórias querem saber é qual será o ganho para Musk, independente se irá ter ou não um cargo no governo Trump. O bilionário, porém, já deixou claro sua perspectiva: “o futuro será fantástico”, escreveu em sua primeira postagem após a vitória de seu aliado.

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Quem está sabotando a entrada do Brasil na Nova Rota da Seda?

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Quem está sabotando entrada Brasil Nova Rota da Seda
(Imagem: Ricardo Stuckert | PR)

Eduardo Vasco*

No mês passado, uma comitiva governamental se reuniu com altos funcionários chineses em Pequim. Dela, participaram o ministro Rui Costa, Celso Amorim, a ex-presidenta Dilma e o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, entre outros.

Os adversários da aproximação do Brasil com a China aproveitaram a oportunidade para pressionar o governo contra acordos fundamentais para o País, particularmente a entrada do Brasil na Nova Rota da Seda. No final de setembro, O Estado de S. Paulo, acompanhando as constantes movimentações, alertou, em editorial: “é preciso ponderar se isso é realmente necessário e se o custo geopolítico de um alinhamento desse tipo à China não será alto demais.”

O jornal O Globo já havia sinalizado preocupação semelhante com a possibilidade. “Promessas de investimento precisam ser bem analisadas, e só fazem sentido se canalizadas para projetos transformadores”, escreveu um colunista ainda em abril de 2023.

Em agosto, o presidente Lula disse, em evento na Confederação Nacional da Indústria (CNI), que “os chineses querem discutir conosco a Rota da Seda” e que, portanto”, “nós vamos discutir a Rota da Seda”. O interesse do presidente é absolutamente legítimo, levando em consideração que a Iniciativa Cinturão e Rota (outro nome para o empreendimento chinês) é nada menos do que o mais importante projeto de integração econômica da história mundial.

Ao contrário do Plano Marshall – o principal projeto econômico internacional dos EUA, executado para reconstruir a Europa no pós-II Guerra –, a BRI (na sigla em inglês) não é dirigida somente a um continente, mas, dez anos após o seu início, já está presente em todos os cantos do mundo. São 150 países participantes até agora e o mais importante é que trata-se de uma integração dos países de desenvolvimento econômico atrasado e que, portanto, tem como tarefa principal desenvolver suas economias (particularmente o setor produtivo) e realizar uma interligação.

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É curioso que o BRICS surgiu como uma iniciativa voltada fundamentalmente para a economia, mas inegavelmente se tornou um projeto mais geopolítico do que simplesmente econômico. E que a Nova Rota da Seda assumiu o papel de impulsionador da integração e do desenvolvimento econômico dos países do chamado “Sul Global”. Assim, a BRI está para a economia o que o BRICS está para a política internacional.

O imperialismo, sobretudo o americano, tem calafrios quando vê a China executando extensas obras de infraestrutura por toda a África. Logo esse continente amaldiçoado, que não sabe até hoje o que é uma verdadeira independência e cujas enormes riquezas têm sido confiscadas há quase 600 anos pela Europa e pelos Estados Unidos.

É claro que eles se assombram ao pensar que os países pobres podem querer deixar de ser seus escravos e, unidos, buscar um caminho de verdadeiro desenvolvimento. Por isso uma das principais acusações contra a BRI é que ela não passa de uma “armadilha” para a China endividar os países parceiros, financiando projetos que ninguém conseguirá pagar. Ora, não são os Estados Unidos quem fazem exatamente isso, por meio do FMI e do Banco Mundial? Não são eles os principais responsáveis pela dívida externa brasileira, avaliada em torno de 230 bilhões de reais?

A Nova Rota da Seda já financiou mais de 5 mil projetos, estimados em até 2 trilhões de dólares. Na América Latina, 21 países já fazem parte da iniciativa, tendo recebido 12 bilhões de dólares em investimentos. Somos apenas 9% dos países que participam da BRI, embora 70% da América do Sul já tenha aderido. Os únicos que ainda não aderiram são o Paraguai (que não tem relações diplomáticas com a China), Colômbia (que vinha de governos totalmente controlados pelos EUA) e o próprio Brasil. Por outro lado, o Peru foi um dos principais destinos de investimentos da BRI em 2023, uma vez que é um ponto estratégico para as rotas comerciais marítimas do continente com a China.

Efetivamente, o Brasil não tem como não se integrar de uma vez por todas à Nova Rota da Seda, porque isso seria uma sabotagem até mesmo aos nossos vizinhos. A iniciativa chinesa pretende investir em portos, ferrovias, estradas, aeroportos e na infraestrutura de comunicação e internet do país. Isso significa um aporte de grande importância nos esforços para reindustrializar o Brasil após quase quatro décadas de devastação neoliberal. E essas obras de infraestrutura, principalmente na área de transporte, se vinculariam às obras no Peru e nos outros vizinhos. Ou seja, a BRI é um caminho mais curto para a tão sonhada integração sul e latino-americana, que o presidente Lula defende.

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Zhu Qingqiao, embaixador da China no Brasil, explicou recentemente à CNN que, além de receber as obras cruciais de infraestrutura para reindustrializar o país, o Brasil também poderia elevar a qualidade das exportações para a nação asiática. O imperialismo americano sempre impediu o Brasil de se desenvolver e deixar de ser uma semicolônia exportadora de commodities. Bem, agora o Brasil poderia dar um grande salto adiante. Atualmente, nossas exportações para a China giram principalmente em torno da soja, minério de ferro e petróleo. A partir da entrada na BRI, afirmou o embaixador, a China irá facilitar a exportação brasileira de produtos de alto valor agregado, podendo o montante chegar a 110 bilhões de dólares. Isso tende a aumentar o superávit já existente na balança comercial com a China, enquanto a balança comercial com os Estados Unidos é deficitária. Importamos produtos industrializados dos EUA e exportamos produtos de baixo valor agregado – somos tratados como uma colônia.

Mas há quem ame ser tratado como uma colônia. Além dos grandes jornais da burguesia brasileira, os parlamentares bolsonarista não cansam de atuar contra os interesses nacionais. Eduardo Bolsonaro, o ursinho de pelúcia de Donald Trump, encabeça a oposição às aspirações de uma maior independência do Brasil. Só que, se já não fosse o suficiente a oposição de extrema-direita atuar contra os interesses nacionais, dentro do próprio governo há setores que não querem largar o mastro da bandeira dos EUA. De acordo com a CNN Brasil, são membros do Itamaraty (os mesmos que estão sabotando as relações com a Venezuela e com o BRICS?) e da Fazenda (aqueles que tentam agradar os banqueiros com o corte de gastos?).

É claro que essa defesa tão encarniçada da eterna submissão aos Estados Unidos não pode ser apenas uma paixão ideológica. Quando a representante do Comércio do governo dos EUA, no final do mês passado, aconselhou abertamente o Brasil (em plena São Paulo!) a não aderir à Nova Rota da Seda, ficou claro para qualquer um de onde vem todo esse medo em fazer parte do maior projeto geoeconômico da história. Afinal, quem ainda manda no Brasil é o Tio Sam. Lula briga contra elementos antinacionais guiados pela potência imperialista e a reunião que terá este mês com Xi Jinping, em Brasília, pode ser um passo decisivo para quebrar essa resistência reacionária e mostrar que quem deve governar o país é ele e a maioria do povo brasileiro, que o elegeu.

*Eduardo Vasco é jornalista especializado em política internacional e autor dos livros O povo esquecido: uma história de genocídio e resistência no Donbass e Bloqueio: a guerra silenciosa contra Cuba.

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Mentes explosivas

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Foto: Reprodução (
Foto: Reprodução (“homem-bomba foi ao STF”)

Lucio Massafferri Salles*, Pragmatismo Político

Acordei pensando nisto: Com a exceção de quando é para justificar agressões, violências, atentados e crimes, as pessoas foram doutrinadas a achar que desequilíbrio psíquico é “frescura” ou invencionice de desocupados.
Não?
Experimenta comunicar ao seu chefe que você está sem condições mentais de ir ao trabalho, sentindo estafa, tristeza profunda, desânimo forte (exploração e depressão passeiam de mãos dadas em toda sociedade capitalista)…
Fez?
Agora, se projete mentalmente tentando colocar uma bomba e detonar ela numa padaria, num cinema ou aeroporto, ou então agredir a socos, mordidas e chutes colegas de trabalho; in loco (e isto não é uma sugestão. Estamos aqui apenas conjecturando, certo?).
O que se sabe sobre ataque ao STF; Polícia faz varredura na Praça dos Três Poderes nesta manhã

Feito! Pânico, horror e caos espalhados para todos os lados.
Dando então um salto na ideia:
preconceito fortíssimo contra a Ciência Psicologia, presta atenção nisso.

Leia aqui todos os artigos de Lucio Massafferri Salles

Da Biopolítica à Psicopolítica

Quem costuma atestar desarmonia/desequilíbrio psíquico em nossa cultura hipócrita normalmente são médicos, com o uso das prescrições de remédios e laudos. E haja transtorno (e remédio…) para déficit e transtornos de A, B, C, D, X, Y, Z….hoje em dia.
Não é por mero acaso que a medicina e o direito têm em comum o instrumento “remédio”; o farmacológico e o jurídico (desde a Antiguidade Grega).
Justiça absolve procurador que espancou a chefe durante o trabalho por conta de esquizofrenia paranoide

Ainda não há aquele verdadeiro interesse social, e nem tempo, dirão, para se construir profilaxia, formação de consciência e educação, tal como uma boa dieta de vida que sirva para toda a grande comunidade.
Para buscar entender com profundidade, sem pressa, as erupções de ressentimento e de ódio, assim como a sua veloz disseminação nessa era da grande Rede, ajuda pensar na internet como “a grande revolução tecnológica no campo da comunicação, desde a invenção da escrita”.
Adolescente usa arma do pai e símbolo nazista em ataque a escolas

Não há como desacelerar a profusão de notícias, mensagens, imagens e alertas, linguagem (!), que se espalha ininterruptamente por todos os dutos da Rede para chegar às mentes de milhões de destinos.
Concluindo com um problema adiado (e urgente), veremos os efeitos da proibição dos celulares nas escolas/salas de aula; nas mentes dos jovens.

Leia também:

Comunicação e psicologia das massas na geopolítica da internet
Artefatos semióticos e catarse do riso nas guerras híbridas
O poder da linguagem da arquitetura do caos

*Lucio Massafferri Salles é jornalista, psicólogo/psicanalista e professor da rede pública de ensino/RJ. Doutor e mestre em filosofia pela UFRJ, especialista em psicanálise pela USU, realizou o seu estágio de Pós-Doutorado em Filosofia Contemporânea na UERJ. É criador do canal Portal Fio do Tempo, no YouTube.

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Nas redes da guerra: uma negligência programada

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Imagem: Happy Halloween - Steve Cutts © Todos os direitos reservados
Imagem: Happy Halloween – Steve Cutts © Todos os direitos reservados

Lucio Massafferri Salles*, Pragmatismo Político

Se a internet pública tivesse sido estabelecida sessenta anos antes do seu marco (1994), o nazismo e o fascismo provavelmente teriam vencido a 2a grande guerra, penso.
Sendo a maior invenção tecnológica no campo da comunicação, desde a invenção da escrita, a grande Rede é também um poderosíssimo fármaco (φάρμακον) para as mentes humanas.
Capaz de dividir e isolar ao extremo, essa tecnologia adaptou conjuntos de procedimentos psicológicos de condicionamento, cientificamente comprovados, usando reforço intermitente para influenciar, manipular e controlar indivíduos e grupos.
Há uma aurora disso, documentada, que remonta à virada do século (XX/XXI), onde determinados aplicativos e mídias voltadas para plataformas de rede social começaram a surgir (e que se evite aqui a tentação de recuar essa reflexão até Sun Tzu ou Edward Bernays…sugiro).

Leia aqui todos os artigos de Lucio Massafferri Salles

Não se dando conta dos fortes efeitos narcotizantes dos constantes e ininterruptos bombardeios de linguagens, grande parte dos usuários da Rede foram e vão se tornando adictos, sensivelmente deprimidos, extenuados e paralisados.
Se bem antes dessa revolução tecnológica digital já não era lá muito fácil ser escutado – considerando que saber ouvir o outro é uma arte que depende de exercícios constantes de empatia e alteridade – hoje em dia a coisa se perdeu de vez.

O inconsciente digital – leitura 7 da série Byung-Chul Han/livro “Psicopolítica

Ninguém se escuta, tanto dentro como fora das multifacetadas batalhas de endogrupos contra exogrupos.
E todos querem falar. Num solo virtual adubado por ressentimento, intolerância, amargura e ódio, pessoas se isolam, individualmente ou em bolhas, tendo a ilusão de que estão ativas em suas vidas comunitárias até há pouco compreendidas como reais.

O poder das linguagens sobre as psiques se encorpou

O “mal” não está na tecnologia. Não há “o mal”.
O que há é uma forte resistência coletiva em assumir certa ignorância acerca dessa espécie de problema (complexo) que envolve uma “fragilidade” no funcionamento do sistema psíquico humano.
Na verdade, uma limitação característica, uma lacuna, fissura ou brecha, se olharmos sob o prisma de que essa “abertura” pode ser atacada, tal como se fosse um território passível de ser dominado ou conquistado; controlado.
A resistência em querer entender o problema dentro do seu verdadeiro campo, o que lhe é próprio, acaba conduzindo a um adiamento de enfrentamento sob a forma de profilaxia e de ações efetivas em cima dessa grave questão social, que é também de saúde mental.
Nas redes dessa guerra não é exagero pensar que pode se tratar de uma negligência programada.

Do controle sistêmico à vigilância permanente

Leia também:

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Artefatos semióticos e catarse do riso nas guerras híbridas
O poder da linguagem da arquitetura do caos

*Lucio Massafferri Salles é psicólogo/psicanalista, jornalista e professor da rede pública de ensino/RJ. Doutor e mestre em filosofia pela UFRJ, especialista em psicanálise pela USU, realizou o seu estágio de Pós-Doutorado em Filosofia Contemporânea na UERJ. É o criador e responsável pelo canal Portal Fio do Tempo, no YouTube.

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Hugo Motta: quem é o candidato a presidente da Câmara apoiado pelo PL e pelo PT?

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Hugo Motta quem candidato a presidente Câmara apoiado PL PT
Hugo Motta Wanderley da Nóbrega

Araçá, EsquerdaDiário

Com o final de 2024 e início de 2025 se aproximando, o governo se prepara para a eleição do próximo presidente da Câmara dos Deputados. Desde já, o nome mais cotado é o de Hugo Motta (Republicanos), candidato de Arthur Lira à sua sucessão, que conta com uma frente de apoio com partidos como Podemos, PRD, Republicanos, PP, PSD, PSB, União Brasil, PV, PCdoB, PT e PL.

Eleito pela primeira vez em 2010, Hugo Motta é parte da dinastia familiar que governa a pequena cidade de Patos, na Paraíba, há décadas. É um antigo aliado da direita e da extrema direita no Brasil. Ganhou maior relevância nacional ao assumir a presidência da CPI da Petrobras em 2015, parte da reacionária operação Lava Jato. Aliado de primeira hora do golpismo, Motta foi pupilo de Eduardo Cunha e votou a favor do golpe institucional de 2016, de pronto sendo parte da “tropa de choque” do governo golpista de Michel Temer e da aprovação da PEC do teto de gastos e da Reforma Trabalhista — ataques reacionários que abriram o caminho para a superexploração do trabalho contra a qual se revoltam a juventude e os trabalhadores que lutam pelo fim da escala 6×1.

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Em continuidade a isso, Motta foi da base de apoio do governo asqueroso de Bolsonaro, compondo a bancada evangélica e a bancada ruralista. É um nome de confiança da direita para garantir os interesses do agro e das mineradoras, tendo votado a favor da urgência para a exploração de minérios em território indígena, bem como tendo votado a favor da PL490, projeto do Marco Temporal que é um ataque histórico aos povos indígenas que se soma às queimadas no projeto de expansão das fronteiras agrícolas e de massacre dos povos originários conduzido pelo agronegócio e pelo garimpo e impulsionado pela direita e extrema direita, mas que é também fortalecido pela divisão de tarefas entre o governo da Frente Ampla Lula-Alckmin e o STF.

Dentro do PL, Motta tem apoio direto de Bolsonaro bem como de Valdemar Costa Neto, bem como apoio do nojento Nikolas Ferreira, sob a esperança de que Motta cumpra um papel importante no avançar da “PL da Anistia” aos envolvidos no 8 de Janeiro. Já no PT, com aval direto de Lula, o discurso é de que o apoio a Motta é “reafirmar os princípios democráticos para garantir o funcionamento adequado dos partidos da Casa”, com setores minoritários querendo condicionar o apoio já garantido à possibilidade de não pautar a anistia do 8J.

Motta aparece então como o “candidato do consenso” da Frente Ampla: uma peça importante para o projeto do governo Lula-Alckmin de tentar reeditar o Lulismo sob bases senis, buscando estabilizar o regime político para garantir a manutenção e aprofundamento do conjunto da agenda do golpe de 2016, que tem no Arcabouço Fiscal — defendido por Motta — a sua continuidade.

A frente ampla em torno da eleição de um reacionário como Motta é mais um exemplo categórico da necessidade de construir uma alternativa dos trabalhadores que supere pela esquerda o PT e o seu projeto de gestão do capitalismo decadente. Uma alternativa com total independência de classe, de todos os patrões e governos, que confie apenas nas forças dos trabalhadores e setores oprimidos para impor a revogação de todas as reformas e cortes, mas também que imponha o fim da escala 6×1, a redução da jornada de trabalho pra 30 horas sem redução salarial, mirando a consolidação de um governo dos trabalhadores de ruptura com o capitalismo.

*Araçá é estudante de Letras da UFRN e militante da Faísca Revolucionária

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O padrão duplo de Josep Borrell

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padrão duplo Josep Borrell
Josep Borrell

Eduardo Vasco*

No início de novembro, o alto representante da União Europeia para as Relações Exteriores e a Política de Segurança, Josep Borrell, viajou a Kiev para sinalizar que os europeus continuarão seu forte apoio às forças armadas ucranianas na guerra contra a Rússia.

A visita se deu logo depois da vitória nos EUA de Donald Trump – que já indicou inúmeras vezes que pretende desengajar o seu país do conflito. “Temos apoiado a Ucrânia desde o princípio e hoje transmito a mesma mensagem: apoiaremos em tudo que pudermos”, afirmou o diplomata no dia 9.

Quando da estadia de Borrell em Kiev, o Instituto da Economia Mundial de Kiel, na Alemanha, calculava que a União Europeia já havia destinado 125 bilhões de dólares ao governo do presidente Vladimir Zelensky desde o início da intervenção russa, em fevereiro de 2022. Isso é mais do que o enviado pelos EUA (90 bilhões de dólares).

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Ao mesmo tempo em que defende de forma contundente a Ucrânia, Borrell tem sido um forte crítico do extermínio de palestinos por Israel em Gaza. Já chamou a situação no enclave palestino, onde mais de 44.000 pessoas foram mortas por Israel, de “tragédia humana” e “a maior crise humanitária desde a II Guerra Mundial”.

Também indicou que Israel poderia estar cometendo crimes de guerra e propôs, ainda em novembro, a suspensão das conversas entre União Europeia e Israel devido às violações dos direitos humanos e do direito internacional em Gaza.

Apesar da adoção de uma postura crítica sobre a atuação de Tel Aviv, é um absurdo considerar as posições do chefe da diplomacia europeia como antissemitas – algo que o gabinete de Benjamin Netanyahu tem feito. Em 2022, ficou famosa sua declaração de que o extermínio de 5 milhões de judeus pelos nazistas alemães na II Guerra foi “a maior tragédia da história da humanidade”.

Uma foto tirada pelo repórter Gleb Garanich, da agência Reuters, contudo, ajuda a jogar luz sobre o duplo padrão por trás do aparente humanismo de Borrell. Quando visitava uma exposição de equipamentos bélicos usados pelos ucranianos no conflito, ele passou diante de um tanque cheio de pichações e desenhos feitos pelos militares. Eles indicam que o tanque pertencia ao famigerado Batalhão Azov, pois havia o desenho de seu escudo, com um Z cortado, ao lado de uma suástica.

O Z cortado, dentro do escudo do Azov, é a Wolfsangel, um dos muitos emblemas utilizados pelos nazistas alemães. E a suástica – bem, a suástica…

O Batalhão Azov é um dos mais notórios participantes do lado ucraniano na guerra. Aliás, ele foi fundamental para o início da guerra. Foi fundado em 2014 por elementos neonazistas que formavam a tropa de choque do Euromaidan, revolução colorida que derrubou o então governo ucraniano e o substituiu por uma junta influenciada pelos grupos de extrema-direita que, como o Azov, tornaram-se proeminentes na política ucraniana desde então. O Azov esteve na linha de frente da investida do novo regime para suprimir as revoltas no Donbass contra o golpe de Estado, o que gerou o conflito que vemos até hoje.

“Os LGBT e as embaixadas estrangeiras dizem que não foram tantos os nazistas que participaram do Maidan, que só uns 10% eram [militantes] ideológicos”, disse, no início de 2022, Evgeni Karas, líder do C14, uma milícia neonazista. “Se não fosse por esses 8%, a efetividade [do Euromaidan] teria caído 90%”, continuou, acrescentando que, sem isso, o Euromaidan não teria passado de uma “parada gay” – esse tipo de reconhecimento só os extremistas mais descarados têm coragem de fazer.

O movimento que levou à derrubada do então mandatário, Viktor Yanukovich, e à ascensão das organizações de extrema-direita, teve origem na insatisfação da União Europeia com a postura do presidente ucraniano, que preferiu manter o status de neutralidade da Ucrânia ao não assinar um acordo de livre-comércio com o bloco. Uma das antecessoras de Borrell na chefia da diplomacia da UE, Catherine Ashton, logo realizou viagens à Ucrânia junto com Victoria Nuland, secretária-assistente do Departamento de Estado dos EUA, onde se encontraram com representantes dos grupos neonazistas. A fachada pretensamente democrática dos protestos, as ONGs, tiveram amplo financiamento da União Europeia e dos EUA, desde muitos anos antes do Euromaidan.

Triunfantes, os membros do Pravy Sektor e do Svoboda – outros agrupamentos neonazistas – assumiram cargos no judiciário, no Ministério da Defesa e em agências de segurança nacional. Seis dos novos governadores impostos pelo novo regime eram membros do Svoboda, que até 2004 se chamava Partido Nacional-Socialista da Ucrânia. O C14, antiga juventude do Svoboda, assinou, em 2018, um acordo com a prefeitura de Kiev para patrulhar as ruas da cidade, significando uma incorporação às forças oficiais.

Já sob o mandato de Zelensky, foi a vez do Azov ser incorporado à Guarda Nacional, como regimento. Sua milícia, que vigiava as ruas, passou à supervisão do Ministério do Interior, sendo enviada para operar por todo o país em conjunto com a polícia nacional. No final de 2021, Dmytro Yarosh, ex-líder do Pravy Sektor entre 2013 e 2015, tornou-se assessor do comandante-em-chefe das forças armadas ucranianas.

Em 2020, o parlamento ucraniano estabeleceu o aniversário de sete colaboradores notórios da ocupação alemã da Ucrânia na II Guerra Mundial como datas comemorativas oficiais. Entrementes, os membros do Azov ajudavam Zelensky a perseguir opositores. Em 2019, invadiram a casa de Viktor Medvedchuk e, um ano depois, o principal opositor do regime foi preso por “traição”, segundo Zelensky.

Os neonazistas não cessavam de receber prêmios e cargos no alto escalão do governo. Em dezembro de 2021, o presidente condecorou uma liderança do Pravy Sektor como “Herói da Ucrânia”. Isso indica o prestígio desses setores dentro do regime, mas também um pagamento pela sua atuação decisiva no campo de batalha.

São os grupos neonazistas que estão na linha de frente da guerra, desde o seu início. Os moradores do Donbass contam até hoje as histórias tenebrosas dos horrores cometidos pela infantaria ucraniana no período mais duro da guerra, entre 2014 e 2015. Em Lugansk, onde estive no primeiro semestre de 2022, quem mais barbarizou foi o Batalhão Aidar. Outra organização de combatentes neonazistas, o Aidar – assim como o Azov – recebeu financiamento do oligarca Igor Kolomoisky, o principal patrocinador de Zelensky. Os habitantes dos vilarejos em Lugansk nunca vão esquecer, por exemplo, do fuzilamento de 18 pessoas ao lado da igreja de Novosvetlovska, ou do bombardeio da própria igreja, onde dezenas de pessoas se abrigavam. Logo após a intervenção russa, Zelensky nomeou um ex-comandante do Batalhão Aidar como novo administrador-geral do oblast de Odessa.

Assim como as ONGs de fachada que abriram o caminho para o neonazismo se instalar no poder na Ucrânia, esses partidos e milícias armadas também foram – e continuam sendo – financiados pelos EUA e a União Europeia. Em 2016, uma parte dos armamentos enviados pelo Pentágono foi destinada ao Azov. No final de 2017, oficiais do exército americano prestaram assessoria no terreno àquele grupo. O Azov também recebeu instrutores e lançadores de granadas britânicos dos países da OTAN logo após a intervenção russa, assim como o Pravy Sektor.

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Relatório do Instituto de Estudos Europeus, Russos e Eurasiáticos da Universidade George Washington publicado em setembro de 2021 apontou que o grupo “Centuria”, também de orientação neonazista e formado por oficiais do exército ucraniano, participou de exercícios militares conjuntos da França, Alemanha, Polônia, Reino Unido, Canadá e Estados Unidos.

Concomitante à tomada das instituições do Estado pela extrema-direita fascista, a Ucrânia vem se despedaçando economicamente. Isso não se deve apenas à guerra, mas também ao alto preço pago por Kiev pela integração informal à União Europeia: o repasse dos bens públicos para mãos privadas, sejam de oligarcas nacionais ou de empresários e bancos estrangeiros. São as “reformas” que um governo subserviente faz para se adequar à vontade dos seus tutores.

“A Ucrânia continua avançando com reformas fundamentais para se tornar membro da UE, ao mesmo tempo que combate uma guerra de agressão”, disse Borrell em outubro, ao apresentar o relatório anual sobre a expansão da União Europeia. Afirmou ainda que o bloco “continuará apoiando a Ucrânia em ambas as frentes”.

A União Europeia já forneceu mais de 980 mil munições para a guerra da Ucrânia contra a Rússia, e Borrell prometeu chegar a um milhão até o final do ano. Cerca de 15 mil civis foram mortos no Donbass desde 2014, graças a esse tipo de incentivo.

*Eduardo Vasco é jornalista especializado em política internacional e autor dos livros O povo esquecido: uma história de genocídio e resistência no Donbass e Bloqueio: a guerra silenciosa contra Cuba.

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Mais uma tese de jerico: comparar Bolsonaro a Lula

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Mais uma tese jerico comparar Bolsonaro Lula
Lula e Bolsonaro

Moisés Mendes*, em seu Blog

A comparação da situação de Jair Bolsonaro hoje com as circunstâncias já enfrentadas por Lula, em 2018, é pueril e cai na armadilha de achar que quase tudo entre os dois tem equivalências. Não tem, nem pode ter.

A comparação mais recente é essa: assim como Lula, Bolsonaro tentará levar a ideia da candidatura para 2026 até o fim, para manter seu nome no jogo e tentar escapar da Justiça.

Pode até tentar, mas a tese de que a situação é a mesma é uma grande bobagem. Lula era a única chance garantida de sobrevivência das esquerdas, e não só do PT.

Por isso aglutinou toda a resistência em torno do seu nome, até decidir, na cadeia, que Fernando Haddad seria o candidato.

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As esquerdas esperaram por Lula porque ele era o líder caçado pelo lavajatismo. Dizer que poderia ser solto e concorrer era, claro, uma jogada política.

Lula foi libertado, voltou e venceu a eleição e depois venceu o golpe. Bolsonaro é, ao contrário, um nome a ser descartado pela direita, por representar um estorvo a todos, inclusive à própria extrema direita, que aposta num futuro com Tarcísio de Freitas.

Se fosse preciso resumir ainda mais, esse seria o resumo: Lula sabia, enquanto estava preso, que somente sua reabilitação política poderia salvar o país do fascismo.
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Hoje, direita e extrema direita, incluindo a elite empresarial e o mercado financeiro, sabem que somente a total degradação de Bolsonaro pode salvá-las.

Para que o jogo continue e os nomes à espera de um novo tempo possam prosperar, Bolsonaro precisa ser um morto político. É muito diferente da situação de Lula em 2018.

Não haveria chance alguma para as esquerdas e os democratas se Lula fosse inviabilizado para sempre. Não haverá chance alguma para direita e extrema direita com Bolsonaro ainda tentando jogar.

Lula era franco favorito nas pesquisas para 2018. Bolsonaro ainda é forte politicamente apenas em pesquisas de institutos marca-diabo.

Lula era unanimidade e unia as esquerdas. Bolsonaro racha a direita e impede que essa se rearticule. Parece complexo, mas é muito simples. A comparação é mais uma tese de jerico.

*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Editora Diadorim).

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A classe média já não sabe direito o que quer

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classe média já não sabe direito que quer
Imagem: Thinkstock

Moisés Mendes*, em seu Blog

Se um instituto de pesquisas aleatórias saísse a perguntar nas ruas se os brasileiros estão mais preocupados com a crise dos bois brasileiros com os bois franceses, ou com a sabotagem à isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, é possível que a briga dos bois se apresentasse como a maior preocupação.

O boi do Cerrado é mais defendido nos jornais e nas redes sociais do que a isenção. Porque a sabotagem dos jornalões é previsível, mas também porque um mecanismo da percepção básica está descalibrado no brasileiro. E porque a média hoje espera mais milagres do que alguma coisa com algum sentido lógico ou racional.

Pois leiam a manchete do Globo desse sábado: “Preocupação com impostos cresce e leva a percepção de que Brasil está na direção errada”.

Que história é essa numa hora dessas? Quando o governo propõe isentar a classe média de IR e ao mesmo tempo taxar os ricos, a manchete é sobre a preocupação das pessoas com impostos? Que leva à percepção de que o país anda na direção errada?

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Uma preocupação permanente, histórica, mas que agora vira manchete com essa formulação torta? Quando o próprio Globo bateu nas propostas do governo. A manchete é parte do jogo dos sabotadores.

Se Lula decidisse amanhã aumentar a isenção do IR para R$ 10 mil, com a compensação de receita pela tributação de fortunas hoje inalcançáveis, é possível imaginar que uma pesquisa viesse a mostrar que essa não é uma solução.

Porque desacomoda o que está acomodado, porque pode provocar fuga de ricos para a Argentina e porque não seria justo com os milionários. E porque a percepção média de hoje não é mais a mesma de 20 anos atrás, e o brasileiro se alinha a interesses que não são seus.

Se as universidades decidissem aumentar vagas para cotas, reduzir mensalidades de pobres e anistiar dívidas de estudantes negros, o impacto entre os beneficiados e seu entorno seria menor do que entre os ameaçados da classe média que teme pobres.

Porque cotas, Bolsa Família, nível de emprego, PIB, uma renda básica, confiança externa e estabilidade são dados da economia, não são mais informações que mexam, como mexiam, com realidades e sentimentos e que toquem os eventuais beneficiados.

Porque os pobres querem mais do que diversão e arte, mas não do mesmo. A classe média já nem sabe direito o que quer. E os ricos querem deixar tudo como está.

O sentimento médio, entre os que poderiam querer menos desigualdade, é de que a política e os governos dependem de milagres que levem à prosperidade, meio à la Pablo Marçal. Os tais movimentos neodisruptivos e new antissistema passam por cima até do discurso repetitivo da meritocracia.

Por isso Milei foi eleito e ainda tem alta aprovação na Argentina e Trump vai voltar ao poder nos Estados Unidos. Porque poderão produzir milagres e porque as ideias e as saídas apresentadas pelos considerados progressistas ou não conservadores – os kirchneristas na Argentina, os democratas nos Estados Unidos e os petistas no Brasil – não funcionam mais.

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Não existem mais como existiam até o século 20. Porque a classe média entrou na guerra contra o ativismo identitário acionada pelas próprias esquerdas. E também porque o sentimento sobre valores, na perspectiva de uma ética humanista, degradou-se nesse cenário de pulverização de referências.

Os valores hoje são, para repetir um clichê, os financeiros, os que trazem junto alguma cifra. Por isso o ministro Fernando Haddad foi conversar com banqueiros, e não com quem produz alguma coisa útil, para explicar o pacote fiscal sabotado pela direita, pela extrema direita, pelos jornalões e pela Faria Lima.

Foi dialogar, por imposição do mercado financeiro, com quem não produz nada, um tomate ou um alfinete. Nada. Mas uma pesquisa pode confirmar, pela opinião do brasileiro pobre e de classe média, que assim deve ser.

Até os bois do Cerrado e seus inimigos franceses, alguns deles influencers, sabem que essa é a realidade, nos campos e nas cidades.

*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Editora Diadorim).

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Mulher que tomou arma de militar durante tentativa de golpe na Coreia do Sul vira símbolo de resistência

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Mulher tomou arma militar durante tentativa golpe Coreia do Sul vira símbolo resistência
Ahn Gwi-ryeong

Yuna Ku, BBC

Durante os protestos na Coreia do Sul após o presidente Yoon Suk Yeol decretar lei marcial nesta terça-feira (3/12), uma imagem chamou atenção ao redor do mundo: uma mulher enfrentando soldados do Exército.

Saiba mais: O golpista do momento é o lavajatista da Coreia democrata e capitalista? É isso mesmo?

Ahn Gwi-ryeong, de 35 anos, porta-voz do Partido Democrático, sigla de oposição, tentou tomar a arma de um soldado durante o tumulto em frente à Assembleia Nacional do país. O Exército foi enviado para impedir que parlamentares entrassem no prédio.

“Eu não pensei. Apenas sabia que a gente precisava impedir isso”, disse ela ao serviço coreano da BBC.

Ahn se dirigiu ao prédio da Assembleia enquanto os soldados chegavam. Como muitos da geração mais jovem do país, o termo “lei marcial” era algo distante para ela. A última vez que havia sido decretada foi em 1979.

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Quando a lei marcial é declarada, atividades políticas como manifestações e comícios são proibidas, greves e movimentos trabalhistas são vetados, e as atividades da mídia e de editoras passam a ser controladas pelas autoridades. Quem descumprir as regras pode ser preso ou detido sem mandado.

“Um sentimento de pânico tomou conta de mim”, disse ela, sobre ter ouvido a notícia do decreto.

Após o voto do Parlamento, o presidente sul-coreano decidiu recuar e revogou a medida.

Retrocesso histórico

Logo após a declaração da lei marcial, o líder da oposição, Lee Jae-myung, convocou os parlamentares a se reunirem na Assembleia Nacional para votar pela anulação do decreto.

Chegando ao prédio da Assembleia por volta das 23h (horário local), Ahn relata que apagou as luzes do escritório para evitar ser detectada enquanto helicópteros sobrevoavam a área.

Quando chegou ao prédio principal, soldados confrontavam autoridades, assessores e cidadãos.

“Quando vi os soldados armados, senti como se estivesse testemunhando o retrocesso da história.”

Ahn e seus colegas trancaram as portas giratórias por dentro e empilharam móveis e outros objetos pesados em frente às entradas. Quando o avanço militar começou, ela tomou a iniciativa.

“Honestamente, fiquei com medo no início”, disse ela. “Mas, ao ver aquele confronto, pensei: ‘Não posso ficar calada’.”

A Assembleia aprovou a resolução pedindo o fim da lei marcial por volta da 01h, no horário local. Todos os 190 membros presentes votaram pela revogação. Às 04h26, o presidente Yoon anunciou que reverteria sua decisão.

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Após o caos, Ahn conseguiu dormir um pouco no prédio da Assembleia.

“Na verdade, fiquei um pouco assustada de sair da Assembleia pela manhã, porque não parecia haver táxis circulando, e, depois de uma tempestade como a de ontem à noite, era difícil voltar à realidade.”

Durante a conversa com a BBC, Ahn estava vestindo a mesma blusa preta de gola alta e jaqueta de couro que apareciam nas imagens da noite anterior. Em alguns momentos, ela se emocionou ao dar seu relato.

“É de partir o coração e frustrante que isso esteja acontecendo na Coreia do Sul do século 21”, desabafou.

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Marinha mantém silêncio sobre vídeo institucional que ofendeu o povo brasileiro

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Marinha mantém silêncio vídeo institucional ofendeu povo brasileiro
Vídeo institucional da Marinha

Sonar

Visto como indireta contra o pacote fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, um vídeo institucional divulgado pela Marinha do Brasil recebeu uma nota da comunidade no X. O conteúdo que celebra o Dia do Marinheiro alterna imagens de integrantes da força em treinamento e pessoas em momentos de lazer. No final, a gravação é encerrada com um questionamento militar: “Privilégios? Vem pra Marinha”. Para os usuários da rede social, o vídeo “não reflete a realidade”.

“O vídeo apresentado não reflete a realidade. Os militares da Marinha trazem benefícios e melhoria superiores à média da população brasileira. Por outro lado, grande parte dos brasileiros enfrentam jornadas de trabalho longas e exaustivas, com pouco tempo para descanso”, diz a nota .

A gravação foi criticada por políticos, caso da presidente do PT, Gleisi Hoffmann :

“O vídeo divulgado pela Marinha é um erro grave. Ninguém duvida que o serviço militar exige esforço e sacrifícios pessoais, especialmente da tropa que é arriscada nos treinamentos e faz o serviço pesado. Isso não faz dos cidadãos militares mais merecedores de respeito do que a população civil, que trabalha duro, não vive na farra. Também grave que o vídeo ofensivo seja divulgado no momento em que um ex-comandante da Marinha é indiciado por participar do plano de golpe de Jair Bolsonaro”, postou Gleisi, nas redes sociais.

O material faz parte da celebração do Dia do Marinheiro, comemorado em 13 de dezembro. A frase sobre privilégios é uma crítica indireta contra o pacote de Haddad. A proposta atinge diretamente os militares com a regra de 55 anos de idade mínima para aposentadoria. No plano previsto entre a Fazenda e a Defesa, a transição para que essa regra passe a valer será até 2032.

No pronunciamento feito na rede nacional, na quarta-feira, Haddad afirmou que, “para as reformas militares, vamos promover mais igualdade, com a instituição de uma idade mínima para a reserva e as limitações de transferência de pensões, além de outros ajustes. São mudanças justas e permitidas.”

De acordo com a colunista Bela Megale, a frase gerou muito incômodo nas Forças Armadas. Os militares argumentam que a carreira já tem baixa atratividade e apontam que a insegurança promovida pelo pacote pode gerar uma espécie de “êxodo” nas Forças. Ainda segundo Bela Megale, após a divulgação do conteúdo, Haddad sinalizou aos aliados que não vão se pronunciar.

Assista ao vídeo:

Entenda como é a remuneração de um militar da Marinha

O que comumente chamamos de salário, na Marinha do Brasil (MB) é denominado de remuneração. Esta é composta pelo soldo respectivo para o oficial ou para a praça mais adicionais militar e de habilitação. O soldo e os adicionais são variados, tanto para oficial quanto para a praça.

Tomemos como exemplo um oficial no posto de Primeiro-Tenente que, de acordo com a tabela de soldos de janeiro de 2019, ganhará R$8.245,00 de soldo mais adicional de 19% (militar) e 16% (habilitação), mas se este mesmo oficial tiver curso de pós-graduação lato sensu na sua área profissional e que também tenha ligação com o trabalho que ele realiza na instituição, ao invés de receber 16%, ele poderá receber 20%.

Além da remuneração, há diversos benefícios indiretos como alimentação, assistência médico-hospitalar, ajuda para aquisição de uniformes, entre outros.

Outro ponto importante é que todo militar de mesma patente ou graduação recebe o mesmo soldo independente de sua profissão. Ou seja: um Capitão de Corveta Médico receberá o mesmo soldo que um Capitão de Corveta Engenheiro.

Veja a tabela de soldo de 2019: https://www.marinha.mil.br/papem/node/73

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VÍDEO: Militantes do MBL tentam intimidar deputado do PT mas são colocados para correr

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militantes MBL provocam

Militantes do Movimento Brasil Livre (MBL) tentaram, mais uma vez, intimidar o deputado estadual Leonel Radde (PT-RS) na porta da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul.

Com o objetivo de ‘lacrar’ e ganhar visualização nas redes, militantes do MBL continuam repetindo o modus operandi de provocar parlamentares de esquerda enquanto gravam tudo com seus celulares. Mas dessa vez não deu certo.

Leonel Radde “enquadrou” os dois integrantes do movimento de extrema-direita nesta segunda-feira (16). Em um vídeo divulgado nas redes sociais, o parlamentar aparece colocando os militantes para correr.

“Com vagabundo é assim que age”, disse o deputado estadual, enquanto empurrava os integrantes do MBL. “Vaza daqui”, acrescentou. Por fim, imagens mostram os militantes desolados saindo da ALRS.

“Os sigmas do MBL resolveram dar as caras no fim do ano… e tomaram mais um enquadro antifa pra encerrar 2024 de forma divertida. Seguimos firmes na luta!”, escreveu Radde no X (antigo Twitter).

VÍDEO:

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A LÍNGUA DOS ARCHOTES

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Eduardo Bonzatto*, Pragmatismo Político

Vivemos em tempos medievais. Pelo menos de um medievo contemporâneo, anacrônico e voraz.
Os perseguidores que com suas achas caçam a diferença em todo canto parecem deter o monopólio da virtude, como já apontou outro autor.
São moralmente ilibados e fundaram a ordem eclesial dos defensores do bem.
E o lugar em que foram arrancar sua moral superior está representado por um rosto guia.
A palavra amor vibra em suas bocas adornadas por um esgar luminoso das achas do fogo purificador. Querem um mundo de amor. Como todos os antepassados, o bem, o amor carece sempre de alguma destruição.
A parte maldita deve ser eleita e criminalizada. E mesmo sem exterminá-la, a mancha de ignaros deve pousar sobre o grupo.
Aconteceu inúmeras vezes nas sociedades sacrificiais. Os racistas de Gobineau, os nazistas de Hitler, os fascistas espanhóis de Franco, os socialistas de Stalin, os alunos de Mao, os gays do Che.
Se a eliminação não se completou, os archotes iluminaram esses seres para o escárnio dos demais.
Hoje, aqui nesse país de futuro incerto, testemunho pessoas com archotes gritando slogans igualmente desumanos. Pessoas que se acham melhores, amparados em discursos que exumam dos demais sua humanidade e os condenam às penalidades usuais de exílio e encarceramento. Os archotes não permitem que vejam ali outros humanos.
E esses seres antiquados são artistas, professores universitários, com seus monopólios de virtude saindo pelas calças apertadinhas.
Já os admirei e dentre eles alguns foram meus amigos. Hoje me envergonho dessas atitudes e me afasto dessa gente como se tivessem lepra contagiosa.
Eu os admirava, há um tempo atrás. Partilhei de suas mesas e dialoguei com suas ideias. Hoje habitam a aridez da inteligência. Um deserto ocupa o lugar onde antes havia algumas ideias.
Me pergunto como é possível tamanha regressão?
Os lemas que levaram tantas pessoas íntegras à mais completa indignidade foram: Precisamos salvar a democracia! Precisamos salvar a verdade! Precisamos identificar os mentirosos e os golpistas!
E esses mantras dignos de imbecis serviram àqueles que outrora eu admirava, que dispararam nas redes as imagens de pessoas que protestaram contra seus líderes.
E num único movimento, adoraram esses líderes e os defenderam do perigo inexistente, incorporando discursos sem nenhum apelo à inteligência.
A inteligência saiu de férias e esses velhos amigos se regozijavam de sua ausência.
Me lembrei do experimento.
A terceira onda foi um experimento social para demonstrar que mesmo sociedades democráticas não estão imunes à atração pelo fascismo. Ele foi realizado pelo professor de história norte-americano Ron Jones com estudantes do segundo ano do ensino médio que frequentavam sua aula de história “Mundo Contemporâneo” como parte de um estudo sobre a Alemanha nazista.
O experimento aconteceu na Cubberley High School em Palo Alto, Califórnia, durante a primeira semana de abril de 1967. Jones, vendo-se incapaz de explicar aos seus estudantes como a população alemã poderia ter alegado não saber sobre o extermínio dos judeus, decidiu demonstrar isso a eles. Jones começou um movimento chamado “A Terceira Onda” e disse aos seus alunos que o movimento tinha o objetivo de eliminar a democracia. A ideia de que a democracia enfatiza a individualidade foi considerada uma desvantagem e Jones enfatizou esse ponto principal do movimento no seu lema: “Força através da disciplina, força através da comunidade, força através da ação, força através do orgulho.”

Leia aqui todos os textos de Eduardo Bonzatto

O experimento não foi bem documentado na época. Em fontes contemporâneas, o experimento só foi mencionado no jornal estudantil da Cubberley High School, The Cubberley Catamount. Ele é mencionado brevemente em duas edições, e uma outra edição do jornal tem um artigo mais longo sobre este experimento e sua conclusão. O próprio Jones escreveu um relato detalhado do experimento nove anos depois e mais artigos sobre o experimento foram feitos, incluindo algumas entrevistas com Jones e os estudantes originais.
Parece que estamos vivenciando experimento social similar em larga escala.
Para salvar a democracia construiram narrativas esdrúxulas com efeitos muito próximos daquele feito pelo professor Jones.
Rapidamente, aqueles que se protegiam do fascismo se tornaram fascistas ferozes com seus archotes ansiosos para queimar seus semelhantes.
Isso só é possível porque a desumanidade expandiu seus efeitos sobre todos aqueles que se julgam superiores. A objetificação se tornou prática relacional ocupando vidas que também se objetificaram no processo.
O termo relação social traduz essa objetificação. A reificação é já um dado da vida de muitas pessoas incapazes de refletir sobre o outro, já que o outro é o inferno.
Acompanhar o desenrolar de A terceira onda é quase acompanhar como os discursos em defesa da democracia ocuparam a vida dos que se sentem superiores hoje em dia, daí que a universidade e os artistas rancorosos encamparam abruptamente os discursos. A certeza é o grande inimigo da humanidade.
Jones relata que começou o primeiro dia do experimento com coisas simples como postura correta na cadeira e questionamento intensivo dos alunos. Depois ele focou em aplicar disciplina rígida na sala de aula, se portando como uma figura autoritária e melhorando dramaticamente a eficiência da turma.
A sessão do primeiro dia foi encerrada com apenas algumas regras, com o objetivo de ser um experimento de apenas um dia. Alunos tinham que ficar sentados com atenção antes do segundo sino, tinham que levantar para perguntar ou responder perguntas e tinham que fazer isso com três palavras ou menos, e deveriam preceder cada fala com “Sr. Jones”.
No segundo dia, ele conseguiu unir sua turma de história em um grupo com um senso extremo de disciplina e comunidade. Jones baseou o nome do seu movimento, “A Terceira Onda”, no suposto fato de que a terceira em uma série de ondas é a mais forte, uma versão equivocada de uma tradição atual da navegação de que toda nona onda é a maior. Jones inventou uma saudação que lembrava a saudação nazista e ordenou que os membros da turma saudassem uns aos outros mesmo fora da sala. Todos obedeceram esta ordem.
O experimento tomou vida própria, com estudantes de toda a escola aderindo: no terceiro dia, a turma aumentou dos 30 estudantes iniciais para 43 estudantes. Todos os alunos apresentaram melhora drástica nas habilidades acadêmicas e grande motivação. Todos os estudantes ganhavam um cartão de membro, e cada um deles recebia uma função especial, como fazer um símbolo da Terceira Onda, impedir que não membros entrem na aula, entre outras. Jones instruiu os alunos em como iniciar novos membros, e no fim do dia o movimento tinha mais de 200 participantes. Jones ficou surpreso quando alguns alunos começaram a informá-lo quando outros membros do movimento não obedeciam as regras.
Na quinta-feira, o quarto dia do experimento, Jones decidiu terminar o movimento porque ele estava saindo do seu controle. Os alunos se envolveram cada vez mais no projeto e sua disciplina e lealdade ao projeto era impressionante. Ele anunciou aos participantes que este movimento era parte de um movimento nacional e que no próximo dia um candidato à presidência da Terceira Onda seria anunciado publicamente. Jones convocou os alunos para uma assembleia na sexta-feira para testemunhar o anúncio.
Ao invés de um discurso televisionado do seu líder, os estudantes viram um canal fora do ar. Depois de alguns minutos de espera, Jones anunciou que eles tinham sido parte de um experimento sobre fascismo e que todos criaram voluntariamente um senso de superioridade como os cidadãos alemães tinham no período da Alemanha nazista. Depois ele exibiu um filme sobre o regime nazista para concluir o experimento.
Por um processo especular e espetacular, os que se submeteram ao processo para salvar a democracia por aqui, identificam naqueles a quem os archotes iluminam como fascistas e essa inversão não permite que algum resquício da velha inteligência emerja para salvaguardar alguma humanidade. E gritam em público o mantra de sua superioridade SEM ANISTIA!

*Eduardo Bonzatto é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) escritor e compositor
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VÍDEO: Policial youtuber que divulgava rotina nas redes morre após briga com colega PM

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cobra policial morre

Um policial militar conhecido por filmar suas operações foi morto a tiros no bairro do Arruda, Zona Norte do Recife, na noite desta sexta-feira (3). Misael Matheus da Silva, de 29 anos, mais conhecido como “Cobra Policial” foi assassinado por um outro PM, de 39 anos, que não teve a identidade divulgada.

O crime aconteceu nas proximidades do Boteco do Beu e foi registrado por câmeras de segurança de estabelecimentos locais. As imagens mostram quando um homem que estava dentro de um carro cinza dispara contra Misael Matheus, que passava pela rua. Momentos antes do crime, uma viatura da Polícia Militar passou no local.

De acordo com a Polícia Civil, o atirador apresentou-se espontaneamente na Delegacia. O caso foi registrado pela Força Tarefa de Homicídios na Capital como homicídio consumado.

Testemunhas relataram que o incidente pode ter sido motivado por uma briga de trânsito, mas os detalhes exatos do conflito ainda estão sendo apurados.

Misael era conhecido nas redes sociais por registrar suas operações policiais e compartilhar vídeos que mostravam sua rotina na corporação. Seu perfil acumulava milhares de seguidores e ele era uma figura popular entre os que acompanham o dia a dia das forças de segurança. A morte do policial chocou a comunidade local e gerou uma onda de homenagens na internet.

“E ainda tem gente querendo liberar as armas. Se dois policiais que supostamente deveriam ser treinados e habilitados para usarem armas de fogo, agem dessa forma, imagina o cidadão comum que por qualquer mínima coisa já quer partir pra agressão e intimidação”, observou um usuário.

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Quatro pessoas da mesma família morrem após comer arroz envenenado no Piauí

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arroz envenenado piauí

Francisca Maria da Silva, que estava internada após comer arroz envenenado em Parnaíba (PI), morreu na madrugada desta terça-feira (7). Ela é a quarta vítima da mesma família.

Francisca tinha cinco filhos e quatro deles morreram por envenenamento. Davi Pereira Silva, de um ano, e Maria Lauane Fontenele, de três, também morreram após comer o arroz envenenado. Já Ulisses Gabriel e João Miguel, de sete e oito anos, faleceram em agosto de 2024 após consumirem cajus envenenados.

A vizinha suspeita de envenenar Ulisses e João está presa. Segundo a TV Globo, Lucélia Maria da Conceição Silva, 52, responde por homicídio qualificado consumado contra os dois irmãos. Ainda não se sabe se há relação entre os dois casos de envenenamento.

Uma filha da mulher ainda segue internada. A menina de quatro anos está no Hospital de Urgência de Teresina. O irmão de Francisca, Manoel Leandro da Silva, de 18 anos, também morreu.

ENTENDA O CASO

Nove pessoas de uma mesma família passaram mal após comerem os restos da ceia de Natal na quarta-feira (1º). Quatro morreram, quatro receberam alta e uma segue internada, segundo a SSP.

Arroz envenenado causou as mortes, diz laudo. Substância encontrada no chumbinho estava presente na comida, informou a Polícia Científica. Um componente chamado terbufós, também encontrado em pesticidas e agrotóxicos, foi achado no arroz consumido na casa, mostrou o laudo ao qual o Fantástico teve acesso.

Perícia descartou a possibilidade de que peixes doados à família estivessem envenenados. O casal que fez a doação foi ouvido pela polícia, mas não é considerado suspeito do crime, já que também doou peixes a outras famílias e consumiu o alimento em casa, sem qualquer problema.

Suspeita é de que o alimento tenha sido contaminado na madrugada. O mesmo arroz que foi consumido no dia 1º pela família foi usado na ceia de fim de ano no dia anterior, quando ninguém passou mal. “Todo mundo dormindo. Tem capacidade de ter entrado alguém aqui e colocado esse veneno nas comidas”, afirmou Maria dos Aflitos, matriarca da família, ao programa.

Familiares apresentaram os mesmos sintomas. Segundo o delegado Abimael Silva, eles tiveram frequência cardíaca abaixo do normal e sudorese intensa, sinais de envenenamento.

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“Nova Ordem” é o DNA da extrema-direita neoliberal da era digital

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Foto: Saul Loeb/Pool/AFP via Getty
Foto: Saul Loeb/Pool/AFP via Getty

Lucio Massafferri Salles* (Pragmatismo Político)

Vivemos uma época caracterizada por ideias, práticas e estratégias de comunicação promovidas por pensadores/CEOs que moldaram a grande Rede, que se encontra colonizada como um Eldorado.
Estes empresários do Vale do Silício são líderes das maiores Big Techs do planeta. Foram pioneiros na dita “colonização da internet”, em que os mais bem equipados tomaram a frente, transformando-a em um espaço dominado por suas visões próprias de sociedade, mundo e interesses particulares.
Se veem como uma espécie de contracultura tecnológica desejosa de acabar “com tudo isso que tá aí”, inspirando, influenciando e amplificando movimentos políticos e culturais de costumes conservadores, relativamente atualizados, sempre em busca de dinheiro e poder.
Pela perspectiva da psicopolítica, essa chamada “nova extrema-direita” brota do solo de um capitalismo surrado, do século XX, não exatamente como consequente “evolução natural”, na direção de um neoliberalismo da era digital.
Esse neoliberalismo líquido, de relações superficiais (Baumann), ou de uma sociedade em rede (Castells) que se funda em uma lógica de controle na qual os muros, barras e espaços confinados, são trocados por senhas que autorizam (Deleuze), regulam e identificam pessoas qualificadas, quantificadas e perfilizadas nos Big Data.

Reagindo à máquina do caos 7 / O DNA da sociedade digital e a “nova extrema-direita”

O neoliberalismo multi-uber é o da paisagem zumbi, ou do vício propositalmente condicionado nos smartphones e embolhamentos narcísico futuristas, de aprisionados nesse panóptico digital.
Muito se tem discutido sobre o porvir desta segunda posse de Donald Trump como presidente dos EUA e do seu alinhamento com os líderes das mais poderosas big techs do planeta, como Jeff Bezos, Elon Musk e Mark Zuckerberg.
A primeira eleição de Trump, em 2016, foi totalmente impulsionada pela força da comunicação massiva e de longo alcance do Facebook, que serviu como plataforma para a propagação de conteúdos provenientes de sites como Breitbart assim como de toda uma cultura memética nascida em espaços virtuais como a plataforma imageboard 4chan.
Nessa época, os filtros nas redes sociais eram praticamente inexistentes. E hoje, embora até há pouco ainda aplicassem uma ou outra restrição, estas parecem ser superficiais.

Leia aqui todos os artigos de Lucio Massafferri Salles

Os líderes das grandes empresas tecnológicas do Vale do Silício e primeiras startups que vingaram como bem sucedidas plataformas de rede social, sempre nutriram a ideia de estarem à frente de uma espécie de contracultura revolucionária, baseada na tecnologia informatizada e numa nova concepção de sociedade, em rede, com contatos, perfis, postagens, dispositivos de validação social, cujo objetivo seria, também, o de reconfigurar o “status quo” do século XX; construindo uma nova ordem à imagem das suas concepções hierarquizadas de mundo.
Porém, ao invés de promoverem uma revolução popular de base, de baixo para cima — como seria uma mobilização voltada contra as desigualdades e pela defesa de direitos suprimidos —, o que se vê é um movimento direcionado de cima para baixo: uma transição de poder concentrado em elites para novas elites, mantendo intactas as hierarquias e exclusões estruturais.

Tecnologias dominadas pelas big techs colocam a democracia em risco em várias frentes

Creio que dois pontos importantes para começar a enfrentar, de fato, esse “novo poder” estão sendo negligenciados.
O primeiro é a subestimação do alinhamento ocorrido, há décadas, entre a ciência da psicologia e a cibernética, voltado para a influenciação, manipulação e controle das mentes.
Trabalhando em conjunto, Psicologia e Cibernética/Ciência da Computação puseram a arte de conquistar corações e mentes na era das guerras híbridas do século XXI.
O segundo foi a necessidade de se criar plataformas de redes sociais, nacionais, capazes de, com o tempo, escapar do jugo das big techs estrangeiras; promovendo paralelamente políticas públicas de letramento digital.
Nesse sentido, não há novidade no alinhamento entre Meta, Alphabet e X / Tesla, com governos como o de Trump.

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*Lucio Massafferri Salles é filósofo, psicólogo e jornalista. Doutor e mestre em filosofia pela UFRJ, especialista em psicanálise pela USU. Criador do Portal Fio do Tempo (YouTube).

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