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Entre lunáticos e parasitas: o que vem por aí?

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Imagem: Alan Shapiro

Denis Castilho*, Pragmatismo Político

Depois da saída de Moro do governo de Bolsonaro, não faltam especulações sobre o que vem pela frente. No jogo do poder, o caminho da Globo ficou mais evidente e representantes do mercado rentista temem a saída de Guedes. As investidas do grupo da família Marinho contra o governo estavam delicadas por conta de um conjunto de fatores, inclusive porque Moro estava lá dentro. Mas o imbróglio vai além.

O rearranjo interfere em peças importantes, a exemplo de grupos corporativos (notadamente ligados ao capital rentista), de líderes partidários e de militares de alta patente. Independente se sustentam apoio ao atual governo ou se seguem sem ele, esses grupos se movimentam em torno de um projeto em comum. Fato é que são ainda mais perversos porque carregam um estigma de controle e de manipulação muito mais bem articulado e engenhoso. De imediato, não abrem mão dos lunáticos porque ganham posições a cada episódio protagonizado por eles. Mas isso parece ter um limite.

A trama que se anuncia visa desmontar as instituições ditas democráticas e armar um aparelho de Estado ainda mais autoritário e cerceador. A estratégia, contudo, não segue os padrões de 1964. Trata-se de uma corrosão por dentro e amparada por acordos político-econômicos que não hesitam costurar apoio às esferas religiosas e milicianas. A repetida substituição de ministros por militares e pastores não deixa de ser um sintoma, bastando observar que o fundamentalismo religioso-militar já ocupa posições estratégicas no poder.

As reformas que aprofundam as desigualdades e alavancam o autoritarismo, o contexto que intensifica o conflito capital-trabalho, as brechas para legalização de invasão em terras indígenas, a conexão com milícias e fundamentalistas religiosos, a fratura e/ou inércia das esquerdas institucionais e a própria circunstância desencadeada pela pandemia também abrem caminho a este conluio.

Leia aqui todos os textos de Denis Castilho

Bolsonaro não deixa de ser funcional ao arranjo e, obviamente, não é ingênuo. Basta observar a jogada com o centrão, o incentivo aos atos pró-intervenção militar, a ampliação do porte de armas e o cinismo que se arrasta há décadas. A correlação com o fundamentalismo religioso-militar é explícita. A sina de lunático, as motivações conspiratórias e principalmente as tramoias junto aos filhos, contudo, colocam prazo de validade àquilo que o sustenta – salvo o projeto que, com ele ou sem ele, se desenrola.

Embora esta coalizão guarda estreita relação com generais, sua agenda não se fundamenta puramente nos preceitos militares. A ruptura em marcha não pode ser localizada com precisão porque guarda relação com os regimes de acumulação e encontra eco nas tendências que se desenham com a pandemia. Um modelo de Estado ainda mais perverso se anuncia porque as corporações, influenciadas por novos imperativos da geopolítica, o demandarão em sua forma mais radical.

É por isso que esta coalizão encontra ressonância nas tendências de novas formas de acumulação e carrega um sistema de violência muito mais denso e bem articulado do que aquele ensaiado pelos lunáticos. Portanto, não se iludam. Embora o episódio da demissão do ex-ministro da justiça sugira a derrocada de um governo, a trama da pilhagem e do autoritarismo apenas continua. O episódio também desnuda, obviamente, a falência de um pseudo líder, bastando lembrar que, enquanto o país registra mais de 63 mil casos de Covid-19 e quase 5 mil mortes (número muito abaixo dos casos reais em função das subnotificações), o governo endossa a crise política, incentiva aglomerações e conduz o país a uma tragédia que não ficará registrada apenas nas lápides.

Em um cenário onde a esquerda institucional se perdeu no poder e se fragmentou totalmente, a premissa de que o fundo do poço é mais embaixo se tornou apenas um detalhe. O leviatã beira o barranco e as distopias estão vivas. Diante das novas demandas de controle e dos imperativos corporativistas, a elite de rapina sabe que a convivência com lunáticos termina em algum momento. Aproveitando das circunstâncias e do embrutecimento de boa parte da população, os dementes até que foram funcionais, mas ficarão em desuso.

De agora em diante, o pragmatismo perverso bate à porta. Mas o jogo da rapinagem não pode continuar alimentando uma esquerda letárgica e do “tira sarro”. É um erro dizer que o jogo virou porque a polarização não deixará de se alimentar do cinismo e da inação. As investidas contra o terraplanismo, ao deixar de mirar o alvo certo – ao não dar lugar à uma forma de organização séria e baseada no protagonismo, terminou por colocar o jogo em um patamar ainda mais perigoso.

Enquanto assistíamos e zombávamos dos tolos, os parasitas se alimentavam, cresciam, ocupavam lacunas e, agora, começam a fervilhar na superfície. Resta lembrar que eles guardam uma diferença básica em relação aos lunáticos: são crescidos, organizados e sabem muito bem que a terra é redonda e continua a girar.

*Denis Castilho é doutor em geografia e professor do Instituto de Estudos Socioambientais da Universidade Federal de Goiás.

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Eu sou robô do Bolsonaro

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Jorge Silva de Andrade*

O Twitter é uma rede social grande no Brasil, desse modo, comporta todos os tipos de opiniões e comportamentos, no entanto, há um limite para essa atuação, ou seja, comentários ofensivos, pejorativos, ataques pessoais, dentre outros tipos de ofensas, não são permitidos.

Como todos já sabemos, o Presidente Jair Bolsonaro, desde o começo da sua campanha, utiliza bots para impulsionar os tweets e fazer com que suas publicações e fakes, sejam disseminados, abrangendo um grande número de pessoas.

Do mesmo modo, seus seguidores, aprenderam e assimilaram bem os ensinamentos de seu mestre, sendo assim, utilizam de redes de bots, para impulsionar suas publicações, em grande parte caluniosas.

Leia também: Desabafo de “ex-fã número 1” de Jair Bolsonaro viraliza nas redes

O que venho denunciar nesta matéria é o ataque sofrido pelo grupo Conexão Petista, conduzido por amigos que utilizam a conta para denunciar os abusos do governo e conectar pessoas simpatizantes e militantes de esquerda no Twitter.

Recentemente, todos os administradores do Conexão, sofreram retaliação virtual, de uma conta que diz apoiar Bolsonaro. Os ataques são feitos através do comando “carne fresca” e acontece quando os responsáveis pela retaliação compartilham os perfis de pessoas de esquerda e colocam na descrição “carne fresca”.

Contudo, esta conta não atua sozinha, sempre marcam dois ou três perfis na publicação, para que iniciem os ataques, a partir daí você passa de receber uma série de ofensas e xingamentos.

No entanto, observando o perfil das contas que realizam o ataque, percebemos que são contas fakes, ou seja, bots. Isto porque, contam com zero ou nenhum seguidor, além de também não seguir praticamente ninguém, fora o fato de não postarem nada no twitter.

Seguem alguns prints enviados pelos administradores do Conexão Petista, para que possam ver essa farsa.

sou robo bolsonaro twitter internet

*Jorge Silva de Andrade é historiador, formado pela UNESP. Atualmente, voltando seus olhos para a Literatura, tenta constituir relatos fictícios de situações nem tão ficcionais assim.

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A arte da dissuasão nas redes sociais

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Ícones de Redes sociais (Reprodução)
Ícones de redes sociais (Reprodução)

Eduardo Bonzatto* e Luis Gustavo Reis*, Pragmatismo Político

A informação é valiosa no sentido de que é a partir dela que um sujeito é capaz de se posicionar perante a sociedade. Quando esta é verdadeira e ancorada à realidade, manifesta-se a possibilidade, por parte de quem lê, de persuadir o outro, ver o corpo social de uma maneira mais crítica e construir um pensamento capaz de influir o mundo que o rodeia. Estar bem informado requer um exercício constante, ininterrupto e diário.
(http://www.filologia.org.br/rph/ANO23/69supl/038.pdf)

A dissuasão é um artifício poderoso nos tempos em que as redes sociais definem a política. Não por acaso, os que ocupam atualmente o poder da Re-pública brasileira são tidos como dissuasivos, contraditórios, disléxicos e por aí vai…

Ao contrário da persuasão, cuja força discursiva deve ser consistente, utilizando da retórica com eficiência, a dissuasão causa um temor, uma ameaça que força o indivíduo a se sujeitar a desígnios que por vezes nem se dá conta.

A dissuasão é um exercício que requer habilidade e sutileza para que nem seus detratores consigam inviabilizar sua força. Na era da comunicação, em que as informações estão disponíveis como nunca antes, dominar as emissões e as resultantes delas na mente dos usuários se tornou uma verdadeira arte.

Destacamos neste texto dois estrategistas políticos contemporâneos, que utilizam cirurgicamente a dissuasão em suas ações. Ambos convergem nos procedimentos adotados e utilizam as redes sociais como ferramenta para fermentar o movimento que defendem.

Os estrategos são Steve Bannon, ex-assessor do presidente Donald Trump, nos Estados Unidos, e Dominic Cummings, articulador do movimento Brexit, no Reino Unido.

As ações desses personagens são conhecidas como atividades de inteligência e nutrem as redes sociais com todo tipo de teorias (reais ou fictícias), imagens (verdadeiras ou falsas), análises (imaginadas ou verídicas), intrigas (forjadas ou autênticas), polêmicas, etc.

Dentro desse viés, também usam dados dos usuários para atingir seus interesses. É conhecida a iniciativa da empresa londrina Cambridge Analytica, que conseguiu informações de milhões de usuários do Facebook (comentá-rios, curtidas, mensagens privadas, etc), traçou o perfil psicológico de cada um deles e utilizou os dados para verificar suas predisposições em acreditar em teorias da conspiração e serem passíveis de influência. As análises desses dados, inclusive, foram decisivas para o sucesso do Brexit.

As semelhanças entre Bannon e Cummings não é apenas de procedi-mento operacional. Por exemplo, ambos são nacionalistas convictos e esse aspecto carece de melhores explicações. Não se trata mais do velho nacionalismo que conhecemos, mas de um outro tipo, marcado por valores contundentes do neoliberalismo.

Cummings nos presenteia com uma amostra dessa vertente que chama-remos de “nacional-neoliberal”, num artigo intitulado “Algumas reflexões sobre educação e prioridades políticas”, Nele, o estratego sugere que a Grã-Bretanha estaria se transformando numa sociedade “tecnópolis meritocrática”. Além disso, aponta que “quando as pessoas olham para as lacunas entre crianças ricas e pobres que já existem em uma idade jovem (3-5 anos), elas quase universalmente assumem que essas diferenças são por razões ambientais (“privilégios de riqueza”) e ignoram a genética”. Ou seja, a diferença não seria por questões sociais, mas sim biológicas.

No mundo atual, seria bem difícil condicionar a globalização com o nacionalismo. Por isso, os ideólogos dessa direita alternativa, adotaram e ampliaram o conceito de “globalismo” e os enquadraram nos cânones da novilíngua. Globalismo, ademais, é um conceito chave do neoliberalismo nesta fase nacionalista em que vivemos.
Cabe sintetizar aqui o que esses ideólogos entendem por globalismo, que nada tem a ver com o conceito de globalização. O termo “globalismo” não tem um sentido único e preciso, pelo contrário, é vago, abrangente, difuso, portanto, característico do método Bannon e Cummings.

Embora não seja sinônimo de globalização, a semelhança com esse ter-mo faz com que as pessoas pensem que saibam do que estão falando. Eis aí mais um aspecto do discurso dissuasivo: habilidade de enganar seus detratores para que não consigam inviabilizar sua força. Quando os detratores ridicularizam os “globalistas”, o fazem de forma caricatural, como se o conceito fosse sem sentido e absurdo, sem detectar o que está subjacente ao discurso.

Segundo Jan Blommaert, professor de Língua, Cultura e Globalização, o termo globalismo é a “munição ideal para o século 21, perfeito para as redes sociais. No mundo do Twitter, é ideal: é uma palavra com vários significados distintos e várias aplicações diferentes. Ideias longas e argumentos são reduzidos a uma palavra ou uma frase”, aponta o catedrático.

Outro ponto característico, levantado por Or Rosenboim, professora de História Moderna da City University de Londres, é “que embora usem essa retórica, os líderes de direita não estão falando de verdade sobre ‘globalismo’. É mais como uma versão falsa ou uma caricatura de globalismo. Eles dizem atacar a ideia de que 1% de pessoas ricas no mundo lucraram com essa nova condição de interconexão […], mas há muita retórica e um certo truque para apelar para as pessoas ignoradas pelo mercado neoliberal. O globalismo neo-liberal existe, mas eles não protestam contra isso de fato. Protestam contra uma elite liberal cosmopolita, não necessariamente contra as pessoas ou instituições responsáveis por estabelecer esse tipo de mercado.”

Leia aqui todos os textos de Eduardo Bonzatto

Um dos aspectos martelados pelos nacionais-neoliberais é que o globalismo refere-se ao governo global administrado pelos marxistas, que deve ser contraposto a um governo nacional forte. Mas aqui reside a contradição: governo nacional forte, porém, num estado mínimo. Ou seja, eles mantêm os protocolos neoliberais sem alterações, mas eliminam, com isso, inconveniências geradas pela grande concentração de renda nas mãos de poucos.

É justamente essa concentração de renda que impulsiona grandes movimentos migratórios de pessoas expulsas de seus países, que ao chegarem aos destinos desejados, despertam valores xenófobos, racistas, sexistas, jogando pautas como igualdade (fim da concentração de renda) e diversidade (valorização dos migrantes) no colo dos marxistas-globalistas.

O chanceler brasileiro Ernesto Araújo resume bem a pauta anti-globalista na seguinte frase: “O globalismo se constitui no ódio, através das suas várias ramificações ideológicas e seus instrumentos contrários à nação, contrários à natureza humana, e contrários ao próprio nascimento humano”. Se os marxistas-globalistas valorizam os migrantes, portanto, são contrários à nação.

Segundo Ben Teitelbaum, comentarista político estadunidense, “Para os tradicionalistas, a era das trevas em que vivemos é o globalismo, em que a hierarquia é destruída e não há fronteiras nem limites –e a tradução máxima disso são as instituições que desafiam fronteiras, como ONU, União Europeia, OMS.”

Nesse sentido, trata-se de um slogan político para reforçar distinções cuja ambivalência o termo “tecnópolis meritocrática” contempla, em que a globalização operava estritamente por valores técnicos solapando os valores humanos que só a nação, a sociedade de sentido, com seus valores étnicos, raciais, históricos, pode corrigir.

Em discurso na Assembleia Geral da ONU, Donald Trump afirmou que “os Estados Unidos sempre vão escolher a independência e a cooperação em vez de governos globais, controle e dominação”, honrando “o direito de cada nação de buscar seus próprios costumes, crenças e tradições”.

Leia aqui todos os textos de Luis Gustavo Reis

Com esse discurso ambíguo, Trump alinha-se aos prognósticos de seu ex-estrategista, Steve Bannon, que também opera da mesma forma dúbia. Quando era diretor do Breitbart News LLC, site de notícias de extrema-direita, Bannon já emitia sinais para a consolidação de uma posição de direita mais alternativa. No entanto, ao passo que condenava conotações racistas e antissemitas, disseminava material racista, xenófobo, sexista e antissemita nas artérias dessa mesma direita. Apesar das inúmeras denúncias de que o site sistematicamente propagava notícias falsas, histórias enganosas e teorias da conspiração, o número de acessos da plataforma só aumentava.

O jogo de ambiguidades nos sinais emitidos por Bannon e Cummings, tanto para dentro quanto para fora de seus nichos de atuação, foram consolidando um fazer político que se não é novo, a forma operacionalizada por eles nas redes sociais tornaram explosivo.

Não é por acaso, portanto, que ambos foram estrategistas bem-sucedidos nos últimos anos. Cummings na votação para que o Reino Unido saísse da Zona do Euro e Bannon com a eleição de Trump para a presidência dos Estados Unidos. É por isso que consideramos fundamental (e este artigo é apenas um estímulo) analisar os mecanismos com que esses dois operadores políticos movimentam as redes sociais e a forma com que lidam com a comunicação.

A posição política de Cummings e Bannon em relação ao coronavírus também se aproxima. Em fevereiro de 2020, Cummings alegou que a estratégia do governo britânico para o coronavírus era “imunidade de rebanho, proteger a economia e, se isso significa que alguns aposentados morrem, muito mal”.

Já Bannon ofereceu um jantar também em fevereiro, onde reuniu populistas de direita europeus e latino-americanos, entre eles o deputado federal Eduardo Bolsonaro. Ao voltar do jantar, Eduardo Bolsonaro conversou com o pai, Jair Bolsonaro, outro seguidor ferrenho da pauta de Bannon, e anunciou que a volta ao trabalho teria menos impacto do que as mortes: “Infelizmente, algumas mortes terão, paciência, acontece, e vamos tocar o barco […] A economia não pode parar por causa do coronavírus”.

Bolsonaro, por exemplo, que se tornou mestre na arte da dissuasão, ou da ambiguidade discursiva, durante a crise do vírus forçou seus opositores a detratar as práticas da medicina tradicional, valorizando as condenáveis práticas da grande indústria farmacêutica. Desta forma, pela dissuasão, convidou a velha esquerda a mudar seus discursos e a abandonar as utopias que a caracterizaram, entre elas a valorização de saberes ancestrais. Aliás, fazer os inimigos falarem é uma arte nesses tempos.

O pensamento de Cummings e Bannon carrega algo da novilíngua, idi-oma fictício criado pelo governo hiperautoritário no livro “1984”, de George Orwell. Na obra, o conceito novilíngua não significa a criação de novas palavras, mas a “condensação” e “remoção” delas ou de alguns de seus sentidos com o objetivo de restringir o pensamento.

Para este texto, no entanto, a novilíngua tem um sentido mais abrangente do orwelliano. Aqui o termo significa produzir duplicidade, ambiguidade e a capacidade de acionar a dicotomia como elemento fundamental do pensamento. Nesse sentido, a dicotomia cumpre o papel de produzir discordância ou concordância automaticamente, eliminando qualquer espaço para a crítica, no sentido de desvendar a dinâmica ideológica.

Nunca é demais recordar que pensamento crítico não é ser do contra. Isso é pensamento linear e dicotômico. Pensamento crítico é ser complexo. Pensamento complexo é pensar com as diferenças, não com as semelhanças. Pensar com as semelhanças é pensamento único, portanto, estandardizado, ou seja, fascismo.

Tanto Cummings quanto Bannon são conservadores, mas é preciso se despir dos preconceitos habituais para investigar o termo com a complexidade que se exige. Numa breve definição, o conservadorismo é uma ideologia política que defende a manutenção de instituições tradicionais, tais como família e religião, assim como busca preservar costumes, tradições e convenções.

Por essa definição, algumas questões já se pronunciam. As instituições, por sua natureza, são estruturas que amarram todas as pessoas em torno de um projeto de futuro. Mesmo quando o lema é “mudança”, essas supostas transformações não incluem a base das instituições que de modo inato optamos por conservar, a família, a propriedade privada, o Estado.

Destarte, notamos uma ambiguidade fundamental: queremos mudar, mas para conservar o que temos. Ora, não se trata de negar a classe, ele existe, mas a propalada luta de classes, essa sim, há décadas foi substituída pelo consumismo; o fetiche da mercadoria prevaleceu sobre as possibilidades políticas.

Não é mais possível, então, se valer das costumeiras interpretações da esquerda, em grande medida, baseada no binarismo mental para interpretar a forma conservadora de se posicionar no mundo atual, infinitamente mais complexa.

O político estadunidense Russell Kirk, assim traduziu a luta da conservação (“direita”) contra a mudança (“esquerda”): “O conservador pensa na política como um meio de preservar a ordem, a justiça e a liberdade. O ideólogo, pelo contrário, pensa na política como um instrumento revolucionário para transformar a sociedade e até mesmo transformar a natureza humana. Na sua marcha em direção à Utopia, o ideólogo é impiedoso.”

É fundamental não confundir política conservadora com pensamento conservador. O pensamento conservador é uma excrescência do fascismo e da manutenção do poder, seja à direita ou à esquerda, no centro ou nos extremos. Aliás, o fascismo em nosso tempo é bastante proverbial, uma vez que já não é exclusividade de certa ideologia, pelo contrário, está espraiado sem distinção. Uma das características do fascismo, oxalá a mais sutil, é a certeza de que há uma posição correta (a de quem a professa) e uma errada (a do adversário de quem professou).

Cabe enfatizar ainda que os valores eurocêntricos disseminaram pelo mundo uma predileção pela ordem que se enraizou na cultura, tanto que mesmo os projetos revolucionários, incluindo o anarquismo, contemplam a educação como forma de se viabilizarem. E educação, sem eufemismos, é ordem, sob quaisquer pontos de vista, ainda que tal projeto se arrogue revolucionário.

A percepção de que integrantes de certo partido político seja mais ou menos sensível ao sofrimento geral da população nada tem a ver com seu ideário, assim como políticos que esfregam na cara das elites seu incondicional apoio aos trabalhadores, não se eximem de promover políticas que agudizam as desigualdades. Ou alguém acredita que o neoliberalismo retrocedeu no Brasil desde sua implementação nos anos 1990?

Os discursos são bólidos de satisfação, moldados ao sabor do momento, e não necessitam de nenhum alinhamento com as práticas sociais que impulsionam. Portanto, os valores que são importantes para definir o caráter eminentemente conservador das pessoas são, basicamente, civilização, ordem social, moralidade, dentre outros que se afastam do caos, da imprevisibilidade, do respeito às diferenças e do não apego às desigualdades como forma de manter os privilégios que, no final das contas, a todos definem.

Já lemos nas redes sociais que a maior das ilusões políticas é acreditar que se pode humanizar um sistema cuja essência é mercantilizar as necessidades humanas. Numa sociedade cuja ordem é a desigualdade, a hierarquia dos privilégios é infinita. É uma sociedade de emuladores, sem distinções.

*Eduardo Bonzatto é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB)
*Luis Gustavo Reis é professor e editor

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Quinze lições em 35 anos

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Quinze lições 35 anos vida delmar
(Imagem: reprodução)

Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político

Próximo dia cinco de maio faço 35 anos. Novo, ainda. Ou velho. Depende pra que, do ponto de vista e dos parâmetros. Refleti sobre esse tempo.

Já tive uma filha, um casamento, um pedido negado, um livro, plantei árvores e fiz financiamento na Caixa Econômica Federal.

Vi golpes e injustiças. Já votei no PT por modinha e por convicção. Aprendi algumas lições. Cético, contudo, sei que elas podem mudar e não serem mais lições. Ei-las:

-os textos que listam coisas, como este, são mais lidos;
-seja tão cético a ponto de questionar até mesmo o ceticismo;
– sempre que possível, vá à praia. Observe o vai-e-vem das ondas e tente compreender a imensidão do oceano;
-se você acha que compreendeu a imensidão do oceano, na verdade você socraticamente não entendeu nada;
-políticos que se intitulam não-políticos são os piores políticos;
esquerda e direita ainda existem e fazem sentido sobretudo agora;
-quem se diz sem posição ideológica é de direita. Nega-se por ignorância, má-fé ou constrangimento;
-os políticos de direita são mais fiéis à sua ideologia do que os políticos de esquerda;
-reflita muito sobre sua condição no mundo e sobre o mundo. Mas tenha momentos sem pensar em absolutamente nada;
religiosidade é bom. Religião nem sempre;
-já sofri por amor. Passou. Aí achei que tinha aprendido. Engano. Só o que aprendi é que o amor não tem porquês e nem vacina;
-nunca peça um beijo. Se ele tiver que acontecer, ocorrerá sem prévio protocolo;
-aproveite cada momento sem pensar no devir nem mesmo imediato: um abraço na mãe, uma piada com os amigos, uma brincadeira com o filho, a taça de vinho ou uísque sem gelo, o beijo não pedido, a perna dela por sobre a tua;
-o ditado “o dinheiro não traz felicidade” é utilizado pra consolar os desafortunados, mantendo assim o enganoso princípio da meritocracia para os abastados nessa condição permanecerem;
-dinheiro não traz felicidade.

*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”

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O que será de nós? A esquerda entre o passado, a realidade e a impotência

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Fonte: G1
Luís Felipe Machado de Genaro*, Pragmatismo Político

Em tempos de crise social, política, econômica, ambiental – e sanitária – não faltam aqueles que alheios ao mundo concreto, bailam, flutuam, sem fincar seus pés no chão, não compreendendo aquilo que o velho Marx disse em poucas palavras: até o momento fomos impelidos a ler e pensar sobre o mundo, quando o importante é transformá-lo.

Pior: se abstêm e se fazem neutras perante um mundo em ruínas. Vivem outra realidade. Dão de ombros, não querem de nada saber. Se apegam a deuses e santos, como os tolos do passado. Não sabem que seu respirar é, diariamente, um ato político.

Enquanto isso progressistas de todas as matizes – socialistas, comunistas, socialdemocratas, legalistas, etc. – são atacados e vilipendiados, hoje mais que nunca, muitas vezes por essa gente que jamais se assentou numa poltrona e teve a brilhante ideia de ler o que os grandes nomes do passado nos relegaram.

Enquanto do lado de lá, assentada a extrema-direita, sempre se observou um escancarado desejo pela tirania, patriotismo e moralismo torpes e com claros objetivos de controle e vigilância, além de flertes sanguinolentos com o status quo e o senso comum grotesco, os livros de História e as bibliotecas nos enchem de figuras à esquerda imbuídos na construção de um outro mundo, novas sociedades igualitárias e fraternas, além de utopias libertárias e revolucionárias.

Diferente dessa gentinha pequena, somos movidos por sonhos – que deles verteram suor e sangue.

Suor e sangue de mulheres e homens que deram as suas vidas por uma causa e ergueram bandeiras das mais diversas, e que hoje nos enchem de orgulho e nos fazem olhar para frente, mirando um futuro que não seja o distópico e catastrófico que nos avizinha. Mulheres e homens que jamais serão esquecidos.

Como escreveu Safatle em uma recente obra: a Esquerda não deve temer em dizer seu nome. Sempre calcados na teoria, mas também na práxis, foram eles que moveram as alavancas da História, guiando e construindo pontes e direções em um caminho deveras tortuoso: o caminho da luta, do confronto, de greves, motins, comunas, revoltas, rebeliões e revoluções.

Mulheres e homens que fizeram de seus punhos e corações poderosas armas contra toda forma de exploração, opressão, machismo, racismo e colonialismos dos mais diversos. Mulheres e homens onde seus feitos estão ferroados nos corpos e mentes de gerações posteriores e na História dos povos oprimidos, marginalizados e esquecidos, entrelaçados em seus grilhões.

Leia aqui todos os textos de Luís Felipe Machado de Genaro

Mas não. Não vivemos mais tempos de convulsões e motins revolucionários (um Chile esfomeado e um Império racista em chamas, talvez, não guiem para outro caminho). Guerrilhas camponesas não mais existem. A condições para uma Revolução tal qual realizaram russos e cubanos, por exemplo, acabaram. Revoltas populares geralmente são esmagadas pela força cada vez mais destruidora do Estado (e do Mercado) – o balcão de negócios de uma burguesia transnacional e globalizada.

Sem dúvidas um novo mundo será gestado pós-pandemia do coronavírus. Mas qual mundo será esse? Entre a frustração, a angustia e a impotência frente ao obscurantismo, a violência estatal e a desigualdades atrozes, o que fazer?

Frente ao horizonte apocalíptico que nos atormenta diariamente é chegado o momento de nos apegarmos cada vez mais aos grandes nomes do passado – José Martí, Fidel Castro, Lênin, Rosa Luxemburgo, Che Guevara, Allende, Gramsci, Olga Benário, Jango, Leonel Brizola, Dandara, Tupac Amaru, Bolívar, Mandela, Malcom X, Simone de Beauvoir, entre tantas e tantos – como grandes personalidades do momento presente, e redesenhar este caminho. Entre erros (grandes erros!) e muitos acertos, foram eles e outros gigantes que tentaram fazer deste mundo de infortúnios um lugar melhor, mais digno e justo para todos.

Ao seu lado, o povo e a força furiosa e justa das multidões: os sujeitos principais da História. Salvador Allende, presidente socialista que morreu em 11 de setembro de 1973 em um Palácio em chamas contra as bárbaras forças fascistas e burguesas da extrema-direita chilena, verbalizou o desejo que moveu e ainda move os corações e mentes da esquerda internacional: “a História é nossa e a fazem os povos”.

Que as grandes personalidades do passado estejam conosco na busca e encontro desse novo mundo que vai renascer destruído, caótico, apocalíptico. Que os povos de todas as nações sejam o nosso farol. Que enraizemos o nosso agir e pensar na realidade cruenta dos dias e que bandeiras vermelhas, rebeldes, impacientes e com sede de justiça social voltem a tremular pelos campos e cidades de todo planeta.

*Luís Felipe Machado de Genaro é historiador, mestre em história pela UFPR e professor da rede municipal de Itararé

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A crise de representatividade da nossa sociedade

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crise de representatividade sociedade eua atos protestos negros
Ato contra o racismo nos EUA (Imagem: Chip Somodevilla)

Rodrigo Pirovani*

Quem abriu alguma rede social durante essa semana se deparou com inúmeras postagens referentes à luta antifascista e ao racismo. Novos movimentos virtuais como #somos70porcento e #blacklivesmatter surgiram e vem ganhando apoio da população.

Em relação ao primeiro, este foi criado visando se contrapor aos 30% da população que ainda apoia o Jair Bolsonaro apesar das denuncias envolvendo o seu governo e a sua família. Esse ponto gera inúmeras questões que precisam ser respondidas: quem são esses brasileiros que apoiam esse governo? Como foi seu processo de escolarização? Qual foi e como se deu a participação da imprensa brasileira na construção dessa geração? Qual foi o papel das igrejas? Essas entre outras questões precisam ainda ser respondidas.

Com relação ao segundo movimento que tem origem internacional e que reflete o passado escravocrata dessas nações é de grande valia na luta por direitos que apesar de garantidos por suas constituições foram parcialmente ou ineficientemente aplicados a políticas de reparação histórica.

Entretanto, o que incomoda é a importação de movimentos virtuais de países do hemisfério norte, como se não houvesse no Brasil casos suficientes para uma revolução da população devido a essa brutal desigualdade existente.

Por mais que existam movimentos que busquem por esses direitos aqui, nós brasileiros somos dependentes da influencia cultural de outros países para que essa luta por direito faça parte das discussões políticas da nossa sociedade.

Essa dependência nos mostra como falhamos em analisar nosso próprio país apesar das manchetes de jornais nos apresentarem a realidade diariamente. Talvez seja devido ao tamanho continental do Brasil ou ao fato de estatísticas nos afastarem da nossa humanidade já que olhamos somente números. A pergunta que fica é como resolver esse problema.

Em minha opinião, está faltando representatividade. Por exemplo, a estimativa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) é de aproximadamente 210 milhões de brasileiros em 2019 sendo 52% (~108 milhões) desse número se referente ao sexo feminino e 55% (~115 milhões) da população se declara preta e parda. Quando analisamos os dados referentes à câmara de deputados (513 deputados no total) do congresso nacional não vemos esses números diretamente representados nele.

Por exemplo, somente 15% (77 deputadas) são mulheres e somente 24,3% (125 deputados) se declaram pretos e pardos. É um contraste ou diria um paradoxo que necessita ser mudado imediatamente. Analisando esses dados, podemos ver como o nosso congresso precisa representar nossa sociedade. Além do mais, essa carência de representatividade pode ser estendida a todas as carreiras profissionais e em diversas áreas. Como fazer isso?

Primeiramente escolhendo seus parlamentares adequadamente, são eles os responsáveis pela criação de leis, projetos e pelo orçamento do governo impactando diretamente na sua vida. Segundo, nossa cultura precisa mudar começando por uma educação de qualidade e adaptada aos tempos modernos.

Essas mudanças são processos longos e exigem continuidade sempre. Ninguém muda do dia pra noite, imagina uma sociedade diversa como a nossa. Contudo, podemos começar a construir essas mudanças em nós mesmos e desconstruir essas crenças obsoletas, racistas e antifascistas dia após dia com estudo e diálogo.

*Rodrigo Pirovani é Químico e Doutor em Ciências – UNICAMP

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Os generais caíram de paraquedas

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generais caíram de paraquedas
General Eduardo Pazuello (Imagem: Alan Santos | PR)

Anderson Pires*

O Ministro Interino da Saúde, General Eduardo Pazuello, deu mais uma demonstração das limitações dos militares para gerirem um país. Para quem ainda não percebeu, o Brasil é governado por um conjunto de oficiais, que, cotidianamente, dão exemplo de despreparo, autoritarismo e ligações com atividades suspeitas.

Em entrevista coletiva, o General Ministro Pazuello deu uma aula de geografia e falou sobre o clima nas regiões do nosso país e a relação com a pandemia. Demonstrou total desorientação, algo temerário para um paraquedista. Apesar de ter servido em Roraima e no Amazonas, fez comparações com relação ao clima das regiões Norte e Nordeste, dizendo terem um inverno mais aproximado do encontrado no hemisfério Norte.

Com relação a saúde, a incapacidade do General já é mais que evidente, mas para quem se diz um militar da área operacional logística, parece que sua debilidade é ainda mais grave. Um tema que deveria ser de fácil compreensão para uma criança na faixa dos dez anos de idade, não parece ser tão simples para Pazuello.

Talvez, tenhamos um novo exemplo de funcionário fantasma ou, durante sua passagem pela região Norte, tenha ficado mais tempo sobre as nuvens que o recomendado. Assim, como o Presidente que também foi paraquedista, Pazuello mostrou que nada sabe sobre aspectos regionais brasileiros e que sua capacidade para formular políticas públicas nesse sentido é zero.

Como já disse em outros textos, o oficialato bolsonarista é um ajuntado de ignóbeis, com dificuldades cognitivas insuperáveis. Basta ver que, enquanto Pazuello dava sua aula de geografia, o Presidente debatia sobre os efeitos do enxofre presente no alho para curar a COVID-19, com uma de suas fãs no cercadinho do Palácio da Alvorada.

Parece piada, mas não é. O conjunto da obra é deprimente. Vale lembrar que essa é a turma que propagou o kit gay, a mamadeira de piroca e resolveu debater o perigo da URSAL em pleno processo eleitoral. Pra quem não sabe do que se trata, a União das Repúblicas Socialistas da América Latina foi uma ironia feita por uma professora de sociologia em 2001. Na campanha, o General Heleno resolveu transformar o tema em polêmica, afirmando que existia um risco da URSAL interferir nas eleições. Foi pego pela piada e ainda criou um debate ridículo. As redes sociais aproveitaram o mote e fizeram a festa.

Mas o mesmo General Heleno, um dos homens mais próximos do Presidente, também afirmou ter dúvidas sobre o aquecimento global e se a Terra era redonda. Alguém com tantas dúvidas, não mediu as palavras quando ameaçou o Supremo Tribunal, caso fosse determinada a apreensão do celular de Bolsonaro para realização de perícia, no inquérito que apura a tentativa de uso político e pessoal da Polícia Federal.

Leia aqui todos os textos de Anderson Pires

Uma coisa podemos destacar nesse Governo: a forma planificada como é composto. Onde o General vira subalterno do Capitão, mas todos apresentam o mesmo nível intelectual. O grande perigo é que, assim como entre os animais irracionais, por mais dóceis que pareçam, podem ter atitudes guiadas pelo instinto. O que temos que tomar cuidado é com a periculosidade. Um mini poodle por mais agressivo que seja seu ataque de raiva, jamais produzirá o estrago de um pitbull. Sem contar que o poodle se destaca pela inteligência.

Os paraquedistas que tomaram posse do Governo Federal pelo voto popular, acreditam ter um atestado para descumprimento de leis e normas. As insígnias não fazem do militar um homem idôneo e competente. O mesmo Pazuello que não sabe diferenciar os aspectos regionais do país, também foi investigado num processo de favorecimento ilícito para uso de área pública, para atividades de um clube de paraquedismo no Rio de Janeiro, que cobrava valores consideráveis aos seus alunos.

Tanto o Presidente como seus generais demonstram a forma distorcida que enxergam a coisa pública. Dessa forma, querem impor medidas ilegais, interferir indevidamente em órgãos do Estado, alterar dados, quebrar normas de controle e toda sorte de ações que tenham como norte a autoridade que imaginam ser soberana.

O ambiente dos quartéis é muito propicio para que exageros sejam cometidos. Em muitos casos, existe a cultura de que a superação se dá pela violência e imposição, mesmo que isso desrespeite a legislação e coloque em risco a vida. Exemplos de absurdos praticados na formação e treinamento já foram alvos de diversas denúncias. Essa lógica que é abominável mesmo que praticada em instituições fechadas como as forças armadas, torna-se ainda mais perigosa quando transferida para a gestão de um país.

Imagine que alguém como Pazuello no comando de sua tropa, provavelmente, submeteria seus comandados a absurdos, como negar o calor causticante do semiárido nordestino ou atribuiria sintomas da COVID-19 a mera “frescura”. Esse é o perfil dos militares que estão nos governando. Vivemos num estado de demência, sob o risco permanente que os instintos do pitbull maior produzam estragos irreparáveis.

Os prejuízos já são bem maiores que o esperado. Temos uma sucessão de absurdos cometidos e, agora, agravados por uma pandemia. A incapacidade dos militares fica cada dia mais latente. Acredito que devem existir muitos que se envergonham de terem esse vínculo com a caserna que Bolsonaro sempre reafirma. Talvez, o treinamento intenso, com tantos saltos com paraquedas de altitudes muito elevadas, tenha diminuído a oxigenação e provocado danos irreparáveis. Alguma explicação deve haver. Só espero que não cheguem a conclusão que é algo contagioso. Afinal, esse Governo é mais perigoso que qualquer vírus.

*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário, cozinheiro e autor do Termômetro da Política.

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Somos 70%, mas falta juntar

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somos 70 contra bolsonaro manifestações esquerda direita
(Imagem: Roberto Parizotti)

Anderson Pires*

Depois da última pesquisa Datafolha diversos setores da esquerda brasileira passaram a propagar a bandeira do Somos 70%. O número seria uma alusão ao percentual de pessoas que não aprovam o Governo Bolsonaro. Num exercício de acochambramento tentam converter em opinião contrária aqueles que avaliaram o Governo como regular. Mais que uma matemática burra, temos um exemplo de linguagem panfletária sem efeito.

Pela lógica de quem defende esse slogan, os presidentes FHC e Lula também teriam motivos para serem depostos do cargo, visto que a aprovação dos mesmos, em período de mandado semelhante, era praticamente a mesma de Bolsonaro hoje. Porém, nos exemplos anteriores, tivemos dois presidentes reeleitos. Lula ainda conseguiu fazer sua sucessora.

O discurso do somos todos contra Bolsonaro, mostra a falta de uma pauta que sirva como verdadeiro contraponto político e que, de alguma forma, tire o presidente do campo de debate no qual sempre fica muito confortável. A falsa dicotomia é na verdade uma forma de esconder os frangalhos que os demais agrupamentos encontram-se, sem conseguir apresentar um programa mediado e único, capaz de trazer para a discussão um projeto para o país.

O discurso do nós contra eles foi o que elegeu Bolsonaro. Quando os setores mais esquerda sustentam a bandeira de que todos que não aprovam são iguais e estão dispostos a derrubar o presidente, suscitam a pergunta: somos quem, cara pálida? Esquecem que o antagonismo ao PT foi quem sustentou o voto dos indecisos em 2018. Provavelmente, os mesmos que hoje avaliam o Governo como regular.

Não será apenas negando que vamos conseguir aglutinar uma maioria suficiente para derrubar o presidente. As sequelas decorrentes do impeachment de Dilma e o trabalho de perseguição que a Lava Jato promoveu, imputou ao PT e, consequentemente a esquerda, a pecha de corruptos e destruidores da nação. Isso ainda está latente.

Pior, se lembrarmos que setores que fazem oposição a Bolsonaro, a exemplo do PDT de Ciro Gomes, conseguem fazer um discurso ainda mais duro contra Lula, lhe atribuindo crimes e até a responsabilidade pela ascensão ao poder de um governo fascista. Levantar o discurso vazio do Somos 70% é brincar com a inteligência alheia e acreditar que será com animação de torcida que se conseguirá mudar o atual cenário.

Leia aqui todos os textos de Anderson Pires

Incorrem em dois erros. Primeiro, mostram total incapacidade de formulação e articulação de uma frente (muito) ampla que produza aliança segura para a disputa eleitoral. Segundo: ressuscitam o antagonismo que foi responsável pela derrota em 2018.

A pauta unificadora está longe de ser construída. Isso é um problema grave. Ainda mais sério, quando notamos que não existe responsabilidade nesse sentido. Fica a pergunta, por que alguém que avalia o Governo Bolsonaro como regular, votaria contra ele numa próxima eleição? Essa resposta precisa existir. Acreditar que será a partir de slogan pueril e que não é crível, parece brincar de militância. O máximo que teremos serão alguns momentos de lazer político, mas sem nenhuma responsabilidade estratégica.

Confesso que me cansa ser convidado para fazer coro em frentes tão vazias. Não acredito que grupos que negam uma análise mais apurada da conjuntura e do comportamento da sociedade, tenha compromisso real com a mudança. A imagem que me vem é de um conjunto de pessoas em catarse, gritando repetidamente uns para os outros: somos 70%. Saem em êxtase e acreditam piamente que aquilo é verdade. Quase uma sessão alucinógena.

Não será com manipulações de pesquisas que se conseguirá construir uma maioria que produza resultado eleitoral favorável. Tirar Bolsonaro e espantar o fantasma do fascismo devem ser os fatores de unidade, mas isso não será conseguido com panfletos. Os trinta e três por cento que aprovam o Governo têm algo que os unifica: uma pauta conservadora, sem qualquer pudor em promover um Estado Liberal.

Porém, quem qualifica Bolsonaro como regular, busca razões objetivas para não votar nele novamente. O negar por negar alimenta o maniqueísmo. Nesse campo, o presidente e sua tropa são mestres. É preciso bem mais para ter os 50% que garantam a retomada democrática. Depois, cada um pode levantar sua bandeira.

*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário, cozinheiro e autor do Termômetro da Política.

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Sobre abraços

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abraços amigos família pandemia coronavírus
Imagem: Joseph Pearson | Unsplash

Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político

Eis que esta pandemia veio pra contrariar algumas premissas humanitárias e sociais que tínhamos. Quem puder, não vá de ônibus, use seu egocêntrico carro. Aliás, quem puder, não vá. Em indo, tenha atitudes esnobes, passe longe dos demais. Não aperte a mão de ninguém. Cumprimente apenas com um bom-dia abafado pela máscara. Não tome os parques e praças, símbolos das cidades. Muito menos para protestos antidemocracia. E, claro, não abrace ninguém.

Os abraços são uma relação humana complexa. Há casais que fazem sexo, mas têm dificuldade de se abraçar. O sexo pro ser humano, como escreveu Luis Fernando Veríssimo, tem manual de instrução. O abraço não. Não se pode saber quanto tempo dura um abraço. Sentimos quando devemos fazer sexo, mas é difícil saber em que situações cabem um abraço. E não sabemos quanto tempo dura um abraço. Não vou fazer a pesquisa, mas certamente há respostas no Google sobre quantos minutos (ou segundos? Tô meio por fora) deve durar a transa. Provavelmente mais difícil será achar a resposta de quanto tempo deve durar o abraço para que ambos os envolvidos saiam satisfeitos.

Mesmo não estando pelados quando fizemos, o abraço pode ser constrangedor ou embaraçoso. É uma troca de energia intensa. Podem ser segundos intermináveis, como foi para Bolsonaro quando Abraham Weintraub solicitou essa troca de energia ao se despedir do cargo que estava deixando, o de Ministro da Educação. Os motivos para o visível desconforto do Presidente podem ser vários, desde a falta de lamento por tê-lo demitido até uma certa mágoa por todos os constrangimentos outros que o então Ministro trouxe a seu governo.

Um abraço pode incomodar muita gente. Pode causar ciúme, inveja, estranheza, dúbias e/ou equivocas interpretações e por aí vai.

O médico Drauzio Varella, conhecido e reconhecido por seus métodos, digamos, pouco ortodoxos de conduzir a medicina, foi alvo de muitas críticas por ter abraçado uma presidiária trans.

A mulher estava há tempos sem receber visitas. E ele fazia uma reportagem sobre o abandono dos familiares aos seus que estão na cadeia. Evidente que as críticas vieram mais forte que abraço de urso.

A mulher era uma criminosa. Cumpria pena, pra piorar, de assassinato. “Quem abraça a família da vítima”, era a indagação mais rasa e óbvia pra embasar as críticas.

Vejam, Varella não pediu a soltura dela. Não menosprezou seu crime. Nem mesmo contextualizou as circunstâncias do malfeito por ela. Não defendeu que ela era vítima da sociedade. Nada disso. Apenas viu carência naquele ser humano à sua frente. Lhe ofereceu literalmente todo o seu corpo. Um abraço. Nada mais do que um simples(?) abraço. Um silencioso abraço, embora emoções ecoavam surdamente em ambos.

Tenho certeza que o médico abraçaria com franco pesar a família da vítima, que, também não tenho dúvidas, foi muito abraçada e é até hoje.

Quando este isolamento todo terminar, talvez, pelo menos por algum tempo, façamos questão de andar pelas ruas esbarrando uns nos outros, buscando conhecidos prum abraço.

Saudades dum abraço, né, minha filha?

*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”

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The new (old) PSDB is Ciro

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Ciro Gomes psdb política kátia abreu
Ciro Gomes e Kátia Abreu (Imagem: Marcelo Camargo | ABr)

Anderson Pires*

O ex-ministro Ciro Gomes tem tentado capitanear um movimento que lhe viabilize como candidato à Presidência da República com chances reais de disputa. Usando a bandeira do resgate da democracia tem proposto uma ampla aliança, que, segundo ele, nesse momento não existe restrição para participação de quem esteja disposto a aderir a causa e fortaleça o movimento de impeachment de Bolsonaro. Nas Janelas pela Democracia cabem de tudo, desde que o tema seja derrubar o presidente.

Porém, nessa jornada, Ciro tem feito bem mais que defender o combate ao Governo. Mais que atacar Bolsonaro, ele constrói atalhos para se tornar aceitável à direita brasileira. Com isso, tenta qualificar a extrema-direita bolsonarista, como também, o que chama de Lulopetismo Corrupto, de males oriundos de um mesmo DNA, que seria a visão fundamentalista da política.

Em sua caminhada na busca pelo poder Ciro tece críticas óbvias contra Bolsonaro, mas suas energias para atacar o PT e acusar de responsável pela ascensão do fascismo são muito mais enfáticas. Fica claro que o discurso é muito mais eleitoral do que propriamente preocupado com a defesa da democracia. Sabe que os seguidores do presidente o acompanharão cegamente. Logo, não adianta tentar conquistá-los. Por outro lado, para não causar constrangimentos, passa de forma leve pela discussão sobre combate a corrupção e defende um “projeto para o país” que não representa rompimento com o modelo que perdura. Ciro é um capitalista, isso está claro.

Enquanto isso, Ciro faz acenos para FHC e Rodrigo Maia. Em paralelo, monta no seu entorno uma legião de viúvas do PT, a começar pela ex-ministra Marina Silva e outros remanescentes. Para tanto, foca em impor ao Lula a pecha de corrupto e desprovido de humildade. Notadamente, a humildade que Ciro cobra seria facilmente esquecida se o ex-presidente tivesse lhe declarado apoio em 2018.

Nessa hora, as contradições de Ciro ficam mais que evidentes. Porque se ele hoje acusa Lula de corrupto e o PT de ser um partido que não lhe serve mais como aliado, nada do que utiliza em seu discurso como justificativa para ataques aconteceu após 2018. Logo, o ranço de Ciro fica evidente que é puro oportunismo eleitoral. O mesmo oportunismo que usou quando fez beicinho para não apoiar Haddad e, intimamente, torceu pela vitória de Bolsonaro, por acreditar que poderia apropriar-se do espólio do PT.

O discurso de Ciro é de uma fluidez capaz de escorrer por um pote a prova d’água. Usa de moralismo contra seus antigos aliados. Porém, isso soa como pura demagogia, para quem conhece um pouco da política brasileira e sabe da trajetória de seus colegas de PDT, como também, da sua relação de eterno compadrio com Tarso Jereissati e alguns proeminentes liberais da sua época de PSDB.

Falar que o PT foi responsável por quebrar a economia do país, depois de passar décadas aliado de quem promoveu os absurdos praticados pelo PSDB, que favoreceu grupos empresariais a tomarem posse de estatais, não parece coerente. Questionar a democracia sendo membro de um partido como o PDT, que tem sua estrutura controlada pelos mesmos desde a fundação, sem qualquer possibilidade de alternância, não é abonador.

Leia aqui todos os textos de Anderson Pires

Como disse, o discurso de Ciro é fluido e conveniente. Como foi sempre sua vida política. Transitou pelos mais diversos partidos e posicionamentos. Tem o viés autoritário de um coronel, que se apropria de políticas realizadas em seu estado, mesmo sem ser o governador há bastante tempo. Como se fosse o proprietário do espaço político e, quem ali estiver ocupando, a ele deve remeter todos os louros. Isso é preocupante.

Mais preocupante é que no discurso que adota, fica claro sua proposta em passar um lustra-móveis no capitalismo brasileiro para que pareça menos atrasado e explorador. A matriz de Ciro não é de esquerda, muito pelo contrário. Até quando levanta a bandeira de acabar com o endividamento na população brasileira não consegue fazer uma discussão honesta para solucionar o problema. Deixar no ar bravatas da possibilidade populista de calote, que ele chama de negociação.

Da mesma forma, arrota soluções que poderiam ser aplicadas pelo Estado Brasileiro para fomento da indústria nacional, como forma de fortalecer nossa economia. Usa números de forma unilateral, ciente do pouco conhecimento de quase todos. Assim, confere um ar de sapiência, mas se for sujeito a uma análise mais apurada, muitos perceberão que nem em Cuba algumas das medidas que defende são realizadas com o vigor que diz estar disposto.

Notem que o mesmo Ciro que derrama sua ira sobre o PT, é incapaz de aprofundar o debate relativo a reforma partidária ou a administrativa. Fizesse isso, poderia ter sua cabeça decepada em seu próprio partido, como também, acabaria com as possibilidades de apoio da burguesia de centro-direita que ocupa as funções do Estado de forma majoritária.

A tentativa de Ciro em construir uma alternativa política com bases semelhantes as que o PSDB formou quando chegou ao poder, evidencia a confusão programática que tenta encabeçar. Acusa Lula de ter cometido estelionato político em 2018, mas tenta construir um Frankstein sem um conceito claro. A grande qualidade desse ajuntado, segundo o próprio Ciro, será lhe apoiar para as próximas eleições, mesmo que depois use da sua verborragia para dizer da impossibilidade de fazer o que bradava. (Hipótese só existente caso eleito)

A forma como Ciro porta-se assusta. Depois de um Bolsonaro a cota de desequilíbrio e arrogância parece que já foi mais que utilizada na política brasileira. Alguém com a sua facilidade para moldar discursos conforme os aliados e objetivos eleitorais que busca, também é algo que me parece bem perigoso. Numa mesma semana assisti duas entrevistas dadas por Ciro e por Lula. Escutar Ciro gastar a maior parte do tempo para atacar e acusar Lula e o PT foi sintomático. Mais revelador foi a comparação quando escutei um Lula, que pouco se ocupou de Ciro Gomes e não gastou mais que 15 segundos para responder o que lhe foi perguntado sobre o antigo aliado.

Independente dos erros que Lula e o PT tenham cometido, não tenho dúvidas de que não virá deles uma proposta de ressurgimento de um novo agrupamento nos moldes do PSDB. No caso de Ciro, o mais preocupante não é o arco de alianças que está disposto a formar, mas sim, o grau de concessões e o tamanho da maquiagem que tenta produzir no capitalismo, para que pareça palatável a todos. Como se fosse possível, estabelecer um modelo onde o capital é tão eficiente, que seja capaz de esconder a desigualdade.

Aos aliados de Ciro, que se intitulam de esquerda, está na hora de puxar ele pouquinho mais pra perto e dar uns conselhos. A irá que manifesta para exterminar o PT, parece algo semelhante a Sara Winter que de militante feminista fervorosa, abraçou com paixão o fascismo de Bolsonaro. Com relação a Ciro, só se tem uma certeza: ele sempre estará certo, mesmo que precise esquecer o que disse no verão passado.

*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário, cozinheiro e autor do Termômetro da Política.

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100 anos de Florestan Fernandes: a complexidade de um intelectual a serviço do povo

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Florestan Fernandes complexidade intelectual a serviço do povo
Florestan Fernandes, sociólogo e ex-deputado federal (Imagem: reprodução)

Caroline Oliveira, Brasil de Fato

Quando terminou o curso de Ciências Sociais na Universidade de São Paulo (USP), em 1944, Florestan Fernandes não saía dali como um sociólogo formado somente pelos livros. A sociologia, na verdade, chegou para Florestan primeiro por meio do trabalho, e somente depois pela reflexão. Esta é uma formulação do próprio sociólogo que permeia toda a complexidade e totalidade de seu pensamento.

Filho único de Maria Fernandes, portuguesa que chegou ao Brasil para trabalhar no campo aos 13 anos de idade, Florestan nasceu em 22 de julho de 1920 e viveu os primeiros conflitos de classe dentro da casa da família Bresser, onde a mãe trabalhou como empregada doméstica, no município São Paulo (SP). Os poucos anos ali bastaram para Florestan entender que a casa, para ele e sua mãe, era do quarto onde dormiam, no quintal, somente até a cozinha. Dali para frente, a barreira só podia ser transpassada com a permissão e o acompanhamento de um dos Bresser.

Permissão, a mesma, que não lhe foi solicitada para ter o nome trocado pelos donos da casa. Florestan, o nome de um personagem da ópera Fidelio, de Ludwig van Beethoven, não era cabível para o filho de uma empregada doméstica. Chamavam-no, então, de Vicente, que consideravam mais apropriado. “Também o nome ele não podia ter”, conta Florestan Fernandes Júnior, filho do sociólogo e jornalista.

O ponto final da experiência na casa Bresser – que anos mais tarde ele considerou essencial do ponto de vista sociológico – se deu quando os patrões pediram a Maria Fernandes que entregasse Florestan a eles. A portuguesa respondeu “só cachorro que se dá”, pegou suas coisas e foi morar em cortiços.

Diante da situação, Florestan, aos seis anos de idade, começou a trabalhar como engraxate, para ajudar na sobrevivência da pequena família. “Assim foi vida deles, vivendo com condições precárias. Todo o aprendizado dele vem desse período e ele nunca se afastou. Ele falou até que a maior luta dele durante a vida foi não se afastar de suas origens”, relata o filho. Somente aos 17 anos, depois de passar por diversos empregos, Florestan retomou os estudos, fez um curso de madureza para concluir o que hoje se conhece por Ensino Médio e ingressou na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH-USP).

Para Miguel Yoshida, editor da Expressão Popular, compreender a origem de classe de Florestan é “fundamental” para compreender todo o seu desenvolvimento teórico. “Por mais que por durante boa parte da vida ele estivesse ligado à universidade com ocupações acadêmicas, ele nunca perdeu essa perspectiva de olhar para o mundo e para a condição dos ‘de baixo’, nunca esteve fora da perspectiva dele”. Prova disso, diz Yoshida, são os temas sobre os quais ele teorizou: a questão racial e de classe, majoritariamente.

Florestan Fernandes complexidade intelectual a serviço do povo

Burguesia dependente e a prática revolucionária

A partir desse olhar, Florestan Fernandes constrói uma conexão entre pensamento e prática que permanece por todo o seu trabalho como uma tarefa política. O objetivo: fornecer as ferramentas necessárias para a classe trabalhadora conseguir transformar a própria realidade.

A preocupação central dele nos últimos 20 anos de vida é de conseguir construir uma compreensão do País que possibilite a transformação dele. Então, a teoria do Florestan nos últimos 20 anos se dedica a isso, a essa construção dessa teoria da revolução brasileira”, explica Yoshida.

O primeiro passo para a construção dessa prática revolucionária foi entender a origem das classes sociais no Brasil. Para estudar o comportamento das classes dominantes, Florestan estudo os anos da escravidão e demonstrou como a transição da Colônia até a República, incluindo a abolição da escravatura, ocorreu sem rupturas institucionais de fato. O sociólogo identifica a manutenção do padrão de dominação de classe, com o cultivo de heranças escravocratas refletidas nas dinâmicas sociais do país.

Diferente de outras ao redor do mundo, segundo a leitura de Florestan, a burguesia brasileira não precisou realizar uma revolução para concretizar o modo de produção capitalista. Aqui, o capitalismo e as dinâmicas imperialistas e de escravização se entrelaçaram para fazer surgir o que ele chama de “capitalismo dependente”.

Tal dependência faz com que a burguesia brasileira precise realizar concessões ao capitalismo central para conseguir manter qualquer tipo de relação, uma vez que não está “no mesmo pé de igualdade”. Hoje, isso se observa na desindustrialização do Brasil e na condição de exportador de commodities.

Apoiado nesta ideia, Florestan defendia que “o desenvolvimento aqui não tem uma possibilidade nacional de desenvolvimento autônomo, não tem um desenvolvimento autônomo, ele vai estar sempre atrelado às demandas desse capitalismo central”, explica Yoshida.

Nesse sentido, a proposta política da burguesia nunca abarcará as transformações necessárias para o desenvolvimento social do País, como as reformas agrária e educacional. Ao contrário, na mesma medida em que é submissa ao capitalismo central, submete as classes trabalhadoras com violência, nos mesmos moldes escravocratas.

A construção de um país pautada em reformas agrária e educacional, coloca Florestan, é tarefa, portanto, dos trabalhadores. E é aqui que entra a prática revolucionária e a educação como um dos pontos de partida para tal movimento.

Educação para a auto emancipação dos trabalhadores

Durante toda a vida, Florestan se preocupou intensamente com o tema da educação e defendeu um ensino gratuito, laico e de qualidade – não somente uma formação técnica, mas uma ferramenta de transformação social. Com acesso ao conhecimento acumulado pela humanidade e à prática militante, é possível alcançar a prática revolucionária e mudar as bases sobre as quais as classes dominantes se ergueram, defendia Florestan.

Nesse sentido, já na última década de sua vida, enquanto foi deputado (1987-1995) pelo Partido dos Trabalhadores (PT), Florestan ajudou a criar as bases do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) bem como os princípios constitucionais da educação brasileira, na Assembleia Constituinte.

Segundo o deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), que trabalhou o tema da educação ao lado de Florestan Fernandes na Assembleia Constituinte, o sociólogo foi responsável pela elaboração do capítulo da Constituição que trata da autonomia das universidades e das garantias de uma educação de qualidade.

Ele virou a grande referência de todos os movimentos sociais e educacionais, no Congresso Nacional. Ele foi grande a referência para a construção de uma visão constitucional da educação como dever do Estado e direito do cidadão”, afirma Valente.

Claro que Florestan é um socialista marxista, alguém que tinha conhecimento de que o pior analfabeto é o analfabeto político. Então, ele valorizava demais esse lado do conhecimento, do letramento, do direito à educação e do que significa conseguir universalizar a educação básica e ao mesmo tempo garantir a qualidade da educação com financiamento público de qualidade”, a fim de mitigar as desigualdades sociais. Para Valente, falar de Florestan Fernandes hoje, “é se contrapor a essa imensa mediocridade que nós estamos vivendo com a era Bolsonaro”.

Florestan Fernandes complexidade intelectual a serviço do povo

Debaixo do meu guarda-chuva cabem todos os radicais

Amigo próximo do sociólogo, o jornalista Vladimir Sacchetta relembra uma frase que sintetiza significativamente quem foi Florestan Fernandes e como ele vivia de acordo com o seu objetivo de transformar o País: “Florestan era o Florestan, ele era uma bandeira em si”.

Durante a sua campanha para deputado constituinte, da qual Sacchetta fez parte, o lema era “Contra as ideias da força e a força das ideias”, o que sintetiza bem uma campanha que agregou pessoas de diversas origens e espectros ideológicos.

Volta e meia aconteciam tensões no PT, e Florestan vinha daquele jeito doce, gentil, educado, um homem sisudo, aparentemente, com aquela sobrancelha que vinha por cima do óculos, mas um ser humano muito doce, e dizia o seguinte: ‘Opa, espera aí, debaixo do meu guarda-chuva cabem todos os radicais’”, conta Sacchetta.

O engajamento para a transformação social nunca deixou que Florestan saísse de fato da política, mesmo dentro das universidades, onde praticava uma sociologia crítica e militante.

O papel do intelectual era ser contestador e enfrentar as dificuldades e empregar as suas ferramentas teóricas sem nunca abandonar do horizonte a possibilidade de ter uma transformação social e da criação de um mundo mais justo, mais livre e mais feliz”, afirma Sacchetta.

Em 1969, durante a ditadura militar brasileira, o preço pago foi a aposentadoria compulsória com a publicação do AI-5, quando Florestan, então, decide se exilar nos Estados Unidos e no Canadá, onde foi professor titular na Universidade de Toronto. Florestan Fernandes Júnior relata que foi um momento de “muitas incertezas” para a família.

Em cartas escritas ao escritor e sociólogo Antônio Candido, um de seus amigos mais próximos, Florestan dizia não aguentar mais o exílio e que, se fosse para morrer, preferia voltar e morrer lutando. No fim, Antônio Candido sempre o convencia a esperar mais um pouco.

Florestan volta ao Brasil, em 1972, mas só consegue voltar a dar aulas em 1978, quando Dom Paulo Evaristo Arns, o terceiro grão-chanceler da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o reabilita, mesmo com a pressão dos militares para não fazê-lo.

Tempos depois, ele parte definitivamente para a política partidária dentro do PT. “Ele aceita e diz para mim: ‘Filho, eu esperei a vida inteira por um partido de esquerda que nunca surgiu. Eu acho que não vou ter tempo de vida para esperar mais. Acho que esse partido não vai chegar tão cedo. E de todos os partidos que têm no Brasil hoje eu acho que o que está mais próximo daquilo que eu considero um partido progressista, de esquerda é o PT, por isso eu me filiei a ele e vou concorrer’”, relembra Florestan Fernandes Júnior.

Florestan Fernandes complexidade intelectual a serviço do povo

A atualidade do pensamento de Florestan Fernandes

Outra missão assumida pelo sociólogo foi a construção uma frente democrática entre os partidos de esquerda e de enfrentar o autoritarismo. Ele dizia que boa parte dos progressistas acreditaram que tinham derrotado o nazismo e fascismo quando caíram Adolf Hitler e Benito Mussolini.

Estavam enganados, afirmava Florestan. “O fascismo nunca morreu. Ele falava que o fascismo é o braço armado do capitalismo. Sempre que o capitalismo se sente ameaçado, esse braço aparece. E é isso que a gente está vendo hoje no Brasil em alguns outros lugares do mundo”, relembra Florestan Fernandes Júnior.

Hoje, com Jair Bolsonaro (sem partido) na Presidência da República, bem como Donald Trump nos Estados Unidos, Boris Johnson no Reino Unido, Andrzej Duda na Polônia, entre outros conservadores e ultraconservadores, Florestan Fernandes procuraria descobrir quais erros levaram ao cenário atual, acredita Vladimir Sacchetta.

Esse era o perfil de atuação de Florestan dentro do PT, relata Sacchetta, onde ele questiona se a sigla irá se transformar um partido da ordem ou contra a ordem. “Ele discutia muito essa institucionalização do PT”, assim como as concessões feitas em nome da governabilidade em detrimento de ganhos para o povo, dentro do seu espectro da extrema esquerda.

Talvez essa questão da nossa atualidade passasse por aí: onde a esquerda errou? Porque as reformas não foram aprofundadas?”, argumenta o jornalista, relembrando a defesa de Florestan sobre a formação de uma frente única de esquerda. “É justamente o que falta hoje”, resume.

Atualmente, Florestan Fernandes também permanece vivo na Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), em Guararema, São Paulo, idealizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em 2005. “Um espaço construído pela classe trabalhadora, tijolo a tijolo, para possibilitar a formação política de organizações populares de todo o mundo”, informa o movimento.

Para Sacchetta, que também faz parte da Associação dos Amigos da Escola Nacional Florestan Fernandes, a escola do nome não poderia ser tido melhor. “Ele está lá. Na escola, moram as minhas utopias. A última morada do Florestan. Basicamente, ele é o reitor da escola e figura emblemática que inspira a luta do MST, que é o movimento social mais importante que a gente tem, do país, da América Latina e, quem sabe, do mundo”, conclui.

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O Poder da Linguagem na Arquitetura do Caos

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Poder da Linguagem na Arquitetura do Caos
(Imagem: reprodução)

Lucio Lauro B. Massafferri Salles*

No livro Guerras Híbridas – das revoluções coloridas aos golpes [1], Andrew Korybko expõe mecanismos de monitoramento, controle e manipulação, que têm como objetivo conquistar o que ele chama de “demografias alvo”. O caminho para a realização dessas ainda pouco estudadas estratégias de dominação é a fabricação de desestabilização sociopolítica, para subjugar alvos que podem ser, inclusive, agentes políticos, sem a necessidade de usar armas convencionais [2].

Em uma paisagem dessa natureza, os principais instrumentos de ação são as linguagens falada, escrita e imagética (trio audiovisual), com as quais se consegue obter um tipo específico de narcose, alienação e consentimento que, muitas vezes em conjunto, culminam em estados de “não-reação” [3] ou paralisação.

Uma vez que a eficácia de tais manobras psicológicas depende do poder e do alcance das comunicações audiovisuais, compreende-se que a internet, com suas plataformas de mídias sociais, seja um território perfeito para a penetração e o esquadrinhamento invasivo das psiquês de milhares de pessoas que, sem se dar conta, participam das ações de desestabilização sociopolítica dos locais onde vivem.

Vale a pena refrescar a memória, enfatizando a necessidade de se abdicar da ingenuidade no uso dos sistemas e instrumentos usados para navegar nas superfícies desse cyberespaço, lembrando dos aplicativos “inocentes” responsáveis pela captura das fotos de pessoas para supostamente transformá-las em atributos ou características de personalidade. Incautamente, muita gente entregou de bandeja um sem número de dados pessoais próprios, tais como postagens/opiniões/relatos/gostos, fotos, curtidas, contatos e sabe-se lá mais o que, dando seus consentimentos através de um simples click do mouse [4]. E esse é apenas um, entre dezenas de exemplos de artifícios comuns a essa superfície web onde, ainda hoje, misturadas entre si, verdadeiras legiões de humanos e robôs travam batalhas de hastag. Isso sem falar nas intermináveis solicitações de assinaturas das centenas de petições cujas fontes de criação e fins verdadeiros nem sempre são transparentes e devidamente observados, com conhecimento de causa.

É fato que ainda deve haver quem tenda a simplesmente reduzir de maneira excessivamente genérica a problemática desse cenário à expressões mais ou menos recentes, como, por exemplo, as fakenews. Quando, na realidade, o problema todo é mais complexo, não devendo, por esse motivo, nem ser compreendido somente com olhos no passado, nem ser passível de previsões muito seguras, uma vez que o quadro semicaótico apontado se encontra em plena vigência, não oferecendo tréguas ou distanciamento no tempo e no espaço.

Para além da boa documentação e das análises disponibilizas em seu livro, onde se inclui a denúncia sobre a participação do Pentágono no desenvolvimento de ferramentas comunicacionais e psicológicas visando a manipulação e o controle, Korybko compartilha um acontecimento decisivo que, segundo ele, encontra-se nas raízes do surgimento de estratégias desse tipo. Trata-se da contribuição decisiva de Edward Louis Bernays, sobrinho de Sigmund Freud, cujas ideias revolucionariam o campo da comunicação voltado para a Propaganda e as Relações Públicas, mais especificamente no âmbito da Política.

Edward Bernays era filho de uma das irmãs de Freud (Anna Freud Bernays) e de Ely Bernays, irmão da esposa de Freud (Martha Bernays Freud) e sobrinho, pela parte paterna, do professor de filologia clássica Jacob Bernays, tendo começado a atuar profissionalmente na década de vinte do século passado, nos EUA, que é para onde sua família havia se mudado, no ano de 1892 (Edward nasceu no ano anterior, 1891, em Viena).

Edward Bernays inventou métodos sofisticados de persuasão, manipulação e fabricação de consentimento. Suas técnicas não se baseavam simplesmente em artifícios linguísticos e imagéticos, uma vez que ele as elaborou valendo-se da familiaridade com algumas ideias desenvolvidas pelo seu tio (Freud), a respeito do inconsciente e do papel das linguagens em relação a esse.

Dizendo de outra maneira, Bernays não era psicanalista e muito menos teria tomado de empréstimo essa técnica, tal como em um hipotético ato de cópia e cola, para aplicá-la no campo da comunicação voltada para a propaganda e as relações públicas. O que Bernays fez foi desenvolver ideias novas e sob certo aspecto devastadoras, bem próprias ao seu campo de atuação, que era o das comunicações voltadas para as massas e multidões. Para isso, valeu-se de leituras sobre as psicologias de Gustave Lebon e Wilfred Trotter, dos trabalhos do seu contemporâneo Walter Lippmann e da adaptação de certas ideias percebidas no contato que tinha com Freud e alguns de seus colegas psicanalistas.

Como diz Korybko (35-36), a percepção de Bernays era tão acurada que muitas décadas antes do surgimento de plataformas como Instagram, Twitter, Facebook e Whatsapp, ele afirmava que “graças às vantagens das tecnologias de comunicação instantânea [da época] pessoas com as mesmas ideias e os mesmos interesses podem associar-se e organizar-se para promover uma ação conjunta ainda que habitem a milhares de quilômetros umas das outras”. Seus métodos de contaminação das massas por intermédio de discursos, escritos, imagens e gestuais simbólicos, dependiam de prévios planejamentos, minuciosos e bem organizados.

Essa era uma espécie de garantia de que as ideias transmitidas pelas palavras de determinada ação-alvo se tornariam uma “parte integrante das próprias populações”. E quando uma massa humana é convencida da racionalidade de uma ideia, diz ele, ela certamente entrará em ação (seja essa ideia de ordem política, ideológica ou social).

Ao longo de sua carreira, tanto pelo grau de elaboração, como pelo alcance, duas campanhas publicitárias promovidas por Bernays5 chamam muito a atenção: em uma delas, Bernays extrapola os objetivos imagináveis de um contrato de publicidade comum, estabelecido com uma empresa americana de alimentos que visava incrementar sua comercialização de bacon. Em vez de capturar potenciais consumidores privilegiando somente aspectos como sabor, imagem e preço, Bernays retira do seu arsenal ideário de propaganda o prestígio do discurso médico, da ciência, fazendo com que milhares desses profissionais da saúde, em todo território norte-americano, atestassem publicamente que tomar uma café da manhã reforçado é tomar um café da manhã saudável, forte, e que esse deve conter preferencialmente ovos e bacon. Com essa “sacada”, carimbado pela ciência médica com o poderoso “valor da verdade”, nasceria o lendário breakfast americano como indicativo de um modo de vida saudável (típico). Esse caso não só se tornou um sucesso de campanha publicitária, como marcou o que talvez tenha sido o começo da participação desses profissionais da saúde em peças publicitárias diversas, doravante.

Outra campanha notável elaborada por Bernays é descrita no livro Propaganda – como manipular a opinião na democracia (1928 [2004])6, no prefácio escrito por Normand Baillargeon (21-22). Trata-se de um trabalho realizado em 1929, a pedido de George Hill, presidente de uma empresa fabricante de cigarros (American Tobacco Company). Esse empresário acreditava que perdia metade do mercado potencialmente consumidor dos seus cigarros, no caso as mulheres, devido ao tabu que as proibia de aderir a esse hábito, na época.

Uma vez contratado para fazer a propaganda dos cigarros, Bernays decide consultar a opinião do psicanalista Abraham Arden Brill, um austríaco radicado nos EUA que se correspondeu com Freud até o fim da sua vida (1939). Desse encontro, Bernays retorna com a dica de que o “cigarro seria um símbolo fálico capaz de representar o poder sexual dos homens” e que, portanto, no seu plano de propaganda, ele deveria criar um vínculo entre o cigarro e alguma forma de contestação desse poder: assim, “estando de posse dos seus próprios pênis (simbólicos)”, as mulheres poderiam fumar.

A jogada propagandística de Bernays consistiu da criação da seguinte situação, previamente combinada, em minúcias, que ocorreu no popular desfile anual de Páscoa em Nova York, em 1929. Durante o desfile, um grupo de jovens mulheres que havia escondido cigarros sob suas roupas, de repente os tirou e os acendeu diante de jornalistas e fotógrafos que já haviam sido alertados sobre “as sufragistas que explodiriam de brilho”. Tal como um vírus, essa imagem se espalhou por todos os veículos midiáticos da época, circulando de boca em boca e formando a ideia de que as mulheres, já em luta há cerca de uma década pelo sufrágio universal, nada mais teriam feito do que iluminar, portando suas “tochas da liberdade”. Assim, o cobiçado mercado feminino de consumidores de cigarros foi conquistado, para a satisfação dos produtores e comerciantes do produto.

No que diz respeito à violência e destruição que esse tipo de arte de manipulação e condução das psiquês permite abarcar, não se deve esquecer o que as linguagens podem realizar, também, quando usadas em guerras convencionais e não-convencionais (aqui designadas por híbridas), assim como em campanhas genocidas.

Como exemplo, cabe apontar aqui dois fatos. Um deles é a menção feita ao espanto de Edward Bernays (32) quando um amigo seu jornalista, baseado na Alemanha, lhe contou que viu o livro Cristalizando a Opinião Pública, de autoria de Bernays, entre as obras sobre Propaganda presentes na biblioteca de Joseph Goebbels. Com essa revelação, ficou evidente para Bernays que o mentor das estratégias genocidas da propaganda nazista havia usado o seu livro, e que essa campanha de perseguição e destruição fora meticulosamente calculada e planejada.

O segundo fato foi a deposição de uma democracia na Guatemala, no ano de 1954, um Golpe de Estado que contou com a ajuda da CIA para derrubar o presidente Jacob Arbenz, eleito em 1951 (31-31). O golpe só se concretizou graças a uma agressiva campanha de ordem psicológica, orquestrada por Edward Bernays, um conjunto de ações baseadas em boatos, mentiras e desinformação, onde não faltou nem mesmo uma deliberada distorção de um projeto de reforma agrária elaborado pelo presidente deposto, uma manobra que a caracterizou como uma “ameaça comunista” (esse evento é observado com detalhes, por Jessé de Souza, no livro A Guerra contra o Brasil).

Vivemos hoje diversas mudanças de paradigma, em um mundo onde democracias, em diversas regiões, sofrem duríssimos abalos em seus alicerces, tal como se essas convulsões fizessem parte de uma estranha arquitetura do caos, planejada. Não por acaso, o primeiro capítulo do livro Propaganda, de Edward Bernays, que é dedicado à manipulação e condução das psiquês pelas linguagens, visando, entre outras coisas, a fabricação de consentimento, intitula-se Organizando o Caos.

Atualmente, essas mudanças de paradigma se refletem tanto no campo das relações presenciais como no das virtuais, seja porque encurralados por uma gravíssima pandemia, seja pelas necessárias revisões sobre o uso que se faz, até o momento, dos sistemas e dispositivos tecnológicos com os quais se pode estabelecer ou cancelar contatos e relações.

Aos inúmeros dispositivos digitais criados para a coleta de dados, gostos, tendências, opiniões e decisões, soma-se os de captura das impressões afetivas e emotivas, em uma perspectiva real de controle e condução de pensamentos.

Nesse cenário, tristezas, alegrias, sonhos e medos, também podem ser manipulados. Continuando a ser um equívoco, para se saber como agir, buscar entender um momento de ruptura dessa natureza com o olhar demasiadamente no passado, na expectativa de prever o que virá.

*Lucio Lauro B. Massafferri Salles é professor e psicólogo. Graduado em Filosofia (UFRJ) e Psicologia (CEUCEL), Doutor e Mestre em Filosofia (UFRJ) e Especialista em Psicanálise (USU). Realiza atualmente pesquisa de Pós – Doutorado em Filosofia na UERJ.

Citações:

[1] https://guerrashibridas.files.wordpress.com/2018/03/guerras-hc3adbridas-a-abordagem-adaptativa-indireta-com-vistas-c3a0-troca-de-regime-2.pdf (link para download do livro de Andrew Korybko).

[2] https://tutameia.jor.br/brasil-e-alvo-de-guerra-hibrida/ (entrevista de Andrew Korybko para o Tutaméia, na qual ele afirmou, em 2018, que o Brasil era alvo de uma Guerra Híbrida).

[3] https://jornalggn.com.br/opiniao/o-caos-entre-a-virtualidade-e-o-apagamento-das-relacoes-presenciais-por-lucio-lauro-b-massafferri-salles/ (nesse texto abordo uma questão relativa ao apagamento das relações virtuais no contexto da internet).

[4] https://www.ted.com/talks/carole_cadwalladr_facebook_s_role_in_brexit_and_the_threat_to_democracy?language=pt-br (link para a palestra/denúncia da jornalista investigativa britânica Carole Cadwalladr).

[5] As duas estão presentes no livro de Bernays Propaganda – como manipular a opinião na democracia e são analisadas por Jessé de Souza, no seu livro A Guerra contra o Brasil (págs.73-75).

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O demônio familiar

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demônio familiar seguidores internet
Lula, Bolsonaro e Felipe Neto (Imagens: instagram)

Eduardo Bonzatto*, Pragmatismo Político

Milan Kundera, na Insustentável Leveza do Ser, pela página 284 da edição da Companhia das Letras de 2008, dá sua interpretação do momento em que Nietzsche desaba para viver todo sentimento que havia negligenciado durante sua vida mortal:

Nietzsche está saindo de um hotel em Turim. Vê diante de si um cavalo e um cocheiro lhe dando chicotadas. Nietzsche se aproxima do cavalo, abraça-lhe o pescoço sob o olhar do cocheiro e explode em soluços. Isso aconteceu em 1889 e Nietzsche já estava, também ele, distanciado dos homens. Em outras palavras: foi precisamente nesse momento que se declarou sua doença mental. Mas, para mim, é justamente isso que confere ao gesto seu sentido profundo. Nietzsche veio pedir ao cavalo perdão por Descartes. Sua loucura (portanto, seu divórcio com a humanidade) começa no instante em que chora pelo cavalo. É esse Nietzsche que amo…

É uma sugestão intrigante essa e que merece umas tantas páginas de brilhantismo que logicamente me falta.

Aprisionado pela síndrome do escafandro, Nietzsche permanecerá por dez anos ligado ao mundo unicamente pelo sentimento. O sentimento é uma teia cognitiva que expande a vida de todo ser. Sua amplitude nos é negada no universo cartesiano porque é temerário sentir diante do pensar.

O pensamento está inscrito e circunscrito numa dicotomia RAZÃO-EMOÇÃO e deve permanecer por aí mesmo, com o risco de ser negado pelo sentimento.

As diferenças entre emoção e sentimentos são muitas, mas ainda pouco exploradas, de tal sorte que muitas vezes se confundem.

Se o sentimento é uma chave que abre para o desconhecido, portanto é caos, pois é imprevisível, a emoção é o próprio corolário da razão, na medida em que é reativa a estímulos e experiências, acionando temperamento e personalidade, reforçando a autoimagem e acionando o ego. Emoção é requisito da racionalidade, como se sua presença no humano pudesse humanizar. Se o sentimento é caos, a emoção aspira a uma forma de ordem.

A racionalidade, diga-se, é o ferramental mental necessário à expansão infinita do capitalismo, colonizando as mentes de modo a que a própria ressignificação do sistema capitalista mantivesse seus dispositivos funcionais. Então, capitalismo, socialismo, comunismo, anarquismo, ismo, ismo se sucedem num cenário sempre teleológico rumo à democracia.

A democracia é um sistema emocional, como o é o sistema capitalista. E digo emocional num sentido bem subjetivo, de símbolos cujo efeito produz um orgulho, uma soberba e um vínculo de pertencimento. A racionalidade que se exige é sempre instrumental.

Todas as etapas de preparação para ingressar nesse mundo é de subserviência sutil. Na educação é o currículo oculto que vai drenando no sujeito seu pertencimento. Cada etapa é premiada pela submissão. De notas, de emulação, de vínculos.

O mundo do trabalho não será diferente. Necessita de vínculos e em sua forma mais avançada, a síndrome da eficiência, ou seja, faço o melhor não porque quero agradar, mas porque é como me reconheço, no fazer perfeito da submissão sem submissão, mas voluntária.

As formas competitivas são aqui traduzidas em QI, Quem Indica, pois toda competição é mais uma vez simbólica e ostentatória.

Aqui é o reino dos doutores, essa forma que se exibe sem nenhum pudor antecedendo o nome. Em que qualquer diploma universitário é um atestado de superioridade social.

E no discurso da servidão voluntária, o melhor é ser eficiente. Ou seja, nem precisa de chefia, de comando, de dono. O trabalho passa a se confundir com a própria vida e exige o tempo todo do ser.

Não deve ser por racionalidade, portanto, que um ser como esse se movimenta, pois qualquer atividade de pensamento que o leve a compreender essa situação exigiria que negasse sua própria história.

O jogo emocional sempre está no topo da racionalidade. Me lembra uma peça teatral do tempo da escravidão.

O demônio familiar é uma peça em quatro atos de José de Alencar. Escrita em 1857, que apresenta Pedro, o escravo da casa que queria deixar de ser serviçal para se tornar cocheiro, ou seja, pretendia uma grande ascensão social naquele espectro da escravidão. Pedro, o demônio familiar, vive o cotidiano da casa como se fosse “da família”.

Machado de Assis chamava a atenção da peça pelo seu “ar de convivência e de paz doméstica que encanta desde logo”. E será nessa posição que Pedro vai tecendo arranjos, intrigas, promovendo alianças, como um verdadeiro Puck shakespeariano. Sua maestria é lidar com as emoções como um verdadeiro manipulador.

Uma vez descoberto, sua punição será exemplar: seu dono lhe concede a alforria, o que significa, segundo a dramaturgia alencardiana, deixa-lo à sua própria sorte, sem a proteção da instituição que o acolhia.

A emoção que serviu a seus propósitos, agora, como castigo, desencadeia sua exclusão. Não há redenção para Pedro.

A escravidão é uma visão de mundo e não um jogo de racionalidades, ou na melhor das hipóteses, a racionalidade da escravidão não admite viver fora dela, assim como no mundo do trabalho, viver do lado de fora é não mais existir.

Esse o jogo emocional do sistema. Ele nubla a razão ao tornar seus usuários bólidos emocionais a suportar todo o peso. Passa a ser racional servir, pois o sistema está dentro.

Para entendermos o jogo emocional do sistema precisamos de uma jornada no mundo da meritocracia. Pois a meritocracia é em si racional, depurada de todo novelo emocional ela refrigera o pensamento, unicamente. A meritocracia é fruto de um pragmatismo político.

Existem muitos mundos dentro desse mundo eurocêntrico. Além do capitalismo, da democracia, existe a grande força moral da religião muçulmana, existem as tribos diversas, que só para darmos dois exemplos, relembro aqui o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) e o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), tribos armadas e aguerridas que defendem seus territórios autônomos que são muito diferentes do conceito de nação.

Quero aqui tecer uma comparação bem didática do caso chinês. Eric Li desvenda as metanarrativas que normatizam nossa percepção dos sistemas de poder e o faz de modo técnico e inovador.

Ele é um crítico das metanarrativas, que é a forma como naturalizamos uma história colonizadora e, consequentemente, o poder.

Para estabelecer essa crítica, vai investigar como funciona o acesso ao poder no país gerenciado por um partido único, sem democracia e que, no entanto, é hoje a segunda maior economia do mundo.

A China pós revolução cultural não chegou a esse lugar global descuidadamente. O partido único chinês opera sua eficiência pautado numa lógica meritocrática extremamente funcional cujas características principais são também a adaptabilidade e a legitimidade.

O mais alto corpo legislativo chinês é o Politburo , com 25 membros. Em sua mais recente formação, apenas 5 membros tiveram uma vida privilegiada. O restante viveu uma vida comum. No comitê central de 300 ou mais, aqueles que nasceram com riqueza ou poder é ainda menor. A grande maioria dos principais líderes no poder na China lutaram e trabalharam por seu lugar.

O Departamento de Organização do Partido é um organismo que funciona como um enorme sistema de recursos humanos, que opera uma pirâmide rotativa em três níveis: serviço civil, empresas estatais e organizações sociais como universidades ou programa comunitário. Eles formam carreiras separadas, porém integradas para funcionários públicos chineses.

A base é denominada de keyuan (funcionários) que podem ser promovidos a quatro níveis crescentes de elite: fuke (vice-gerente de seção), ke (gerente de seção), fuchu (vice-gerente de divisão) e chu (gerente de divisão). Esses cargos referem-se a grande variedade como administração da saúde pública de um vilarejo, investimento estrangeiro num distrito urbano, diretor de uma empresa.

O departamento então avalia o desempenho do funcionário, entrevistando seus superiores e colegas, seus subordinados, examinando sua conduta pessoal. Consultam as pessoas todas envolvidas no serviço do funcionário e só então executam a promoção devida. Durante sua vida, o funcionário pode alterar a carreira várias vezes e se for mesmo bem avaliado irá além do nível básico, subindo até os níveis fuju (vice-chefe de gabinete) e ju (chefe de gabinete).

Aí atingem a alta oficialidade. Passam então a administrar um distrito com milhões de habitantes ou uma empresa com milhões de dólares em receita. Um sistema altamente competitivo que, em 2012, havia 900 mil níveis fuke e ke, 600 mil níveis fuchu e chu e somente 40 mil níveis fuju e ju.

Depois do nível ju, a subida se torna muito mais difícil, até chegar ao comitê central. O processo demora de duas a três décadas e o mérito é o componente mais importante, a despeito de certos favorecimentos.

O departamento que rege toda essa complexa movimentação meritocrática é herdeiro de uma tradição de mentores na China.

O atual presidente chinês começou administrando um vilarejo no interior do país e depois de 30 anos, quando entrou no Politiburo, havia administrado áreas com uma população total de 150 milhões de pessoas e PIB combina de 1,5 trilhões de dólares.

Luiz Inácio Lula da Silva ou Jair Messias Bolsonaro antes de chegar à presidência da república não haviam administrado nem um campo de futebol.

Não busco aqui um padrão ou uma teoria, mas a democracia, cada vez mais que avançamos no corpo de suas mazelas, as escolhas são muito mais emocionais do que racionais.

Conversando com três gerações de uma mesma família tipicamente urbana e de classe média, recolhi essa preciosidade emotiva de cada uma. A mãe, bolsonarista, dizia que esse “homem” que lutava sozinho contra um sistema injusto merecia um pouco de paz e felicidade. A filha, lulista, queria que o Lula, depois de uma jornada de lutas e injustiças sofridas, gozasse de felicidade e paz. O neto, adicto do Felipe Neto, dizia que ele está feliz, sacrifica a vida em busca da difícil tarefa de conquistar mais adeptos, mas está claramente feliz.

Nesses três casos a hagiografia mobiliza milhões de pessoas emocionalmente envolvidas, são quase pessoas “da família” esses avatares. Se referem a eles com aquela intimidade que devotamos a quem amamos, cujo afeto nos mobiliza. Nenhuma das três pessoas conhece seus ídolos, mas os tratam com benevolência e carinho. Não há como não identificar nesses gestos emoções variadas. Nos três casos parecem dizer com Leon Bloy que “só existe uma tristeza: a de não sermos santos”.

Recentemente, Felipe Neto publicou em suas redes sociais o seguinte comentário, digno de um santo:

Desculpa se estou te irritando. Eu juro que minha luta é para o seu bem, também. Um dia você vai enxergar isso”.

E o PCdoB comentou na mesma postagem:

Conte com o apoio do PCdoB Felipe Neto, você tem sido fundamental na luta pela democracia”.

É dessa incompreensão de uma parte que vive o santo. Seu sacrifício, no entanto, é por todos.

Os três foram alçados a essa posição que mobiliza milhões de pessoas sem muita razão de ser, mas os três se tornaram razoáveis não pelo desempenho ou pela eficiência, só a emoção explica a forma com que seus seguidores os veem. Uma emoção genuína, paripassu com a razão, quase razão, razoável.

Em todos esses lares habita um demônio familiar, uma energia que mobiliza, que fere, que cria o conflito, chame-a ideologia ou paixão, pouco importa, mas que já não pode mais deixar o lar, sair ao mundo frio do abandono. É preferível a escravidão, porque ele se tornou familiar.

*Eduardo Bonzatto é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB).

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Estudante de 19 anos é secretário do Meio Ambiente e ganha salário de R$ 10 mil

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Yuri Santos Oliveira
Yuri Santos Oliveira

O estudante Yuri Santos Oliveira, de 19 anos, foi nomeado em abril deste ano como secretário municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Japeri, cidade da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro. Com o cargo, o jovem se tornou chefe da própria mãe e também da avó, que foram empregadas no órgão.

Yuri foi empossado em 3 de abril e, embora seu salário seja de R$ 10 mil por mês, ele recebeu duas parcelas do auxílio emergencial de R$ 600, destinado a trabalhadores desempregados ou de baixa renda. Os pagamentos acontecerem em abril e maio, quando ele já era secretário.

Na pasta assumida por ele em Japeri, Yuri virou chefe da mãe, Fabiana, que é gerente administrativa da secretaria, e da avó, Lúcia, oficial de gabinete. Além da pouca idade, a nomeação causou ainda mais estranheza por ele não ter experiência em gestão pública.

O jovem é aluno matriculado no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRJ) no campus da cidade de Paracambi e substituiu o ex-secretario Kérly Gustavo Bezerra Lopes, que pediu exoneração em março porque pretendia se candidatar a vereador.

A explicação para a nomeação de Yuri seria a ligação da mãe e da avó com o ex-secretário, que comandava a pasta assumida pelo estudante. Elas atuaram como cabos eleitorais na última eleição, já que Kérly é aliado do ex-prefeito de Japeri, Carlos Moraes Costa (PP-RJ).

Costa foi preso em julho de 2018 pela Operação Sênones, que investigava a ligação de políticos com quadrilhas que comercializam drogas na Baixada Fluminense. À época, foram encontrados na casa do então prefeito uma pistola calibre 9 milímetros, de uso restrito, e várias munições. Ele foi solto em outubro do ano passado.

A Prefeitura de Japeri disse que está analisando o caso da nomeação e afirmou que o benefício recebido pelo secretário é de responsabilidade federal.

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Até o último indígena!

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Foto: Ricardo Stuckert

Luís Felipe Machado de Genaro*, Pragmatismo
Político

Não ocorreram apenas uma, duas ou três, mas centenas de vezes, nas mais diferentes regiões da América Latina, o aviso alto e claro de que as desigualdades sociais e econômicas históricas do continente frente a pandemia do COVID-19 colocariam em risco populações de maior vulnerabilidade, como trabalhadores precariazados, moradores de comunidades periféricas, ribeirinhos e indígenas. Agora não está mais claro, pois é um fato. Está ocorrendo.

Entre tantas tragédias cotidianas, a mais longa e sofrida: o continuado genocídio indígena. A característica latente do continente latino-americano. Iniciado com a invasão ibérica nos idos do século XVI, nunca deixamos de exterminar a cultura e os corpos indígenas. A pandemia só veio escancarar um terror já naturalizado.

Mesmo sob os governos progressistas da dita “onda rosa” sul-americana, a continuidade da matança nos moinhos de moer gente foi uma realidade. De nada adianta partidos e movimentos à esquerda negaram tais fatos com tamanha desfaçatez. Hoje, após a guinada à direita e extrema-direita no continente – região acometida por mais um golpe de Estado paramilitar, agora contra um presidente indígena, Evo Morales, em 2019 – assistimos lideranças assassinas perpetuarem o extermínio ao seu extremo.

Leia aqui todos os textos de Luís Felipe Machado de
Genaro

Contudo, as comunidades indígenas se organizam e resistem. Como professor de História de uma cidade interiorana brasileira, tive a chance de participar duas vezes de Comissões Étnicas Regionais Indígenas, também em 2019. Em ambos os encontros em duas comunidades diferentes, três palavras ficaram gravadas na minha memória: aprendizado, esperança e resistência.

Há organização e força entre eles como jamais observei em outros ambientes. Não obstante, o ataque voraz e rasteiro não cessa, seja pelo extrativismo e exploração legal (através de latifúndios) e ilegal de suas terras; contínuo trabalho escravo ou análogos à escravidão; destruição ambiental; atos políticos bárbaros de racismo e descaso como os de Jair Bolsonaro, no Brasil, Jeanine Áñez, na Bolívia, e Alejandro Giammattei, na Guatemala; ou pelo puro e simples preconceito.

Hoje, em toda a América Latina e não só no catastrófico Brasil, como mostrou reportagem recente do The Intercept, a vida dessas populações – 45 milhões de latino-americanos que, na sua maioria, abandonados pelas autoridades públicas de seus respectivos países – já não vale absolutamente nada.

Triste reconhecer que não fomos capazes de impedir um genocídio de séculos, muito menos secar os rios de sangue que não param de fluir de aldeias, tribos e comunidades. A pandemia do COVID-19, no entanto, veio nos mostrar de forma escancarada duas assertivas: a primeira é de que não deixamos de ser um continente de infortúnios como apenas há alguns anos tínhamos sonhado. Nunca deixamos a mentalidade colonizadora de lado, a mesma que dava aos cães os bebês indígenas já mutilados. Depois, que não haverá trégua. A luta pela vida dessas comunidades ocorrerá até a queda do último indígena. Até a última flecha ser lançada.

Foto: Ricardo Stuckert

*Luís Felipe Machado de Genaro é historiador, mestre em história
pela UFPR e professor da rede municipal de Itararé

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Não é surpresa, não há milagre

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governo Bolsonaro surpresa milagre direita brasil
Jair Messias Bolsonaro (Imagem: Isac Nóbrega | PR)

César Zanin*

A república federativa do Brasil é constituída por três poderes governativos indissolúveis, independentes e coesos (executivo, legislativo e judiciário), e composta por 27 unidades territoriais (26 estados e um distrito, onde se localiza a capital), subdivididas em 5570 municípios.

Todo o território nacional, compreendendo seus ocupantes (cidadãos, residentes e visitantes) e seus recursos, é governado através da denominada Tripartição dos Poderes Políticos (os já mencionados executivo, legislativo e judiciário); tripartição no sentido de separação (sim, o Brasil é governado por três poderes distintos).

O objetivo dessa separação é evitar que o poder se concentre nas mãos de só uma pessoa (ou um grupo restrito), para que não haja abuso, como o ocorrido nos estados absolutistas, por exemplo, em que todo o poder concentra-se na mão do monarca, ou nos estados teocráticos, em que todo o poder concentra-se na mão da cúpula dirigente religiosa. Decorre disso o estado de direito.

Estado de direito é uma situação jurídica, ou um sistema institucional, em que cada um e todos (do simples indivíduo até o poder público) são submetidos ao respeito às normas e aos direitos fundamentais. No estado de direito até mesmo os mandatários políticos (na democracia: os eleitos) estão submissos à legislação vigente.

O termo república refere-se a um sistema de governo cujo poder emana do povo, ao invés de outra origem, como a hereditariedade ou o direito divino. Enquanto a democracia é muitas vezes equiparada à forma republicana de governo, o termo república classicamente abrangeu democracias e aristocracias. Algumas democracias são monarquias constitucionais muito antigas, como é o caso de países como o Reino Unido e o Japão.

Democracia é um regime político em que todos os cidadãos elegíveis participam igualmente — diretamente ou através de representantes eleitos — na proposta, no desenvolvimento e na implementação de leis, exercendo o poder para governar.

Toda essa configuração para exercer o poder e governar é o resultado de milênios de evolução nos campos social e político, está longe de ser perfeita mas é o melhor possível, pelo menos no momento.

Nos últimos cem anos a humanidade vem tentando colocar em prática essa configuração, com altos e baixos. Ela provavelmente sofrerá mudanças, é inevitável. Há apenas duas opções prováveis:

1. Será aprimorada com novidades;
2. Haverá o resgate de elementos do passado.

Poucas pessoas conseguem viver tanto a ponto de alcançar os cem anos de idade, o que pode passar a impressão de que é tempo demais, mas em termos de sociedade, civilização, é um período considerado curto, a ponto de qualificarmos os últimos cem anos como história recente.

A Grande Depressão (fim dos anos 1920 e anos 1930) trouxe desencanto e a maioria dos países da Europa, América Latina e Ásia virou-se para regimes autoritários. O fascismo e outros tipos de ditaduras floresceram na Itália, na Alemanha nazista, na Espanha e em Portugal, além de regimes não-democráticos terem surgidos nos países bálticos, nos Balcãs, no Brasil, em Cuba, na China e no Japão, entre outros.

A Segunda Guerra Mundial foi um conflito militar global que durou de 1939 a 1945, envolvendo a maioria das nações do mundo — incluindo todas as grandes potências — organizadas em duas alianças militares opostas: os Aliados e o Eixo. Marcado por um número significante de ataques contra civis, incluindo o Holocausto (isto é, o genocídio do povo judeu, de comunistas, socialistas, homossexuais, negros, ciganos e demais minorias, executado pelo Eixo) e a única vez em que armas de destruição em massa (bombas nucleares) foram utilizadas em combate (por parte dos EUA), foi o conflito mais letal da história da humanidade, resultando entre 50 a mais de 70 milhões de mortes.

Os Aliados da Segunda Guerra Mundial, chamados de Nações Unidas a partir da declaração de 1 de janeiro de 1942, foram os países que se opuseram às Potências do Eixo durante a guerra. Os Aliados foram liderados por Reino Unido, França, União Soviética, EUA e China, e promoveram a aliança como um meio de controlar a agressão nazista alemã, imperial absolutista japonesa e fascista italiana (de governos autoritários, ditatoriais, antidemocráticos). O Eixo surgiu em 1936 como um pacto anticomunista com objetivos militares expansionistas, causando o início da guerra em 1939, quando a Alemanha nazista invadiu a Polônia.

A guerra acabou em 1945, após a rendição incondicional da Alemanha (com a tomada de Berlim por parte das tropas soviéticas e norte-americanas) e do Japão (com a destruição das cidades de Hiroshina e Nagasaki através do lançamento de bombas nucleares norte-americanas); a Itália fascista já tinha sido derrotada antes, tendo então abandonado o Eixo e se juntado aos Aliados.

O Brasil lutou ao lado dos Aliados contra o Eixo.

Muitos dos atos cometidos contra civis durante a guerra foram numa escala tão impressionante de selvageria, que vieram a ser amplamente considerados como crimes contra a humanidade. Muitas vozes, chocadas, conclamaram pelo estabelecimento de instituições capazes de impedir permanentemente qualquer possibilidade de repetição de eventos selvagens e destrutivos como a Segunda Guerra Mundial.

Os Aliados formaram a Organização das Nações Unidas (ONU), que oficialmente passou a existir em 24 de outubro de 1945, e aprovaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, como um padrão comum para todos os Estados-membro.

Muitas pessoas notáveis, como Albert Einstein, Winston Churchill, Bertrand Russell e Mohandas K. Gandhi, apelaram para que os governos se aprofundassem com passos sucessivos no sentido de formar um governo mundial efetivo. O cosmopolitismo é um pensamento filosófico que discorda das fronteiras geográficas impostas pela sociedade, considerando que a humanidade é composta por indivíduos de uma única espécie compartilhando os recursos naturais de um único planeta e que todos seguimos as mesmas leis físicas do universo; atenta para que os seres humanos formem uma única nação, avaliando o mundo na possibilidade de ser uma só pátria.

Infelizmente os proponentes do cosmopolitismo não foram escutados e a globalização vem se consolidando nas últimas décadas sob o desígnio do capitalismo neoliberal, em que empresas podem operar simultaneamente em diferentes países e explorar em vantagem própria as variações nas condições locais.

A ação neocolonialista de empresas transnacionais corrompe governos, proporciona a criação dos chamados paraísos fiscais, resultando num sistema que acentua a desigualdade social, aumentando o abismo entre os poucos incrivelmente ricos e todos os demais.

Na globalização neoliberal os ricos desfrutam dos privilégios da globalização e os demais se fecham no nacionalismo: os cidadãos dos países mais industrializados (cuja população conjunta soma aproximadamente um bilhão de pessoas) dispõem de livre movimento para migrar enquanto a maioria absoluta da população mundial, isto é, seis bilhões de pessoas ou mais, já nasce impedida de migrar. Pior ainda, pois na prática, os poucos ricos de qualquer país são bem-vindos em qualquer país, enquanto todos os demais são restritos.

Outro resultado da globalização neoliberal é a mudança climática causada pela atividade humana; aquecimento global é o processo de aumento da temperatura média dos oceanos e da atmosfera da Terra causado por massivas emissões de gases que intensificam o efeito estufa, originados de uma série de atividades humanas, especialmente a queima de combustíveis fósseis e mudanças no uso da terra, como o desmatamento, bem como de várias outras fontes secundárias.

A globalização neoliberal é incompatível com os princípios do cosmopolitismo, que motivaram a criação da ONU ao fim da Segunda Guerra Mundial.

A democracia cosmopolita é uma teoria política que aprofunda o cosmopolitismo, explora a aplicação das normas e valores da democracia na esfera transnacional e global.

Os conservadores, nacionalistas e neoliberais evitam o argumento a todo custo, sentem horror.

A democracia cosmopolita argumenta que a governança global do povo, pelo povo, para o povo é possível e necessária. No modelo de democracia cosmopolita, as decisões são tomadas pelos afetados, evitando uma única forma hierárquica de autoridade, podendo-se adaptar princípios tanto capitalistas como socialistas.

Entre os escritores defendendo a democracia cosmopolita estão Immanuel Kant, David Held, Daniele Archibugi, Richard Falk e Mary Kaldor.

Muitas personalidades também defenderam esses princípios no decorrer dos anos: H. G. Wells, Isaac Asimov, Hannah Arendt, Charlie Chaplin, Arthur C. Clarke, John Lennon, Carl Sagan.

A crise financeira de 2008 reproduziu o característico desencanto que levou o mundo à Segunda Guerra Mundial após a Grande Depressão.

Pasokificação é um termo usado para descrever o declínio de partidos de centro-esquerda e social democratas e o subsequente crescimento de partidos de extrema-direita na Europa no século XXI.

Desde pelo menos 2011 a América do Sul também vem sofrendo uma guinada à direita.

Esse fenômeno conservador global é visto como consolidado na votação pelo Brexit no Reino Unido e na eleição de Donald Trump nos EUA.

Esse neo-nacionalismo é uma ideologia e movimento que se desenvolveu aplicando elementos com caráter reacionário, gerados como reação às mudanças políticas, econômicas e socioculturais que ocorreram com a globalização; frequentemente associado a posições como populismo de direita, anti-globalização, nativismo, protecionismo, oposição à imigração, islamofobia, sinofobia e euroceticismo.

Agora, quase na metade do mandato, para além das medidas (ou falta de), para além de qualquer divergência à linha política adotada, não há mais dúvida alguma, o governo de Jair Bolsonaro não é apenas conservador, é reacionário, de matriz autoritária, conspira contra o estado de direito.

A revista Piauí, em sua edição 167 deste mês, reconstituiu os detalhes de uma reunião de gabinete presidencial que aconteceu em maio passado, com quatro fontes que pediram anonimato (duas delas testemunhas diretas da reunião).

Bolsonaro queria mandar tropas para destituir os atuais onze ministros do Supremo Tribunal Federal. Os substitutos, militares ou civis, seriam então nomeados por ele e ficariam no cargo “até que aquilo esteja em ordem”, segundo as palavras do presidente.

No tumulto da reunião, não ficou claro como as tropas seriam empregadas, nem se, nos planos de Bolsonaro, os ministros destituídos do STF voltariam a seus cargos quando “aquilo” estivesse “em ordem”.

A motivação do presidente para uma intervenção dessas? O STF teria tido a “audácia” de cogitar a apreensão de seu telefone celular como parte de uma investigação. Ou seja, Bolsonaro se considera acima da lei, o mandatário deixa claro que não aceita ser investigado.

Além dessa reunião, o presidente participou de manifestações públicas defendendo a intervenção militar para a destituição dos membros do congresso e do STF; disse abertamente que poderia intervir nos demais poderes da República, em suas lives, em entrevistas e pronunciamentos.

A presidenta Dilma Rousseff foi investigada, afastada, julgada, condenada e definitivamente impedida, em 2016, por ter cometido as chamadas pedaladas fiscais. Pedalada fiscal é uma prática contábil repetida há muitos anos por vários governantes dos executivos municipais, estaduais e federal, de vários partidos.

Michel Temer, por exemplo, cometeu pedaladas fiscais no mesmo mandato de Dilma, antes de tomar o lugar dela (e depois também); logo que se tornou presidente, tratou de tomar providências para implementar um tipo de passe-livre, “autorização permanente” para a prática da pedalada fiscal. FHC e Lula também cometeram pedaladas fiscais, Bolsonaro também; nunca foram julgados por isso, sequer investigados.

Não houve crime de responsabilidade por parte de Dilma e mesmo assim a investigação e o processo tiveram condução célere e livre de quaisquer interferências por parte da presidenta para livrar a própria barra; sem ameaças de fechar o congresso, sem ameaças de enviar tropas ao STF.

A democracia brasileira vem correndo muito perigo desde a eleição de Jair Bolsonaro, sob o grave risco de um golpe de estado com ruptura institucional de consequências profundas e duradouras, mas há como dizer que isso é uma surpresa?

Não há como negar, ele foi eleito e sua figura corresponde aos anseios de grande parte da população.

Como é que os progressistas, constitucionalistas, ou mesmo conservadores de aspiração democrática, podem reagir para evitar uma nova ditadura?

Há quem diga que o confronto na base da agressividade seja inevitável, eu discordo; tampouco acredito que apenas a diplomacia em tratativas entre oposição e governo sejam suficientes, longe disso.

Acredito que se deva focar na informação, para que o maior número possível de pessoas saiba o que acontece, para que essas pessoas conheçam o cronologia dos fatos, distinguam os sujeitos, os agentes, entendam a terminologia e as definições, podendo assim identificar a mentira e ponderar suas escolhas.

Devemos trazer os jovens para o debate político, pois dentre eles estarão os expoentes futuros do campo progressista, mas não me limito aqui à formação de militantes partidários, porque todos os partidos hoje, uns menos e outros mais, são fisiológicos. Na democracia o poder deve ser exercido pelo povo através do voto, os partidos devem representar um meio para que o povo possa exerça o poder; é preciso combater o fisiologismo nos partidos.

A maioria da população, que realmente vinha sendo beneficiada nas gestões do PT – e que dentro de pouco tempo vai começar a sofrer as consequências das políticas dos governos Temer e Bolsonaro, se deixou levar pela campanha de demonização do PiG e da Lava-Jato, justamente contra o fisiologismo, contra a chamada “velha política”.

Uma evidência muito clara disso é que o eleitorado escolheu Bolsonaro, um político “forasteiro”, enquanto o PSDB teve uma quantidade irrisória de votos. Da última vez que o eleitor preferiu escolher um “forasteiro”, faz mais ou menos 30 anos, os brasileiros tiveram as poupanças confiscadas.

Vejo muitos progressistas cada vez mais fechados em suas bolhas, cada vez mais desistindo de tentar o diálogo, mas é preciso tentar conversar, pois muita gente votou em Bolsonaro por revolta à “velha política”, pensando que ele simboliza o novo.

Com Bolsonaro, o velho modo de se fazer política acabou trazendo ao menos uma novidade, digamos, inusitada (para não perdermos a diplomacia de vista):

O plano do presidente de indicar o filho Eduardo para o cargo de Embaixador do Brasil nos EUA, no ano passado, representou uma quebra sem precedentes na tradição diplomática do país. Nunca na história republicana brasileira um presidente indicou um filho para um cargo de embaixador, ainda mais em um posto tão sensível quanto aquele.

A prática também é exótica em grandes democracias do mundo e remete aos princípios absolutistas, monárquicos, da realeza. Exemplos desse tipo de indicação atualmente são encontrados em ditaduras – como a Arábia Saudita, o Chade e o Uzbequistão.

Quando Bolsonaro diz defender os valores da família tradicional, ele não está brincando: Um levantamento feito pelo jornal O Globo no ano passado mostrou que desde 1991 a família Bolsonaro nomeou 102 assessores com parentesco entre sì para cargos remunerados.

Beneficiar a si próprio, ou a familiares, mesmo que indevidamente, em detrimento dos legítimos beneficiários, em detrimento da sociedade como um todo, causando e mantendo privilégios, injustiça e corrupção, é um costume dos mais tradicionais no Brasil.

Apesar de Bolsonaro dizer que representa a “nova política”, suas práticas sempre foram as da “velha política”; alianças espúrias, nepotismo e apropriação indébita ou uso indevido sempre foram questões problemáticas na família Bolsonaro.

Em entrevista de 2000 à revista Gente, Jair Bolsonaro disse que seu pai, Percy Geraldo, bebia descaradamente e brigava muito em casa, o que teria sido a causa do afastamento entre pai e filho. Não se sabe o quanto isso o afetou enquanto criança e adolescente, o quanto isso contribuiu para sua formação pessoal, o próprio Bolsonaro disse que depois de anos afastados eles se tornaram grandes amigos.

Bolsonaro ingressou no exército em 1977 e foi preso em 1986 por insubordinação. Logo depois de ter sido preso, Bolsonaro planejou uma série de atentados a bomba, na Vila Militar da Academia das Agulhas Negras em Resende e em alguns outros quartéis, com o objetivo de “protestar” contra o “baixo” salário dos militares. Além disso Bolsonaro desenhou o croqui para a colocação de uma bomba e causar uma explosão na Adutora do Guandu, que abastece de água ao município do Rio de Janeiro.

Após quatro meses de investigação por parte do Ministério do Exército, Bolsonaro foi considerado culpado pelo Conselho de Justificação Militar, em 1988, por unanimidade.

Bolsonaro tinha informado ele próprio sobre seus planos a uma repórter da revista Veja, em 1987, mas mesmo assim recorreu ao Superior Tribunal Militar, alegando insuficiência de provas; curiosamente, apesar de ter sido expulso da Escola de Oficiais, foi mantido nos quadros do Exército.

Ainda em 1988, Bolsonaro foi para a reserva, com a patente de capitão e, no mesmo ano, iniciou sua carreira política, concorrendo a vereador do Rio de Janeiro.

Na mesma entrevista à revista Gente, quando perguntado sobre o fim de seu casamento, o então deputado federal disse que em 1992 ele “elegeu” a esposa Rogéria para vereadora do Rio de Janeiro e que ela deveria ligar para o celular do marido para decidir os votos dela na Câmara, mas ela “começou a frequentar o plenário e passou a ser influenciada pelos outros vereadores“.

Rogéria foi a primeira pessoa da família que o presidente inseriu na política; o sucesso da campanha e a posterior separação motivaram Bolsonaro em seu passo seguinte: a candidatura do filho Carlos, com então 17 anos de idade, disputando contra a própria mãe.

Bolsonaro vem atuando na política há mais de 30 anos, sempre “comendo pelas beiradas” (como parlamentar por quase 30 anos não conseguiu ver mais do que um par de projetos seus aprovados), mas em todo esse tempo ele repetidamente proferiu declarações ofensivas, pregou a intolerância, causando polêmica, provocando e atacando adversários políticos.

Bolsonaro sempre defendeu valores conservadores e tradicionais, criou seus filhos de acordo com esses valores e três deles também são políticos defendendo esses valores, sua fé religiosa foi um dos principais pilares da sua campanha presidencial, cujo lema, “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, consegue transmitir uma mensagem intolerante em dois frontes ao mesmo tempo, exibindo o tom típico do neo-nacionalismo e do fundamentalismo religioso.

Fundamentalismo cristão, melhor dizendo, pois Bolsonaro admite apenas a sua religião católica, e mais recentemente também a fé protestante, já que abraçou os muitos pastores evangélicos que fizeram fortunas às custas do dízimo de seus seguidores, garantindo assim sua eleição.

Acontece que Bolsonaro é notório apoiador da ditadura militar, defende a prática institucional da tortura, da pena de morte (até mesmo da execução sumária sem quaisquer ritos judiciais), da perseguição política, do ataque às minorias sociais, enfim, da violência como solução aos problemas da sociedade.

Jesus defendeu condenados, juntou-se a renegados, mendigos, prostitutas. Revoltou-se contra os oportunistas que lucravam com a fé alheia nos templos. Quando atacado, ofereceu a outra face, e ensinou a dividir o pão. Os princípios mais básicos dos ensinamentos cristãos são o amor ao próximo e o perdão. Mesmo no Antigo Testamento, onde há diversas passagens brutais, encontramos os Dez Mandamentos, que não deixam dúvidas (“não matarás”, dentre outros).

O envolvimento da família Bolsonaro com as milícias é de público e notório conhecimento. E não é de hoje, faz muitos anos. As milícias são um poder paralelo, exercido à força, com envolvimento em práticas criminosas como extorsão, contrabando, roubo, assassinato, tráfico de armas e drogas. Corrupção da pesada, mesmo.

Lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, apologia à violência, fake news, discurso de ódio, até mesmo genocídio, são muitas as questões espinhosas no histórico da família Bolsonaro.

A polarização política no Brasil, com a demonização do PT e a chegada da extrema-direita ao poder, vem causando um clima cada vez menos propício ao diálogo.

Acredito que, para impedir que o pior do passado venha a se repetir, não podemos desistir de conversar antes mesmo de tentar; é preciso mostrar claramente e sem agressividade o que nos trouxe a esta situação e aonde nossas escolhas podem nos levar.

*Cesar Zanin nasceu em 1975 em São Paulo, numa família de origem italiana.
Tradutor, intérprete e professor (Português, Italiano e Inglês); Músico e produtor, atuante no cenário underground desde o início dos anos 1990, adepto dos princípios do ‘faça-você-mesmo’, no Brasil e no exterior.
Estudou História na Unisantos; Estudos Clássicos, Línguas e Literaturas Italiana e do Português, Tradução, Semiótica e Língua Inglesa na USP; Línguas e Literaturas Italiana e do Português na Università degli Studi di Padova; Linguística, Literatura Contemporânea e Filosofia da Ciência na Università degli Studi di Perugia.
Escreveu sobre política para o portal Pragmatismo Político e sobre música para o portal Rock Press (Rio de Janeiro), Floga-se (São Paulo), Indiepop.it e Nonsense (ambos na Itália). Além de blogues, plataformas e redes sociais.
Escreveu o romance 360 Graus, o Mojo Book In Circolo e os contos Parigi e Perugia, e Conto do Trabalho.
Atualmente mora em Bristol, Inglaterra.

Referências:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Brasil

https://pt.wikipedia.org/wiki/Rep%C3%BAblica

https://pt.wikipedia.org/wiki/Separa%C3%A7%C3%A3o_de_poderes

https://pt.wikipedia.org/wiki/Estado_de_direito

https://pt.wikipedia.org/wiki/Democracia

https://en.wikipedia.org/wiki/World_government

https://pt.wikipedia.org/wiki/Segunda_Guerra_Mundial

https://en.wikipedia.org/wiki/Cosmopolitanism

https://pt.wikipedia.org/wiki/Antiglobaliza%C3%A7%C3%A3o

https://www.un.org/en/sections/issues-depth/migration/index.html

https://pt.wikipedia.org/wiki/Aquecimento_global

https://en.wikipedia.org/wiki/Cosmopolitan_democracy

https://pt.wikipedia.org/wiki/Antinacionalismo

https://pt.wikipedia.org/wiki/Crise_financeira_de_2007%E2%80%932008

https://pt.wikipedia.org/wiki/Neo-nacionalismo

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pasokifica%C3%A7%C3%A3o

https://pt.wikipedia.org/wiki/Onda_conservadora

Vou intervir!

https://www.dw.com/pt-br/indica%C3%A7%C3%A3o-de-eduardo-bolsonaro-configura-nepotismo-diz-consultoria-do-senado/a-50069174

https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2019/08/04/levantamento-de-o-globo-revela-que-cla-bolsonaro-nomeou-102-assessores-com-lacos-familiares.ghtml

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/08/17/nepotismo-emendas-e-mp-5-vezes-em-que-bolsonaro-praticou-a-velha-politica.amp.htm

https://pt.wikipedia.org/wiki/Jair_Bolsonaro

https://web.archive.org/web/20130531142150/http://www.terra.com.br/istoegente/28/reportagens/entrev_jair.htm

Os documentos que levaram o Exército a expulsar Bolsonaro: “a mentira do capitão”

https://politica.estadao.com.br/blogs/neumanne/o-cla-bolsonaro-e-as-milicias/

https://www.cartacapital.com.br/politica/votos-e-bens-de-bolsonaro-e-flavio-avancaram-junto-com-milicias/

Dez fatos que ligam a família Bolsonaro a milicianos

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/05/19/bolsonaro-sempre-quis-legalizar-as-milicias-diz-maierovitch.amp.htm

https://www.brasildefato.com.br/2020/04/25/entenda-o-papel-de-moro-na-investigacao-de-milicianos-ligados-a-familia-bolsonaro

https://theintercept.com/2020/04/25/flavio-bolsonaro-rachadinha-financiou-milicia/

https://brasil.elpais.com/brasil/2020-06-20/trama-para-esconder-queiroz-e-ajudar-adriano-da-nobrega-joga-a-milicia-no-coracao-da-familia-bolsonaro.html

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Grávida de 9 meses morre após ser baleada pela própria filha em disparo acidental

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criança grávida arma de fogo
(Imagem ilustrativa)

Uma mulher de 30 anos, que estava grávida de 9 meses, morreu na tarde desta quinta-feira (27) após ser baleada nas costas por um tiro de rifle calibre 22, dentro de casa. A tragédia aconteceu na comunidade de Maruanum, na Zona Rural do Amapá, a cerca de 50 quilômetros da capital Macapá.

A mulher, identificada como Angélica Oliveira, foi baleada acidentalmente pela própria filha, uma criança. O tiro atingiu a coluna vertebral da vítima.

A informação foi confirmada pelo Centro Integrado de Operações em Defesa Social (Ciodes) e pelo Grupamento Tático Aéreo (GTA), que chegou a enviar uma equipe de helicóptero para atendimento no local, mas a vítima já estava sem sinais vitais. O bebê também não resistiu.

Policiais apreenderam o rifle calibre 22, que foi encontrado com duas munições. A arma é do marido de Angélica, que não foi localizado após o ocorrido. O caso está sendo investigado pela Polícia Civil, por meio da Delegacia de Crimes Contra a Mulher (DCCM).

Mais disparos

Apenas nas últimas 72 horas, outros dois casos de disparo acidental de arma de fogo foram registrados no Brasil. Uma criança de 13 anos foi atingida por um tiro em Vargem Redonda, Zona Rural de São Francisco, no Norte de Minas. O tiro de espingarda foi disparado por seu próprio irmão, de 14, que teve acesso ao armamento do pai. O menino foi atingido no ombro e sobreviveu.

Natália Silva, de 11 anos, não teve a mesma sorte. Ela morreu dentro de casa, na terça-feira (25), após ser atingida por um disparo feito pelo irmão de 13. O caso aconteceu na cidade de Humberto de Campos (MA).

Desde que assumiu o governo, Jair Bolsonaro já assinou um decreto e encaminhou projetos que facilitam o acesso às armas de fogo no Brasil.

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Médica picada por cobra em cachoeira tem 70% das vias aéreas comprometidas

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Dieynne Saugo cobra
Dieynne Saugo (Imagens divulgadas pela família)

O médico José Antônio de Figueiredo, coordenador do Centro Antiveneno de Mato Grosso (Ciave), informou que a médica Dieynne Saugo estava com 70% das vias aéreas comprometidas dois dias após as picadas que sofreu de uma cobra jararaca durante um banho de cachoeira.

Nesta terça-feira (1), a médica passou pelo procedimento de traqueostomia (pequena abertura na traqueia) e permanece internada em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) desde domingo (31).

O médico responsável por Dieynne informou que as vias aéreas da paciente ficaram comprometidas devido ao inchaço no rosto e no pescoço, o que acabou prejudicando a respiração da paciente.

“É como se tivesse uma reação alérgica. Não significa que o veneno cause alteração nesse sentido, mas causa o inchaço que, na região do pescoço, pode comprometer veias importantes. O caso dela é bem diferente devido ao local da picada. Na maioria das vezes, as picadas são no pé, tornozelo e perna, seguido de mão e braço”, explicou.

De acordo com a família de Dieynne, o médico deu duas opções para tentar melhorar a respiração da paciente. Uma era a traqueostomia e a outra a entubação. A traqueostomia é um procedimento cirúrgico que consiste em uma abertura feita na traqueia, com inserção de um tubo, que permite a passagem do ar. Na entubação, um tubo é colocado dentro da traqueia, que permite o uso de ventilação mecânica.

“Como a entubação teria um risco muito alto dela desenvolver pneumonia (que não é nada bom nesse momento), optamos pela traquio, por uma questão de precaução, para não ter que acabar tendo que fazer algum procedimento com urgência”, explicou a família em um comunicado.

José Antônio afirmou que o caso de Dieynne é considerado grave. Ela chegou ao Hospital Municipal de Cuiabá (HMC) vomitando sangue e com edemas. O local em que ocorreu o incidente fica a mais de 150 km do hospital. Foram cerca de 3 horas até chegar a unidade de saúde para a aplicação do soro.

“Nesse período já começam as alterações, como dor, inchaço e a diminuição na coagulação. Não tem como diminuir os edemas, mas, após a aplicação do soro, as alterações começam a ser controladas”, disse.

Entenda o caso

Dieynne fazia um passeio em um dos pontos turísticos da cidade de Nobres (MT) quando ocorreu o incidente. A cobra despencou com a queda d’água da cachoeira e atingiu a médica que estava logo abaixo.

Um vídeo gravado no momento do acidente mostra a médica pedindo socorro. Em outro vídeo, uma testemunha se aproxima da cobra que picou a médica. As imagens foram utilizadas para identificar a espécie.

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Pastor evangélico agride esposa sem saber que estava sendo gravado

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pastor evangélico edson araújo

O pastor Edson Araújo, da Igreja Pentecostal Deus é Amor, xingou a esposa antes de iniciar uma live em redes sociais. A agressão foi gravada pelo celular sem que ele percebesse que a gravação ao vivo já havia iniciado. As imagens viralizaram na internet.

No vídeo, é possível ver o pastor sentado e preparando para uma pregação quando levanta para ajeitar a posição do equipamento. É possível ouvir um barulho de tapa logo antes da câmera se mexer.

Araújo então volta para a frente da câmera e xinga a mulher, Debora, com quem realiza as transmissões na internet. “Faz as coisas direito, imbecil. Arruma o negócio direito, vai Débora”,ordena, visivelmente nervoso.

Pouco segundos depois, porém, ele adota outro tom e inicia a pregação com as palavras “aceitem a paz de Deus”. A transmissão aconteceu no último dia 14.

Diante da repercussão negativa gerada pelo flagra, Araújo apagou o vídeo e, no dia seguinte, tentou explicar o ocorrido e pediu desculpas.

Em vídeo gravado ao lado da mulher, o pastor alega um problema com o celular e diz que já estava “em cima do horário do culto”. Araújo alega ter derrubado o equipamento sem querer e admite ter xingado a esposa.

“Por um momento, verdadeiramente pela minha falha, eu assumo publicamente o meu erro de ter direcionado uma palavra incorreta, imprudente, a uma atitude que não é cabível à minha pessoa, à minha índole. Quero aqui, de antemão, pedir a Deus, publicamente pedir perdão à minha esposa Debora pelo meu erro, pela minha falha”, afirmou.

Durante toda a fala de justificativa de Araújo, Débora permanece calada e cabisbaixa. O pastor ressalta que o casamento dura quatro anos e alega que nunca tiveram problemas.

Com a repercussão do caso, a Igreja Pentecostal Deus é Amor divulgou uma nota nas redes sociais confirmando o afastamento de Araújo e reiterando que qualquer tipo de violência “é totalmente contrária aos princípios cristãos”.

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Mulher é demitida após aparecer no trabalho de cabeça raspada

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ritual candomblé
(Imagem: Ednilson Aguiar / O Livre)

Uma mulher de 41 anos foi vítima de preconceito após ter raspado a cabeça durante um ritual religioso do candomblé. Ela acabou demitida do trabalho no último dia 17 de setembro. O caso aconteceu em Cuiabá (MT).

A Polícia Civil disse, em nota, que a ocorrência foi registrada como crime de preconceito de raça e de cor, etnia, religião e de constrangimento ilegal. O caso é investigado pela 3ª Delegacia de Polícia.

A vítima trabalhava na empresa desde junho de 2019 no cargo inicial de auxiliar de serviços gerais e foi promovida ao cargo para líder do setor. Ela disse à polícia que no dia 7 deste mês fez a iniciação no Candomblé, que tem como ritual raspar a cabeça.

No dia seguinte, foi trabalhar usando seis tocas para “evitar comentários”. A funcionária afirmou que, durante o expediente, precisou ir ao banheiro, sendo acompanhada, sem que tenha visto, pela supervisora.

Conforme relatos da mulher à polícia, a inspetora a viu sem toca e a questionou sobre estar careca e se estava com câncer. A vítima, por sua vez, negou e explicou sobre o ritual religioso.

Conforme o boletim de ocorrência registrado pela trabalhadora, dez dias depois, ela foi chamada ao escritório e a chefe dela pediu que ela tirasse a toca. Com ar de reprovação, a supervisora teria afirmado que pessoas dessa religião não cabiam no quadro da empresa e que, “além de ser negra, era macumbeira”.

A vítima afirmou à polícia que foi orientada pela empresa a procurar Deus para se salvar, e que a chefe dela repetia que: “pessoa da sua cor e macumbeira não pode participar do quadro de funcionário da empresa”.

A responsável pela organização ainda teria afirmado que não adiantaria a funcionária procurar a Justiça, pois não daria “em nada, já que empresa possui vários processos e nunca perdeu”.

De acordo com a polícia, o abalo emocional sofrido pela funcionária “é enorme diante da falta de respeito e intolerância religiosa e o racismo das representantes da empresa”.

A empresa terceirizada de serviços gerais, responsável pela demissão, informou que aguarda notificação da Justiça e que, até que isso aconteça, não vai se posicionar sobre o assunto.

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